Descrição de chapéu Dias Melhores Games

Locadora à moda antiga faz vaquinha para crianças jogarem videogame

Doações ajudam a custear aluguel de jogos para quem não pode pagar e mantêm negócio de pé no Ceará

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo (SP)

Quase todos os dias, ao menos 30 crianças e adolescentes do município de Frecheirinha, no interior do Ceará, aguardam ansiosamente as 5 horas da tarde. É quando se abrem as portas da Railander Games, locadora de videogames ao estilo dos negócios que eram febre no início dos anos 2000.

De antigo, porém, o local só tem o ar nostálgico. Os frequentadores jogam com consoles de última geração, como Xbox Series S e PlayStation 5. Quem chega, paga R$ 5 por hora pelo uso do videogame que preferir.

Alunos com bom desempenho escolar são exceção: eles não pagam nada. Basta apresentar uma declaração assinada pela diretora ou por um professor, atestando frequência regular nas aulas e dedicação aos estudos.

"Muita gente não gosta do videogame, mas, aqui, ele tem feito bem para as crianças", diz Vicente da Silva Façanha, 51, o dono da locadora à moda tradicional.

"Elas estão se interessando mais pelo colégio, para não perder a chance de jogar nos consoles. Alguns custam até R$ 4.000, o que seria impossível para as famílias pagarem."

A imagem mostra uma sala de jogos onde quatro crianças estão sentadas em cadeiras plásticas azuis, assistindo a dois televisores. À esquerda, um jogo de Minecraft está sendo exibido, enquanto à direita, um jogo de Grand Theft Auto é visível. As paredes estão decoradas com pôsteres de vários jogos. Há também um aviso na parede com informações sobre preços de locação de consoles.
Crianças jogam na locadora Railander Games, em Frecheirinha, no interior do Ceará - Reprodução/Instagram/Railander Games

Tudo começou quando o proprietário da Railander Games percebeu que a maioria das crianças desistia de jogar devido ao valor cobrado. Em maio deste ano, ele teve a ideia de pedir doações aos seguidores da locadora nas redes sociais para conceder a gratuidade sem prejudicar a viabilidade do negócio, uma das suas fontes de renda.

Um mês antes, uma publicação sobre o estabelecimento no município de 15 mil habitantes, a 295 km de Fortaleza, havia viralizado na rede social X, e Façanha viu seu número de seguidores chegar a quase 13 mil.

A quantidade de doadores aumentou desde então. Vários deles passaram a exigir comprovação de que as crianças beneficiadas estavam matriculadas e estudando.

"Antes disso, teve o caso de um garoto que tinha sido expulso do colégio. Ele sempre ia jogar, e eu deixava, porque pensava que estava estudando", conta Façanha. "Mas um dia a diretora viu ele lá e disse que estava há três meses fora da escola. Proibimos o menino de jogar e só deixamos de novo depois que voltou a estudar e trouxe a declaração. Agora, ele vai à aula todo dia, das 7 da manhã às 4 da tarde."

A exigência da declaração não afastou as crianças, que, não raro, formam filas de até 15 pessoas na porta da Railander Games, aberta de segunda a sábado, esperando a vez de brincar.

A locadora foi batizada com o nome artístico de Façanha, conhecido como "Railander dos Teclados" por seu trabalho como músico. Ele mesmo escolheu a alcunha, inspirado no protagonista do filme "Highlander" (1986), o "guerreiro imortal".

O cearense complementa a renda da família, formada por ele, a mulher e o filho, tocando em aniversários, casamentos e festas.

Assim como a maioria dos doadores, Façanha não teve acesso a videogames durante grande parte da vida e, por isso, quer proporcionar essa oportunidade às novas gerações. O primeiro contato dele com jogos como Atari e Mega Drive foi aos 15 anos. Na infância do filho, hoje com 23, a família alugava os equipamentos.

"Não podia comprar um videogame, então alugava para ele brincar aos finais de semana. A partir daí, comecei a gostar também", afirma.

Façanha abriu a locadora pela primeira vez em 2008, mas fechou o estabelecimento dois anos depois, devido à queda de público provocada pela popularização da internet. A vontade de trabalhar com videogames nunca desapareceu, e, em setembro de 2023, resolveu tentar a sorte novamente e reabrir as portas.

Ele não tem uma estimativa de quanto mobilizou ao todo em doações até o momento. Informações de como ajudar estão em seu perfil nas redes sociais.

Para além dos games

Mais recentemente, a Railander Games passou a oferecer lanches gratuitos três dias por semana, em parceria com duas panificadoras locais que abraçaram a causa do músico.

Além disso, o proprietário tem aproveitado o alcance nas redes sociais para arrecadar recursos para crianças como Pedro, 9, que aguardava uma ressonância magnética há mais de um ano. Após criar vaquinha na internet, Façanha conseguiu mobilizar R$ 1.000 para pagar pelo exame na rede privada.

No futuro, o cearense pretende dar prosseguimento à política de gratuidade, oferecer lanches diariamente e investir em micro-ônibus para transportar crianças de municípios vizinhos até a locadora, garantindo a elas um espaço de convívio.

"Além da diversão, tem aquele refúgio de sair da tela do celular. Aqui, eles estão interagindo, é aquela bagunça", diz.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.