Queixas contra unidades de saúde de São Paulo crescem 20% sob Nunes

Dados se referem a UBS e AMAs/UBS Integradas nos primeiros semestres de 2021 e de 2023; OUTRO LADO: prefeitura diz que monitora serviços e que rede recebeu 2.000 elogios

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São Paulo

As queixas contra as Unidades Básicas de Saúde (UBS) e as Assistências Médicas Ambulatoriais (AMAs)/UBS Integradas da gestão Ricardo Nunes (MDB) aumentaram quase 20% desde 2021, quando o prefeito assumiu o cargo.

É o que mostram os dados do primeiro semestre enviados pela Ouvidoria da Secretaria Municipal de Saúde via Lei de Acesso à Informação. A reportagem solicitou à pasta os números de 2021, 2022 e 2023.

De acordo com as informações, em 2021, 464 unidades receberam 19.605 reclamações. Já em 2023, 465 unidades totalizaram 23.495 apontamentos.

Uma das salas de espera do prédio onde funciona a UBS/AMA Integrada Jardim Icaraí, na zona sul da capital paulista
Uma das salas de espera do prédio onde funciona a UBS/AMA Integrada Jardim Icaraí, na zona sul da capital paulista - Rubens Cavallari - 10.out.2023/Folhapress

Em nota, a Secretaria Municipal da Saúde afirma que ampliou e intensificou o acesso aos serviços de saúde e que entregará novos equipamentos. A pasta também disse que fiscaliza o trabalho realizado pelas Organizações Sociais de Saúde (OSS) no gerenciamento das unidades. Em relação aos números da Ouvidoria, a SMS acrescenta que recebeu mais de 2.000 elogios no primeiro semestre deste ano.

A UBS é a porta de entrada para a rede, e a AMA, um serviço de emergência para casos mais simples. A integração dos dois serviços visa facilitar o atendimento e oferecer mais de um nível de atenção à saúde no mesmo lugar. Atualmente, a capital paulista conta com 67 AMAs/UBS Integradas e 470 UBS em funcionamento.

Em comparação com o ano passado, as reclamações cresceram 12,6%. Na área de assistência à saúde foi observado o maior aumento da insatisfação do paciente —de 2022 para 2023, passou de 6.974 para 10.427 queixas, alta de 49,5%. Ao comparar 2021, que somou 5.741, e 2023, o índice sobe para 81,6%.

É a assistência à saúde que abrange queixas sobre atendimento, consulta, procedimento ambulatorial, tempo de espera longo, condição da unidade e falta de profissional, por exemplo.

Também há reclamações sobre gestão, assistência farmacêutica e odontológica, produtos de saúde e correlatos, ouvidoria, vigilância em saúde, estratégia saúde da família, comunicação, transporte, farmácia popular, conselho de saúde, cartão SUS, alimento, programa de controle do tabagismo e Departamento de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis.

Os dados da Ouvidoria mostram que a AMA/UBS Integrada Jardim Icaraí – Quintana, na região do Grajaú (zona sul), foi a campeã de reclamações deste ano. Em 2021, houve 134 queixas contra a unidade; em 2023, foram 205.

A reportagem visitou o serviço e conversou com usuários no último dia 10. A dona de casa Vanessa Mendes de Jesus Evangelista, 27, disse que os médicos são ótimos, mas reclamou da longa espera para atendimento do filho Davi Miguel, 2.

"Aqui, se você não falar, eles não atendem. Chega quatro, cinco horas da tarde e nada. A triagem foi rápida. O problema foi passar com o médico", contou. O caso aconteceu há cerca de sete meses, segundo relato de Evangelista.

A dona de casa Laís Araújo dos Anjos, 29, é mãe da Liz, 2. Naquele dia, ela chegou com a criança por volta das 7h15 para atendimento de pediatria e saiu quase três horas depois. Anjos contou à Folha que falta organização, a demora é recorrente e alguns funcionários são ríspidos quando abordados com reclamações.

"Eles respondem ‘não tenho acesso, tem que esperar’. Nem todos os funcionários são acessíveis", afirmou. As entrevistadas disseram não ter pensado em reclamar no canal da Ouvidoria da secretaria.

