Descrição de chapéu violência China

Europa tem câmeras nos uniformes para prevenir crimes, não letalidade policial

Na Ásia, política incentiva e atrapalha uso dos equipamentos; primeiros países começaram a adotar ferramenta em 2005

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Madri e Taipé

Já se vão quase 20 anos que a Europa começou a utilizar câmeras nos uniformes policiais. No velho continente, no entanto, o problema a ser combatido nunca foi a letalidade policial, como é no Brasil, e sim a intenção de melhorar os serviços prestados à população.

Se a polícia brasileira, segundo a Human Rights Watch, mata cerca de 6.000 pessoas ao ano desde 2018, locais como Dinamarca, Suíça e Islândia reportaram zero mortes por policiais em 2023 —a Islândia, aliás, cujas autoridades não carregam armas, tem apenas uma morte registrada em sua história recente, em 2013. A França é o primeiro país do oeste ou centro europeu a aparecer na lista, com mortes de 15 a 20 pessoas ao ano recentemente.

Assim, buscando principalmente prevenir crimes e desordem pública, algumas nações da região iniciaram seus programas pilotos nos primeiros anos do novo século. Os primeiros estudos advindos desses testes demonstraram que o comportamento dos cidadãos melhorava quando eles percebiam que a situação estava sendo registrada por uma câmera.

Policial francês com câmera portátil no uniforme durante treinamento no início de 2023 - Jean-Christophe Verhaegen/AFP

Os países precisaram adequar suas respectivas legislações para que as filmagens fossem permitidas sem atentar contra direitos de privacidade. Na maioria dos locais, por exemplo, filmar dentro de residências só é permitido quando há uma investigação em andamento. A maioria das gravações costuma ser apagada no fim do dia ou após 24 horas, a menos que contenham alguma ofensa.

Em 2005, após alguns testes realizados na Dinamarca, a primeira nação do mundo a adotar o uso foi o Reino Unido, inicialmente em dois condados. No ano seguinte, algumas unidades policiais, como as de violência doméstica, passaram a usá-la.

Em 2007, um estudo sobre a experiência britânica dizia que a ferramenta "tem o potencial de melhorar significativamente a qualidade das evidências fornecidas pelos policiais. A gravação de vídeo da cena de um incidente irá capturar evidências convincentes que nunca poderiam ser capturadas em declarações escritas."

O relatório concluiu ainda que as reclamações contra os policiais que usavam câmeras foram reduzidas a zero, e o tempo gasto com papelada foi reduzido em 22,4%. Em 2014, a polícia de Londres adotou as câmeras para todos os policiais em contato com o público.

O ano de 2013 foi crucial para a adoção da ferramenta na Europa. Foi quando dois dos mais populosos países do continente, a Alemanha e a França, passaram a adotá-la. Suécia e Dinamarca também começaram seus programas nesse mesmo ano.

Após uma experiência inicial sem sucesso em 2009, algumas autoridades francesas começaram a utilizar câmaras corporais regularmente em 2013, expandindo, aos poucos, seu uso para todo o território e unidades policiais do país.

Já na Alemanha, a polícia forneceu três razões para o uso da ferramenta: 1) proteger a polícia contra os ataques de suspeitos; 2) a capacidade de reconstruir eventos e de usar os registros como prova; 3) o fato de os cidadãos estarem filmando policiais e publicando nas redes sociais, e a polícia querer apresentar as suas próprias gravações em contraste a possíveis edições negativas dessas cenas postadas por civis.

A primeira experiência italiana começou em 2015, com o objetivo de que os policiais de Turim pudessem se defender ao realizarem repressão de protestos. Milão e Roma começaram a seguir o exemplo pouco depois.

Na Finlândia, após um programa-piloto em 2015, todos os policiais em patrulha passaram a usar câmeras em 2018. Um ano depois, a Holanda nacionalizou a ferramenta.

Uma pesquisa de 2022 mostrou que 86% dos policiais holandeses consideravam que as câmeras corporais agregaram muito valor ao seu trabalho, além de se sentirem mais seguros.

Na Suécia, a polícia começou a usar câmeras em jogos de futebol e outros eventos com aglomeração de público em 2015. A Rússia também vem experimentando, pelo menos desde 2016, o uso das câmeras nos uniformes. Ali, uma das razões para a instalação foi o combate à corrupção policial.

Na Ásia, política incentiva e atrapalha uso de câmeras por policiais

As câmeras corporais em policiais vêm se espalhando pela Ásia na última década, em meio a contextos políticos tanto contrários quanto favoráveis à sua adoção.

No Japão, o homicídio do ex-primeiro-ministro Shinzo Abe em julho de 2022, num evento de campanha eleitoral na rua, foi o ponto de partida para uma revisão nacional nos métodos policiais —cujos "pontos cegos" foram simbolizados pelo episódio, em que o assassino passou despercebido.

Policiais de Hong Kong posam com câmeras corporais
Policiais de Hong Kong posam com câmeras corporais - Divulgação/Governo de Hong Kong

Entre as novas orientações estavam a atenção ao recrutamento online por gangues e a extensão das câmeras aos policiais de rua e de pequenos postos para uso ao interrogar transeuntes, por exemplo. Também na segurança de eventos públicos, como comícios ou maratona.

Com base no relatório, a polícia anunciou a primeira fase de adoção para este ano, voltada a policiamento local, agentes de trânsito e controle de multidão, neste caso, com monitoramento remoto e em tempo real dos participantes. Começa pelas cidades maiores, projetando introdução posterior em todo o país.

Em Hong Kong, onde os testes começaram em 2013, as câmeras foram implantadas amplamente a partir de 2017, ao longo de quatro anos. Uma das justificativas eram episódios de violência em eventos públicos, com as câmeras servindo para, por exemplo, comprovar ataques a policiais.

Mas a ampliação dos protestos políticos em 2018 resultou em questionamentos na direção contrária. Organizações acusaram policiais de romper suas próprias normas ao usar as câmeras em atos no final do ano, gravando indivíduos, não a multidão.

Naquele mesmo ano, nas Filipinas, então sob investigação na Corte Criminal Internacional por excessos da polícia no combate ao narcotráfico, o governo Rodrigo Duterte adotou as primeiras câmeras corporais.

Tanto no Japão quanto em Hong Kong um dos argumentos em defesa das câmeras é que constrangem o comportamento violento dos abordados e dos policiais.

Sua extensão para outras categorias de servidores já começou, caso de maquinistas de trem no Japão e fiscais de ambulantes em Hong Kong.

Bombeiro de Singapura posa com câmera corporal
Bombeiro de Singapura posa com câmera corporal - Divulgação/Defesa Civil de Singapura

Em Singapura, a ampla adoção das câmeras começou em 2015 e se completou um ano depois, em todos os distritos —com normas como ter uma luz vermelha informando da gravação, desligar diante de vítimas de crimes sexuais e apagar após um mês, se não houver pedido de investigação.

Singapura adotou as mesmas câmeras que estavam em teste, desde o início da década, em Hong Kong e também na Polícia Metropolitana do Reino Unido.

Em Taiwan, as câmeras corporais foram adotadas pela polícia a partir de dezembro de 2016, estabelecendo procedimentos sobre sua utilização. Na China, a polícia local chamada Chengguan, para gestão urbana, adotou câmeras corporais a partir de 2017, visando conter não só episódios de violência dos agentes, mas contra eles.

A indústria chinesa do setor tem modelos como as câmeras de 720 graus, que permitem visualização com menos risco de pontos cegos.

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