Descrição de chapéu Governo Lula

Sônia Guajajara diz que Três Poderes foram atacados como terras indígenas

Ministra afirma que ataques aos povos não serão mais invisibilizados e puxou coro de ‘sem anistia’

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Brasília

A ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, tomou posse nesta quarta-feira (11), no primeiro evento público no Palácio do Planalto desde o ato golpista na praça dos Três Poderes, e comparou os ataques à democracia do último domingo (8) às inúmeras invasões e violências cometidas em terras indígenas (TIs).

Guajajara afirmou, ainda, que a diferença é que a violência contra os povos costuma ter menos visibilidade na sociedade, mas que pretende usar o inédito ministério para mudar essa realidade.

"Povos que resistem há mais de 500 anos de diários ataques, covardes e violentos, chocantes e aterrorizantes como os que vimos nesse ultimo domingo em Brasília, porém sempre menos visibilizados", afirmou.

Sônia Guajajara durante sua posse como ministra dos Povos Indígenas, no Palácio do Planalto, em Brasília, nesta quarta (11) - Gabriela Biló/Folhapress

"Estamos aqui hoje, neste ato de coragem, para mostrar que destruir essa estrutura do Palácio do Planalto, do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional não vai destruir a nossa democracia", continuou.

O evento aconteceu em conjunto com a posse da ministra Anielle Franco, da Igualdade Racial, no Palácio do Planalto.

Inicialmente, a cerimônia de Franco estava marcada para segunda-feira (9) e a de Guajajara para terça-feira (10). As duas acabaram canceladas, no entanto, em razão do ato golpista do último domingo (8) que invadiu e vandalizou não só o Planalto, mas também o Congresso Federal e o STF.

"A nossa posse aqui hoje, minha e de Anielle Franco, é o mais legítimo símbolo dessa resistência secular preta e indígena no Brasil", afirmou ela, que puxou coro de "sem anistia" —referência às investigações contra o ex-presidente Jair Bosolnaro (PL)— e completou afirmando que "nunca mais vamos permitir um outro golpe no nosso país".

As posses das ministras marcam o primeiro evento com participação de público desde a depredação. A cerimônia contou com cantos de indígenas e do Afoxé Ogum Pá.

Estiveram no palco, entre outras autoridades, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice Geraldo Alckmin, a primeira-dama Janja e o ministro da Justiça, Flávio Dino, além de lideranças indígenas como a deputada federal eleita Célia Xakriabá (PSOL-MG) e da mãe yalorixá Dora de Oya.

Guajajara, em seu discurso, ainda ressaltou a importância dos territórios indígenas como forma de preservação do meio ambiente. Ela também lembrou a morte de diversas lideranças indígenas e ambientalistas defensores da floresta, além dos assassinatos de Bruno Pereira e Dom Phillips, no Vale do Javari.

"Esse brutal assassinato não pode permanecer impune", afirmou ela, que ainda acrescentou que a proliferação de fake news também é uma das causas do genocídio contra os povos indígenas.

"Não somos o que muitos líderes da história ainda costumam retratar. Se é verdade que muitos de nós resguardam modos de vida que estão no imaginário da população brasileira, por outro nós existimos de muitas e diferentes formas. Estamos nas cidades, nas aldeias, nas florestas, exercendo os mais diversos ofícios que você pode imaginar", disse.

"Vivemos no mesmo tempo e espaço que qualquer um de vocês, somos contemporâneos desse presente e vamos construir o Brasil do futuro, porque o futuro do planeta é ancestral", completou.

Ela também anunciou os seguintes nomes: Jozi Kaingang, chefe de gabinete; Eunice Kerexu, secretária de Direitos Ambientais e Territoriais; Ceiça Pitaguary, secretária de Gestão Ambiental e Territorial Indígena; Juma Xipaia, secretária de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas; e Marcos Xukuru, assessor especial.

O secretário-executivo do ministério, como mostrou a Folha, será o advogado Eloy Terena, que defende os indígenas em diversas causas no STF, inclusive o caso do marco temporal.

O movimento indígena, inclusive, vê o nome dele como uma possível indicação para o Supremo. A ideia da direção da Apib é articular para que ele seja um dos cotados nas vagas que irão ser abertas na Corte durante o governo de Lula. O petista fará ao menos duas indicações.

"É urgente promovermos uma cidadania indígena efetiva. Isso não se faz sem demarcação de territórios, proteção e gestão ambiental e territorial, acesso à educação, acesso e permanência à universidade pública, gratuita e de qualidade, ampla cobertura e acesso à saúde integral", completou, antes de encerrar seu discurso colocando um cocar na cabeça de Lula.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva participa da cerimônia de posse das ministras Anielle Franco e Sônia Guajajara no Palácio do Planalto, em Brasília - Gabriela Biló /Folhapress

Como antecipou a Folha, Guajajara foi escolhida para o cargo por Lula após a Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) indicá-la dentro de uma lista tríplice ao lado da deputada federal Joenia Wapichana (Rede-RR) e Weibe Tapeba.

Os outros dois acabaram, respectivamente, com a presidência da Funai (que passou a se chamar, por decisão do atual governo, de Fundação dos Povos Indígenas) e da Sesai (Secretaria de Saúde Indígena).

A escolha de Guajajara, no entanto, chegou a causar algum atrito dentro do movimento indígena. Lideranças vieram à público afirmar que entendiam que ela, que foi eleita deputada federal por São Paulo, deveria manter seu mandato na Câmara, enquanto Wapichana, que não conseguiu se reeleger, deveria assumir o ministério.

À Folha, a ministra afirmou que vê como normais as críticas. Também se comprometeu a revisar os nomes de militares alocados na gestão Bolsonaro dentro da Funai. "Acabou a era militar, são novos tempos. Esses cargos serão ocupados por indígenas ou por pessoas não indígenas indicadas pelos indígenas", afirmou.

Guajajara assume um ministério inédito, criado por Lula após quatro anos de governo Bolsonaro no qual nenhuma nova terra indígena foi demarcada —pelo contrário, na última gestão o número de invasões aos territórios e de violências contra indígenas registrou recordes.

Para a ministra, a situação mais crítica acontece nas áreas dos Yanomami, em Roraima, e Munduruku, que fica na Amazônia e principalmente no Pará. As áreas vêm sendo fortemente afetadas pelo garimpo ilegal, que foi também impulsionado pelo ex-presidente e seus aliados.

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