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André Singer
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  16 de fevereiro de 2001
  Mistura Fina
  
  

Depois do Congresso, guerra pelo crescimento é a próxima batalha

A quarta-feira quente, 14 de fevereiro, em Brasília precisa ser entendida em conjunto. A eleição de Jader Barbalho e Aécio Neves para as presidências do Senado e da Câmara deve ser vista ao lado da decisão de não diminuir a taxa de juros por parte do Banco Central (BC). Os dois fatos configuram as novas tensões no horizonte.

A derrota histórica de Antonio Carlos Magalhães no Senado e do PFL na Câmara fortalece Fernando Henrique Cardoso, José Serra e uma opção econômica mais favorável aos industriais de São Paulo. Saem enfraquecidos Tasso Jereissati e todo o bloco nordestino.

Já a decisão do Banco Central vai na contra-corrente da reviravolta que aconteceu no Legislativo. Ao manter os juros estáveis em lugar de reduzi-los, como se esperava em determinados meios empresariais paulistas, o BC sinaliza para uma política econômica conservadora, que pode implicar um crescimento menor do que os 4,5% previstos pelo Ministério da Fazenda para 2001.

Para que se entenda de modo simples o imbróglio econômico, basta pensar que juro alto (os do Brasil são o segundo maior do planeta) significa menos crédito para investir na produção. Com isso ela cresce menos. Acredita-se que para vencer a pobreza, o país precisaria aumentar o PIB (Produto Interno Bruto) uns 8% ao ano durante um período longo (uma década, talvez). Por isso, a questão dos juros é crucial. Ao mantê-los estáveis, os que hoje dirigem a política econômica condenam o país à estagnação.

Não por acaso, logo no discurso de posse, Jader Barbalho mandou um recado claro aos empresários. Disse que a reforma tributária pode ser votada já (www.radiobras.gov.br). A resposta não demorou. O presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Horácio Lafer Piva, elogiou o discurso e citou, em particular, o trecho que se refere à reforma tributária (http://www.primeiraleitura.com.br/entenda/polit_brasil.asp#10).

A reforma tributária é uma aspiração dos industriais paulistas. Eles alegam que a existência de taxas que incidem em cascata sobre a produção influi sobre a competitividade brasileira. Menos impostos, menos juros e subsídios à indústria, a tal da política industrial, são o núcleo da plataforma apoiada pelos empresários.

O ministro da Saúde, José Serra, anda calado sobre tais assuntos, mas é provável que o acordo que mantém com o empresariado paulista, de quem é o candidato preferencial, passe por esses itens. Aliada ao PMDB, que acaba de ganhar musculatura com a disputa no Congresso, a candidatura de Serra forma um bloco que deverá pressionar FHC por alterações na política econômica.

O presidente, por sua vez, sai fortalecido pela obscuridade em que ingressou ACM. Que a humilhação sofrida por ACM é boa para FHC parece líqüido e certo. O cacique baiano funcionava para o presidente como Ulysses Guimarães no governo Sarney. Queria mandar mais que o ocupante do Planalto e não fazia questão de esconder isso.

Ao contrário, na simbologia toda própria do poder no Brasil, o papel de "verdadeiro centro do poder" era exercido por ACM com indisfarçável gosto. Jader na presidência do Senado é um enorme alívio para FHC. Um verdadeiro grito de libertação.

O incrível é que a derrota de ACM foi mais um golpe de sorte (a fortuna maquiavélica) de FHC. Decorreu de erros do próprio ACM e não de acertos de Fernando Henrique. Por isso, FHC afirma que "a confusão nasceu lá no Congresso, entre eles". Tem razão. ACM enrolou-se na própria ambição, como mostra Fernando Rodrigues.

Do ponto de vista dos interesses presidenciais, nada havia que pudesse ser feito por ACM, a não ser posicionar-se de modo tão radical frente a Jader que fosse dada a vitória a Jefferson Péres, o candidato da oposição. Aposto que, frente a essa alternativa, Fernando Henrique preferiria ter o próprio ACM mais dois anos à frente do Congresso, se fosse legal.

Agora Fernando Henrique Cardoso cuidará, como já ficou claro, de reparar a ferida aberta com a derrota do PFL na Câmara, essa sim um problema. Lá, a candidatura Inocêncio Oliveira era natural até seis meses atrás.

Ninguém acreditava em Aécio. Este se elegeu porque ACM brigou com Jader e, como retaliação, o líder paraense conseguiu conduzir o PMDB para o apoio a Aécio.

Não creio que Inocêncio, Marco Maciel e Jorge Bornhausen tenham qualquer dificuldade para se recompor com Fernando Henrique. Vão, sim, negociar o mais caro que puderem. É essa negociação que estará por trás da recomposição ministerial prevista para março.

Até que ponto esse grupo também está fechado com Serra, é o grande mistério. Se estiver, abre-se uma avenida para a candidatura Serra porque FHC, embora fortalecido, teria poucas chances de resistir a ela.

Se for assim, aguarde-se mudanças na política econômica.


Livro da semana
Ainda às voltas com as conseqüências da vitória de Ariel Sharon em Israel, andei à procura de informações sobre o Oriente Médio. Ganhei do jornalista Mateus Soares de Azevedo o livro "Mística islâmica", que ele publicou pela Vozes no final do ano passado. Em poucas páginas (141), Mateus aporta, em linguagem clara e organizada, algumas noções fundamentais sobre a religião fundada por Maomé ou melhor, Mohamed.

Trecho
"Segundo relatos da época, Maomé amava a solidão, a prece, o jejum e a pobreza; esta última não deve ser confundida com a miséria, mas sim com um mínimo – e não com um máximo – de conforto, e também com o contentamento com a própria condição".

Verso por da semana
Para não sai do assunto anterior, aí vão os versos que recebi, para esta coluna, do jornalista Fábio Peixoto:

"And the German killed the Jews
and the Jews killed the Arabs
and the Arabs killed the hostages
and that is the news"

Roger Waters, em Perfect Sense (part one), do disco
Amused to Death (1992).

Verso pop do fim de semana:
"Você reclama que eu estou tão diferente
Você não sabe o que diz, é evidente"

Luiz Tatit, em "Eu sou eu", do CD Felicidade.

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14/02/2001 - FHC entra em ritmo de campanha. Melhor prestar atenção
06/02/2001 - A ameaça que vem de fora
06/02/2001 - É o eleitorado irracional?
02/02/2001 - Por um Parlamento republicano
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