Ídolo santista afrontou um presidente da República e foi punido

Feitiço disse que quem mandava no campo eram os jogadores, e não Washington Luís

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Santos

Mesmo com rejeição manifestada por parte da torcida, Jair Bolsonaro confirmou que estará na Vila Belmiro para ver Santos e São Paulo, neste sábado, às 17h, pelo Campeonato Brasileiro. Será o primeiro presidente a ir a um jogo no estádio durante o exercício do mandato, mas não o único a ver uma partida de santistas in loco.

A história mais antiga e controversa envolvendo um jogador do clube e um presidente da República aconteceu em 1927. No Rio, o Washington Luis teve uma ordem desafiada pelo maior astro da equipe na equipe, Luis Macedo Matoso, o Feitiço, hoje lembrado como uma lenda do clube nas décadas de 1920 e 1930.

Seis vezes artilheiro do Campeonato Paulista, descrito em relatos da época como responsável por tornar gols de bico em obras-primas, Feitiço ostenta a maior média de um jogador na história do clube, superior até mesmo à de Pelé, 214 gols em 151 jogos, 1,41 por partida.

Presidente da República Washington Luís dá o ponta pé inicial para a partida entre a seleção paulista e a carioca, em 1927
Presidente da República Washington Luís dá o ponta pé inicial para a partida entre a seleção paulista e a carioca, em 1927 - Acervo do Centro de Memória e Estatística do Santos FC

O ato rebelde ocorreu em 13 de novembro, quando a seleção paulista enfrentou a seleção carioca. Pelo Santos, Feitiço e o goleiro Tuffy foram convocados. O confronto, no recém-inaugurado estádio de São Januário, estava empatado em 1 a 1 quando um pênalti foi marcado para os cariocas. Após troca de empurrões e quase 15 minutos de paralisação, sem que pudessem bater a penalidade, um representante de Washington Luís desceu ao gramado e se dirigiu aos jogadores.

Ele afirmou que o presidente solicitava que os paulistas deixassem a cobrança de pênalti dos cariocas acontecer. Feitiço teria tomado a frente e respondido que, se era Washingon Luis quem mandava no Brasil, quem mandava no campo eram eles, os jogadores.

Contrariado, o presidente deixou o estádio. A polícia, por sua vez, entrou no gramado e a cobrança foi realizada já sem o time paulista em campo. A partida foi encerrada em 2 a 1.

Washington Luís ocupou o cargo de presidente da República entre novembro de 1926 e outubro de 1930
Washington Luís ocupou o cargo de presidente da República entre novembro de 1926 e outubro de 1930 - 27.abr.1957/Folhapress

“O Feitiço era um jogador de grande qualidade técnica e que não tinha medo de enfrentar quem quer que fosse. Historicamente, o colocamos ao lado de outros como o Afonsinho, por exemplo, que lutou pelo reconhecimento profissional dos atletas durante a os anos 70”, diz o historiador Guilherme Nascimento, membro da Associação dos Pesquisadores e Historiadores do Santos FC (Assophis).

A resposta de Feitiço repercutiu no Santos, então presidido pelo médico Guilherme Gonçalves, também principal cartola da Associação Paulista de Esportes Atléticos (APEA), atual Federação Paulista de Futebol (FPF).

O clube convocou uma assembleia para decidir o futuro dos jogadores. Feitiço e Tuffy foram expulsos por 318 votos favoráveis, contra 44 contrários.

“Há uma publicação da ata dessa reunião. Olhando com os olhos de hoje foi algo terrível. O cenário foi feito para que ele fosse expulso”, explicou Nascimento.

Feitiço, jogador do Santos
Feitiço, jogador do Santos - Divulgação

O afastamento de Feitiço custou caro ao Santos. Então líder de um ataque conhecido por marcar 88 gols em apenas 11 jogos, viu de longe os companheiros deixarem escapar um título paulista que tinha nas mãos.

Feitiço acabou perdoado no clube no ano seguinte, após pressão da CBD (atual CBF), que queria contar com o atacante em um amistoso do Brasil diante da Escócia. Foi convocado para a partida e marcou quatro gols na vitória por 5 a 0.

“Ele não tinha vida fácil no clube. Em setembro de 1928, a direção achava que ele fazia corpo mole e o colocou para jogar no que chamavam de segundo quadro, uma espécie de preliminar. Foi para castigá-lo e humilhá-lo. Ele jogou, o Santos ganhou por 11 a 1 e o Feitiço fez nove gols”, conta Nascimento.

O atacante faleceu em 23 de agosto de 1985, em São Paulo, cidade onde também nasceu.

Por motivo distinto, Bolsonaro encontrará um crítico na Vila Belmiro. O argentino Jorge Sampaoli, técnico do Santos, já declarou ser contrário às ideias do presidente do Brasil. O técnico só falou uma única vez sobre o presidente desde que chegou ao país, em janeiro. Disse que “tem uma opinião diferente” que a do ex-deputado sobre política.

Recentemente, ele falou sobre a eleição presidencial da Argentina, vencida por Alberto Fernández e Cristina Kirchner, agora vice. "Estou feliz pelas mudanças que se deram na Argentina. O presidente [Bolsonaro] tem uma opinião diferente", afirmou o treinador.

Sampaoli não se manifestou sobre a presença de Bolsonaro na Vila Belmiro. Questionada, a sua assessoria disse que o técnico não informou se falará ou não sobre o tema durante sua próxima entrevista coletiva, programada para ocorrer logo após o clássico.

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