A AMA/UBS Integrada Jardim Icaraí – Quintana é uma das 454 unidades com reclamações, de acordo com dados da Ouvidoria, gerenciadas por OSS em 2023. Nesse caso, a responsável pela gestão é a Associação Saúde da Família (ASF).

De acordo com os dados passados pela secretaria, as reclamações contra as unidades geridas pela ASF também aumentaram no período —foram 3.701 em 2021 e 4.253 neste ano.

Além da ASF, as organizações com unidades que receberam queixas são Afne (Associação Filantrópica Nova Esperança), Cejam Einstein, Fundação ABC, INTS (Instituto Nacional de Tecnologia e Saúde), Associação Comunitária Monte Azul, APS Santa Marcelina, SBCD (Sociedade Beneficente Caminho de Damasco), Seconci (Serviço Social de Construção Civil) e SPDM (Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina).

A Afne foi a única que apresentou queda nos números —593 para 544, de 2021 para 2022, e do ano passado para cá, reduziu para 495 queixas. Por outro lado, apenas oito unidades alvos de reclamações estavam sob gestão da entidade no período, conforme as informações fornecidas via LAI.

Atualmente, a Secretaria Municipal da Saúde mantém parceria com 12 OSS, firmadas mediante contrato de gestão, para gerência dos equipamentos de saúde da atenção básica e hospitalar. Outras cinco estão no âmbito dos convênios, termo de fomento e colaboração.

Para Mário Scheffer, professor da Faculdade de Medicina da USP, o aumento de reclamações mostra problema na gestão das OSS e falhas de coordenação e fiscalização por parte da Secretaria da Saúde.

"Hoje, 80% dos mais de 100 mil profissionais de saúde da rede municipal são contratados por OSS. E um dos motivos das reclamações, por exemplo, o longo tempo de espera e não solução do problema de saúde que levou o cidadão UBS, tem a ver com equipes incompletas e alta rotatividade de profissionais, principalmente médicos", afirma Scheffer.

Segundo ele, os médicos permanecem em média um ano e dois meses nas UBS da rede municipal de São Paulo. "Hoje, mais de 2.200 médicos são contratados por PJ [pessoa jurídica] pelas OSS, um tipo de vínculo que vem crescendo e pode piorar a qualidade do atendimento nas unidades", completa.

Na opinião do médico sanitarista Walter Cintra Ferreira, professor de gestão em saúde da Fundação Getulio Vargas de São Paulo, a piora dos indicadores de avaliação dos usuários é um sinal de alerta importante e algo precisa ser feito. "Essa insatisfação dos usuários demonstra problemas de gestão do serviço", afirma.

Para ele, o subfinanciamento é um problema grave do SUS (Sistema Único de Saúde). A falta de recurso traz a precarização e não permite a oferta de um bom atendimento, o que reflete na qualidade dos serviços.

Prefeitura diz que monitora serviços prestados

De acordo com a Secretaria da Saúde da gestão Nunes, há a previsão de entrega de 37 novas UBS e ampliação da rede de urgência e emergência da cidade, que conta com 24 Unidades de Pronto Atendimento (UPAs).

Quanto às UBS geridas por OSS, a pasta disse que acompanha, monitora e avalia os serviços prestados pelas entidades, de acordo com os indicadores, metas e parâmetros acordados por meio dos contratos de gestão.

De acordo com a pasta, os dados de queixas de UBS e AMAs/UBS Integradas podem estar relacionados a solicitações ou reclamações. Em 2021, as solicitações representaram 53% do número total de chamados e as reclamações 47%. Neste ano, as solicitações representaram 62% e as reclamações representam 38%.

Os serviços municipais de saúde também foram elogiados, diz a pasta. Nos três anos, de janeiro até julho, houve 2.099, 2.058 e 2.264 registros, respectivamente.

Sobre o caso de Davi, a secretaria diz que gerência da unidade entrou em contato com a mãe do paciente e ela informou que o fato ocorreu em 2021. O outro caso é apurado.

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