Descrição de chapéu Coronavírus

Lockdown é única saída para SP, dizem especialistas

Para profissionais da saúde, medida precisa ser tomada em âmbito estadual para frear a pandemia

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São Paulo

Especialistas consultados pela Folha são unânimes em afirmar que São Paulo está atrasado para decretar o lockdown a fim de tentar conter a alta de contágio por Covid-19 no estado. A medida, considerada extrema, seria a única opção disponível para tentar frear a transmissibilidade do vírus neste momento, segundo os profissionais da saúde.

O governador João Doria (PSDB) chegou a afirmar na manhã desta quarta que medidas mais restritivas poderiam ser tomadas diante dos números elevados de casos e óbitos da Covid-19 no estado. Mais tarde, em coletiva no Palácio dos Bandeirantes, integrantes do Centro de Contingência da Coronavírus relativizaram o possível endurecimento da quarentena.

"Quando fala em lockdown, parece fácil, parece que vamos resolver tudo com lockdown. Estamos tentando resolver com medidas que são restritivas, mas que não têm essa característica de fechar inteirinho o estado, todas as atividades. Há risco, inclusive, de desabastecimento e instabilidade social", disse José Medina, membro do comitê de controle da pandemia.

Especialistas, no entanto, afirmam que, diante do “estado de calamidade pública” e da falta de vacinas para uma imunização em massa, o fechamento total seria a única medida que poderia resultar em diminuição de casos.

“O ideal era estados, municípios e União estarem alinhados para um plano de ajuda aos mais vulneráveis diante de um lockdown. E isso deveria ter sido planejado antes. Agora, diante da emergência sanitária em que estamos, só nos resta fechar tudo. Isso já deveria ter sido feito, pois o resultado só poderá ser sentido em duas a três semanas”, diz o infectologista Renato Grinbaum.

Por causa do ciclo de contaminação do coronavírus, que leva de 10 a 14 dias, o resultado de quaisquer medidas restritivas só começa a aparecer em cerca de duas semanas. Segundo projeções do governo do estado, os leitos de UTI já poderiam ter lotação total nesta quinta-feira (18).

Para o infectologista, se o lockdown for respeitado de fato, será possível retomar algumas atividades econômicas em um tempo menor, evitando esse "abre e fecha" que tem desgastado, na sua opinião, a sociedade e a economia.

Atualmente, cerca de 30 cidades do interior do estado adotaram medidas mais rígidas do que as implementadas pela fase emergencial do Plano São Paulo. Destas, cerca de 20 decretaram lockdown após verem o sistema de saúde entrar em colapso e os números de mortes dispararem. Na maioria delas, a medida começaria a valer nesta quarta-feira (17).

“O lockdown precisa ser, no mínimo, em âmbito estadual para ter uma boa eficácia. Temos medidas municipais e até regionais no interior do estado de São Paulo, mas quando uma cidade próxima não adere à restrição, põe a perder o esforço das demais”, avalia o virologista Maurício Lacerda Nogueira, professor da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto.

Para ele, o lockdown no estado é apenas uma questão de tempo, já que a ampliação de leitos nas redes pública e particular chegou ao seu limite e também não há mais profissionais a serem contratados para atuar nessas novas vagas.

“Nesse momento não temos outro medicamento contra a Covid. Vai custar muito à sociedade? Vai. Mas vai custar ainda mais vermos as pessoas morrerem aos montes. Vamos chegar na situação de Nova York, que contratou caminhões frigoríficos para guardar os corpos. A situação é muito triste.”

Já Grinbaum chama a atenção para o esgotamento das unidades particulares da capital, que concentra a maior rede hospitalar do país, como termômetro do colapso na saúde.

“Hospitais de alto padrão, que sempre prezaram pela hotelaria, pelo conforto, agora parecem tendas de circo. Até consultórios estão virando leitos de UTI. A situação é muito pior do que as pessoas estão vendo”, diz.

Nesta terça-feira, o estado tinha 89,9% dos leitos de UTI para Covid-19 ocupados. No último dia 22 de fevereiro, essa taxa era de 68%. Atualmente, 10.756 pacientes estão internados em UTIs e 14.236, em enfermarias.

Além do lockdown, o epidemiologista André Ricardo Ribas Freitas, professor da Faculdade São Leopoldo Mandic, defende que o governo invista no rastreamento e isolamento das pessoas que tiveram contato com infectados pelo coronavírus.

“É uma maneira de a gente tentar frear a cadeia de transmissão do vírus. Se o paciente começa a transmitir dois dias antes de sentir os primeiros sintomas e demora mais alguns para procurar atendimento médico, ter o diagnóstico e se isolar, ele já contaminou várias pessoas que também precisam ser isoladas”, diz.

A necessidade do rastreamento dos doentes é apontada como prioridade no Guia da Vigilância Epidemiológica para Covid-19, do Ministério da Saúde, atualizado no último dia 15, do qual o epidemiologista participou.

“Não dá para tomar decisões só baseado no critério de lotação de UTIs, pois a maioria dos pacientes nesses leitos está morrendo. A gente tem que evitar que as pessoas adoeçam. E, sem vacina, sobram poucas opções”, lamenta.

Entendo que é extremamente delicado, por razões políticas, tomar decisões drásticas como o lockdown. Mas os agentes públicos foram eleitos para tomar decisões e não esperar a eleição para ver o que deve ser feito. A hora é de lidar com o ônus das medidas impopulares”, critica Nogueira.

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