De barba, maquiagem e turbante, influenciador Luiz Cantú ensina beleza para todos

Biólogo e maquiador dribla preconceito com seus tutoriais e faz as pazes com sua adolescência, quando se produzir era proibido

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O influencer de beleza Luiz Cantú Eduardo Anizelli/Folhapress

São Paulo

Quando o influencer Luiz Cantú sai na rua, seu look é idêntico àquele dos vídeos que ele posta: pele com cobertura viçosa, olhos marcados, batom nos lábios, blush nas bochechas e barba bem aparada. Nos dias em que não quer arrumar o cabelo, Luiz completa a produção com um turbante na cabeça, e só vai.

Duro é lidar com os olhares preconceituosos dos desconhecidos. "Eles não têm vergonha, viram pra me olhar. Mas eu já estou acostumado", diz Luiz. "Uma senhora outro dia ficou me encarando, eu olhei pra ela de volta até ela desviar o olhar. Como ela vai falar mal de mim, se eu estou maravilhoso? Estou só existindo, sem fazer nada de mais."

Na adolescência, Luiz gostava de se maquiar, mas se escondia no banheiro de casa pra fazer isso sem ninguém saber - Eduardo Anizelli/Folhapress

Os perfis de Luiz nas redes vêm ganhando seguidores nos últimos meses, muito porque as marcas de maquiagem e skincare começaram a notar o seu trabalho. Elas apostam no talento do maquiador, que retribui fazendo tutoriais com os recebidos, e um ajuda o outro a crescer.

Latte makeup, strawberry makeup e honey lips são algumas das trends que ele tem gravadas no Instagram e Tik Tok. Para os cabelos, o foco dos vídeos é sempre nos cuidados e na criatividade com fios cacheados.

"Ao fazer o que eu gosto, querendo ou não, estou abrindo caminho para os outros. Falo para as pessoas como eu, queer, negras, que o caminho que elas estão traçando hoje é muito difícil, mas está sendo aberto com facão e não vai ter volta", avalia ele, que tem 39 anos.

"Meu trabalho de certo modo é para acolher o Luiz Fernando de 13 anos que se maquiava escondido no banheiro de casa, achando que aquilo não era para ele. É um trabalho de resgate. Aquele Luiz Fernando não teve autorização e acolhimento pra fazer aquilo, e eu agora volto pra falar pra ele que está tudo bem."

Luiz nasceu na década de 1980, em Madureira, subúrbio na zona norte do Rio de Janeiro. Naquela época, ele conta, tinha medo de "sofrer alguma coisa", porque eram comuns episódios de violência contra homossexuais.

Meu trabalho de certo modo é para acolher o Luiz Fernando de 13 anos que se maquiava escondido no banheiro de casa, achando que aquilo não era para ele. É um trabalho de resgate. Aquele Luiz Fernando não teve autorização e acolhimento pra fazer aquilo, e eu agora volto pra falar pra ele que está tudo bem

Luiz Cantú

influenciador e doutor em biologia

Quando virou adulto, sentia a mesma vergonha daqueles tempos sempre que ia a uma loja para comprar maquiagem. "Eu ainda carregava em mim travas mentais. Aos poucos, comecei a me libertar. Fui estudar mais, consumir conteúdo, e fui me educando, fui entendendo a técnica, praticando", conta.

Mas, até a libertação, foi um caminho bem longo que Luiz percorreu. Se formou em biologia, cursou mestrado e doutorado, trabalhou em laboratório. Sentiu que precisava mudar a vida, mas não era uma decisão fácil. "Sou de origem muito humilde e um ano sabático não seria ficar viajando na Grécia pra descobrir quem eu sou", brinca.

Ele escolheu trabalhar com duas coisas ao mesmo tempo: tradução para dublagem e confeitaria. "Minha mãe trabalhava como manicure para sustentar a gente, e eu passei a ficar em casa sozinho. Aos 13 anos, já era o confeiteiro oficial dos aniversários da família", lembra.

Quando os bolos também começaram a não fazer mais sentido diante das necessidades de Luiz, ele manteve o trabalho de tradutor e trouxe a beleza de volta para a rotina, agora de um jeito mais sério. "A maquiagem está na minha vida desde que me entendo por gente", resume.

"Eu desenhava croqui de roupa para as amigas no colégio, maquiava elas para as festinhas. Só que é isso, Madureira anos 1990, ser maquiador não era uma possibilidade, a gente tinha que seguir por uma carreira 'séria'", diz.

"O estereótipo de ser o menino que anda com as meninas durou muito na minha vida. Só fui me entender como um homem gay aos 21 anos. Viver minha sexualidade abertamente foi só aos 28. Comecei a ir em festas e querer me maquiar. Fui comprando uma maquiagem aqui, uma colinha para apagar a sobrancelha ali, e foi como voltar ao banheiro da minha adolescência."

As primeiras fotos das redes sociais de Luiz eram justamente no banheiro de casa, o único cômodo com iluminação boa que ele tinha à disposição. Para aprimorar sua técnica, fez cursos de especialização e buscou referências. Participou de uma competição no canal GNT e ganhou até um troféu de campeão.

"Meu primeiro recebido foi de Bruna Tavares", lembra. Depois, vieram produtos de Bruna Malheiros, Lacre 21, Natanne Rosa e Vic Beauté, uma das marcas favoritas de Luiz. "Ela tem uma curadoria cuidadosa e muita calma no lançamento de produtos", explica.

Recentemente, deu sua primeira masterclass na loja Sephora. Depois, ensinou na MAC do Shopping Leblon, para falar sobre a coleção em homenagem à cantora Whitney Houston.

"Não são os lugares necessariamente mais acolhedores para uma pessoa queer, são espaços mais tradicionalistas", conta. "Mas levei minha representatividade: fui de turbante, e botei minha modelo de turbante também."

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