Dono de helicóptero apreendido com cocaína vira diretor da CBF

Gustavo Perrella foi nomeado há 3 meses sem divulgação pela entidade

Gustavo Perrella
Gustavo Perrella participa de audiência no Senado sobre o Estatuto do Torcedor, em 2016 - Roberto Castro - 22.set.2016/ME
Sérgio Rangel
Rio de Janeiro

Ex-secretário nacional de futebol, Gustavo Perrella, 34, foi nomeado diretor da CBF (Confederação Brasileira de Futebol). Filho do senador Zezé Perrella (MDB-MG), ex-presidente do Cruzeiro, ele ocupa agora o cargo de diretor de Desenvolvimento e Projetos da entidade nacional.

O dirigente tomou posse na confederação em janeiro, após deixar o cargo que ocupava no governo do presidente Michel Temer.

O ex-deputado estadual ficou conhecido nacionalmente em 2013, quando a Polícia Federal apreendeu um helicóptero de sua empresa com um total de 445 kg de cocaína, no Espírito Santo.

Ele e seu pai foram investigados na ocasião, mas não foram encontrados indícios de autoria criminal dos dois no caso. Por isso, eles não responderam judicialmente.

Helicóptero do ex-deputado estadual Gustavo Perrella, flagrado pela Polícia Federal com drogas, em Vitória (ES)
Helicóptero do ex-deputado estadual Gustavo Perrella, flagrado pela Polícia Federal com drogas, em Vitória (ES) - Polícia Federal - 29.nov.2013/Divulgação

A nomeação de Gustavo foi feita sem divulgação. A CBF só colocou no seu site o nome do novo dirigente entre os seus diretores na noite desta quarta-feira (4), horas depois de a Folha confirmar a contratação e questionar a ausência do cartola na relação.

Em nota, a CBF disse que a escolha de Gustavo se deu pela sua experiência na condução de programas de desenvolvimento do esporte, mais especificamente o futebol.

A entidade afirmou que o dirigente liderou muitos projetos durante seu período no Ministério do Esporte e também destacou seu trabalho como conselheiro vitalício do Cruzeiro, onde exerceu vários cargos nos departamentos de gestão e de futebol.

Na teoria, o novo diretor seria o elo de ligação entre a entidade e os presidentes das federações estaduais.
Desde a última quarta-feira (4) a Folha tenta entrar em contato com Gustavo, mas não obteve resposta até a conclusão desta edição.

Ele não cumpre expediente na sede da entidade. Outros diretores também não têm a necessidade de trabalhar diariamente no prédio, localizado na barra da Tijuca, zona oeste do Rio.

A diretoria da CBF conta também com presidentes de federações e outros políticos.

Em 2016, o pai de Gustavo foi um dos principais articuladores políticos para que a CPI do Futebol do Senado encerrasse suas atividades sem nenhum pedido oficial de indiciamento e sem apontar culpados. A comissão investigava contratos e negociações da CBF e seus dirigentes.

O trabalho teve início após José Maria Marin, ex-presidente da entidade, ser preso na Suíça. Marin, Marco Del Nero e Ricardo Teixeira, que dirigiu a CBF por mais de duas décadas, foram acusados de receber propina na venda de direitos de transmissão.

Último presidente eleito da CBF, Del Nero está suspenso pela Fifa. Ele deve ser banido do esporte neste mês por causa das acusações do FBI.

 

Apesar de ter sido escolhido por Del Nero, Gustavo deverá ser mantido na nova diretoria de Rogério Caboclo, que assumirá a confederação a partir de abril de 2019.

No próximo dia 17, os presidentes de federações e os clubes das Séries A e B do Brasileiro vão eleger o próximo presidente da entidade. Homem de confiança de Del Nero, Caboclo é o candidato único. Diretor Executivo de Gestão da confederação, ele tem o apoio de 27 federações e da maioria dos clubes.

Formado em administração de empresa, Gustavo foi eleito em 2010 deputado estadual em Minas Gerais, com 82.864 votos. Quatro anos depois, ele se candidatou a deputado federal pelo mesmo estado, mas não se elegeu.

Rogério Caboclo
Rogério Caboclo deverá manter Gustavo Perrella na nova diretoria da CBF, a partir de abril de 2019 - Divulgação/CBF

RÉU

Gustavo é réu em dois processos na Justiça —um por uso de dinheiro público para fins pessoais e outro pela criação de um cargo fantasma. As ações correm ainda na primeira instância do Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

Segundo a primeira acusação, o diretor da CBF seria responsável por desvios de cerca de R$ 15 mil dos cofres públicos para abastecer o helicóptero da empresa da sua família com verba indenizatória da Assembleia durante o seu mandato de deputado.

Ele também é acusado de criar um cargo fantasma para o piloto preso na operação da Polícia Federal em 2013.

Em depoimento a promotores, Rogério Antunes disse que nunca prestou serviço para a Assembleia de Minas Gerais e que sua função era pilotar o helicóptero em viagens até a praia, chácaras de amigos, fazenda da família e compromissos políticos.

Antunes foi nomeado em março de 2013 e só foi exonerado em 25 de novembro de 2013, um dia depois da apreensão da aeronave pela PF.

Mais dois políticos

Antes da entrada de Gustavo Perrella, a CBF já contava com políticos na atual diretoria. Dois deputados federais foram nomeados para cargos na confederação por Marco Polo Del Nero no início do seu mandato.

Vicente Cândido (PT-SP) é diretor de Assuntos Internacionais da entidade. Já Marcelo Aro (PHS-MG) está na sua segunda diretoria na gestão de Del Nero. 

Aro é diretor de Relações Institucionais. Antes, ocupava o cargo de diretor de Ética e Transparência da CBF.

Apesar do cargo, Aro se recusou a abrir processo contra o presidente da CBF ou contra os ex-comandantes da entidade (José Maria Marin e Ricardo Teixeira) denunciados pelo FBI por corrupção.
A família de Aro tem influência no futebol mineiro há décadas. Seu avô, seu pai e seu tio comandaram a federação local. Em 2004, seu tio, Elmer, teve o mandato cassado. Durante a CPI do Futebol, realizada em 2001, no Senado, Elmer, que já morreu, admitiu sonegar impostos e praticar o nepotismo na entidade.

Já Cândido é um antigo companheiro de Del Nero. Os dois foram sócios num escritório de advocacia em São Paulo. Em 2016, o petista admitiu que recebia da entidade quase o mesmo salário que ganhava como deputado —cerca de R$ 33 mil. 

Cândido alegou que era legítimo receber salário da CBF e “defender os interesses do esporte” em Brasília. Na ocasião, Del Nero era investigado pelo FBI, pela Fifa e por duas CPIs —uma na Câmara dos Deputados e outra no Senado.

No mesmo ano, Cândido e Aro lideraram a bancada da bola, que extinguiu a CPI da Máfia do Futebol, instalada para investigar denúncias contra dirigentes envolvidos no escândalo da Fifa. A comissão durou apenas três meses e teve o pedido de prorrogação barrado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia.

A CBF também tem um deputado federal entre os seus quatro vices. É Marcus Vicente (PP-ES), que também comandou a federação capixaba de futebol.

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