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Marcio Aith
maith@uol.com.br
  22 de janeiro de 2001
  Bush e o revisionismo precoce:
de burro a hábil estrategista
numa questão de dias
 

Muito já foi dito a respeito da manta de legitimidade conferida a presidentes norte-americanos pela tradicional cerimônia de posse em Washington. No último sábado, George W. Bush beneficiou-se de rituais quase monárquicos para encurtar o fosso que o separa dos presidentes que chegaram à Casa Branca de forma inequívoca - como todos sabem, o novo presidente norte-americano teve quase 600 mil votos a menos que seu principal adversário e, segundo alguns indícios, também teria perdido a eleição no Colégio Eleitoral, fossem todos os votos da Flórida contados adequadamente.

Nos últimos dias, essa manta de legitimidade, jogada sobre a cabeça da população norte-americana, acabou cobrindo também o senso crítico de jornalistas importantes. Depois de passarem meses chamando Bush de intelectualmente desfavorecido, ignorante e mentalmente prejudicado, nomes importantes passaram a ver o presidente com outros olhos e entrevistar "especialistas" com visões elogiosas da capacidade de raciocínio do homem.

Bush foi subitamente transformado num hábil político que finge ser burro para reduzir as expectativas dos eleitores, dos adversários e da imprensa. Sua transformação, de burro para falso burro, operou-se numa questão de dias e amadureceu na exata velocidade com a qual o presidente, então eleito, aproximou-se da posse.

Tenho certeza de que, nos EUA, esse revisionismo precoce foi motivado, entre outros motivos, pela ânsia de jornalistas de se situarem no novo governo.

Encarregada de seguir os passos de Bush, uma jornalista da CNN registrou oito vezes, em apenas duas horas, que ele é o primeiro presidente da história dos EUA a ter um MBA - como se isso tivesse alguma importância no contexto histórico.

O movimento revisionista saiu dos EUA. A publicação alemã "Der Spiegel" trouxe uma bizarra entrevista com Zbigniev Brzezinski, um especialista em assuntos de segurança que assessorou o ex-presidente Jimmy Carter. Vale a pena ler. O ótimo jornal "Valor" a republicou.

Entre outras pérolas, o especialista disse: "Todos ficarão surpresos ao perceber que ele (Bush) simplesmente não é como o mundo está imaginando. Quem vence um adversário, quem faz uma campanha eleitoral baseada em sua responsabilidade de proporcionar oito anos de paz e bem-estar não pode ser um imbecil".

Pois bem: quem disse que Bush venceu as eleições? Quem disse que Bush fez sua própria campanha? Quem disse que foi Bush -e não seu pai- quem escolheu o gabinete? Quem disse que há outra opção para candidatos a presidente que não a de prometer proporcionar anos de paz e bem-estar? Bush pode ser o sujeito mais inteligente do mundo. No entanto, algo de podre, subserviente e colonizado parece haver no raciocínio segundo o qual o resultado das últimas eleições e a posse comprovam a capacidade mental do presidente.

Suas qualidades intelectuais deveriam ter sido registradas lá atrás, no início da campanha, pelos que as enxergam.



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