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Auditores da Receita temem que militares invadam competências com GLO

Categoria solicitou audiências com Dino e Haddad para coordenar ações

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Brasília

Auditores da Receita Federal manifestam temor de que uma eventual falta de coordenação com militares que atuam em portos e aeroportos, ou mesmo ingerência nas suas atividades, afetem o desempenho dos profissionais nas aduanas.

Por isso, representantes da categoria solicitaram audiências com os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Flávio Dino (Justiça), para buscar uma articulação e a garantia da independência e autonomia para seguirem com suas atividades.

Militares da Marinha atuam no Porto de Itaguai (RJ), no âmbito da operação de Garantia de Lei e da Ordem - Divulgação - 6 nov. 2023/Marinha do Brasil

No último dia 1º, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assinou decreto de Garantia de Lei e da Ordem, para que militares pudessem atuar em portos e aeroportos de Rio de Janeiro e São Paulo.

Marinha e Aeronáutica então passaram a ter poder de polícia nos portos fluminenses, em Itaguaí e no Rio de Janeiro, e no aeroporto internacional do Galeão. As forças também vão atuar no porto de Santos, no litoral paulista, e no aeroporto de Guarulhos, na Grande São Paulo.

Com o decreto, os militares poderão fazer revistas, realizar prisões e atuar para conter qualquer delito ou atividade criminosa. As ações foram determinadas para ajudar no combate a grupos criminosos do Rio de Janeiro, buscando asfixiar economicamente essas organizações.

Os auditores da Receita, por sua vez, são os responsáveis legais por essas atividades, que envolvem a fiscalização e o combate de práticas ilícitas, como o contrabando e o descaminho. Esses profissionais também devem realizar o controle, a vigilância e o monitoramento das operações lícitas de comércio exterior.

Uma das peculiaridades é que essas ações devem ser feitas por meio de medidas de controle que buscam não prejudicar excessivamente as operações e comércio exterior.

Em ofício endereçado aos ministros, solicitando as audiências, o Sindifisco pede que o trabalho dos auditores da Receita Federal seja considerado e incluído nas ações no âmbito da GLO, para não haver o risco do comprometimento dos resultados.

"Entende-se como temerária a estruturação de uma importante ferramenta de combate às práticas ilícitas relacionadas ao comércio exterior e controle de fronteiras sem a participação efetiva e destacada da Secretaria da Receita Federal do Brasil, que possui ferramentas reconhecidamente eficientes na gestão do comércio exterior brasileiro, a partir de uma lógica de Gestão de Risco Aduaneiro e tratamento devido", afirma o texto.

O sindicato que representa a categoria ainda acrescenta que as ações de apreensão e aplicação de sanções decorrentes de atividades ilícitas podem vir a ser contestadas na Justiça, se não houver a presença desses profissionais —o que fragilizaria a própria efetividade da operação.

O órgão ainda pede que a Receita Federal seja consultada e participe de qualquer ação que envolva as atividades de sua competência.

O presidente do Sindifisco Nacional, Isac Falcão, afirma que os auditores da Receita não querem participar das ações da GLO, mas demandam que os papéis sejam bem definidos e que as atividades dos servidores seja respeitada.

"A nossa preocupação é a articulação desse esforço [dos militares] com o esforço de controle aduaneiro, de combate ao contrabando, ao descaminho, que é uma área na qual a Receita Federal tem expertise por meio da aduana e que demanda conhecimento de uma legislação muito específica. Demanda uma certa expertise no respeito a direitos dos intervenientes de comércio internacional, exportadores, importadores, dos passageiros que chegam ao Brasil ou que partem", afirmou à Folha.

Ele acrescenta que o comércio internacional demanda uma cerca fluidez das ações, que são demandadas pelo fato de o Brasil ser signatário de acordos internacionais da área. O sindicato então alerta que mudanças de procedimentos, como aumentar a quantidade de carga que é vistoriada na amostragem, pode comprometer essas ações.

"Se você muda algum parâmetro, se diminui de alguma forma a assertividade, aumenta as amostras, tudo isso pode criar embaraços ao comércio internacional e à circulação dos passageiros. Então a gente procura ser muito preciso nas cargas que a gente vistoria, isso depende da análise de uma quantidade de informações muito grande e de uma certa organização do trabalho", diz.

"A preocupação quando você não tem os papéis definidos com precisão é que haja ali uma descoordenação, pessoas até imbuídas de uma boa intenção mas que querem fazer o trabalho para os quais elas não têm experiência acumulada, não tem conhecimento acumulado", completa.

O Sindifisco ainda afirma que a atuação de militares, por terem princípios e valores diferentes, pode comprometer a atuação dos profissionais nas aduanas. Citam que os integrantes das Forças têm a hierarquia e a disciplina como os valores mais importantes, enquanto os trabalho dos auditores da Receita precisa ser baseado na independência técnica e autonomia funcional.

O órgão teme que a ingerência, por conta dessas discrepâncias, possa comprometer o trabalho. Isac Falcão cita o caso das joias da Arábia Saudita, argumentando que a atuação do profissional poderia ter sido comprometida se não fosse resguardada a sua independência funcional.

"Um exemplo que ilustra isso com muita propriedade, é o exemplo das joias sauditas no aeroporto de Guarulhos. O auditor fiscal que conduziu aquela situação fez uso o tempo todo das suas prerrogativas, da sua autonomia técnica, da sua independência funcional para que pudesse fazer valer ali a aplicação da legislação, como deve ser", afirma.

"Imagina se ele tivesse submetido ao regime de organização militar. Jamais poderia ter tido aquela mesma atitude", completa.

O governo fez nesta quinta a reunião entre representantes da secretaria-executiva da Fazenda, do Ministério da Justiça, da Receita Federal e da Polícia Federal para discutir o tema.

Durante o encontro, foi dito pelo governo que as competências e atribuições da Receita Federal e da Polícia Federal não foram alteradas em função da GLO, cujo comando está com as forças militares de segurança.

"A avaliação unânime entre os participantes foi de que todos os processos de trabalho estão funcionando dentro da normalidade, com ágil e harmônico compartilhamento de informações entre os agentes", afirmou o governo por meio de nota conjunta dos ministérios da Fazenda e da Justiça.

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