Princesa gay, Branca de Neve negra; como publicar um livro infantil assim?
Era uma vez uma princesa que estava prometida para o príncipe, mas se apaixona pela costureira. Em um reino muito distante, um bezerro acha errado crianças beberem leite de vaca. Enquanto isso, uma Branca de Neve negra busca o "felizes para sempre".
Relações homossexuais, veganismo, questões de igualdade de gênero, discussões raciais e outros temas que fogem do padrão estão aparecendo cada vez mais em livros infantis ao redor do mundo –e gerando debate. A prefeitura de Veneza, por exemplo, proibiu em suas escolas públicas títulos "nocivos à família", na palavras do prefeito. Entre eles, a história de um pinguim com dois pais e a de um cãozinho que quer ser bailarina.
No Brasil, escritores encontraram uma maneira de contornar o baixo interesse das grandes editoras por livros desse tipo: com a ajuda da internet. A partir de vaquinhas on-line e projetos de financiamento coletivo, escritores estão conseguindo publicar suas obras de forma independente ou, pelo menos, pagar parte dos custos dela.
TEMA TABU
"O tema é tabu. Acho que por isso tive resistência de editoras na hora de publicar", diz o pernambucano Igor Colares, que, em 2012, juntou mais de R$ 10 mil pela internet para lançar "O Bezerro Escritor". O livro fala com crianças sobre veganismo a partir da história sobre um filhote que reclama do consumo de leite de vaca por humanos. Em materiais de divulgação, o bezerrinho segura uma placa em que aparece escrito: "Vá tomar o leite da sua mãe!".
Após dois meses, a campanha recebeu mais que o dobro do dinheiro pedido inicialmente. "O movimento vegano gostou da ideia, pois não existia conteúdo para crianças sobre o tema", diz o autor, que também ilustrou e fez o design do livro. A Sociedade Vegetariana Brasileira ajudou a vender os mil exemplares impressos.
O caso do bezerro é só um entre diferentes campanhas bem-sucedidas que atingiram ou superaram a meta de financiamento. Segundo o Catarse, maior plataforma brasileira do gênero, 17 projetos de livros infantis dos mais variados temas deram entrada no site neste ano (em 2013, foram dez). Destes, 61% foram bem-sucedidos, número maior que a média da página, que fica em 53%.
O ativismo é palavra-chave para explicar o sucesso que algumas das histórias mais polêmicas alcançam nos financiamentos –como tratam do interesse de determinados grupos, eles se mobilizam e geram verdadeiras campanhas on-line.
"Prefiro pensar que tudo deu certo por causa de demanda reprimida, porque as pessoas querem um material diferente", diz Janaína Leslão, que juntou mais de R$ 11 mil na internet com o seu "A Princesa e a Costureira".
Na história, uma princesa se apaixona pela costureira que fez o vestido de noiva dela, que seria usado no casamento com um príncipe de outro reino. "Mandei a história para cerca de 20 editoras, até achar uma que aceitasse publicar o livro", conta Janaína.
Ao contrário de outros autores, que buscaram na internet uma maneira de publicar suas obras de maneira independente, Janaína encontrou sinal verde da pequena editora Metanóia. Mas, como não havia dinheiro para contratar um ilustrador, ela optou em entrar no Catarse. A meta foi atingida em seis dias. Em pouco mais de um mês, conseguiu mais que o dobro.
Com o dinheiro extra, ela financiará o livro "Joana Princesa", em que a personagem principal nasceu João, mas quer ser menina. "Para mim, o papel da literatura é acolher pessoas que não tiveram suas histórias contadas", diz a autora.
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