Descrição de chapéu Barbie

Entenda por que fabricantes de brinquedos não fazem bonecas acima dos 40 anos

Barbie completa 65 anos sem nunca ter tido cabelos brancos ou rugas; adultos acham velhice feia, diz antropóloga

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São Paulo

Barbie, a boneca famosa que virou até filme, está fazendo aniversário. Neste sábado (9), ela comemora 65 anos de vida. Ao longo desse tempo, ela já vestiu diversas roupas, teve várias profissões, já foi noiva, sereia, princesa… Mas uma das poucas coisas que Barbie não fez nestas seis décadas foi aparentar a idade que tem —ou você já viu uma Barbie de cabelos brancos e ruguinhas no rosto?

IMAGEM GERADA POR IA: Colagem de imagens criadas por inteligência artificial de bonecas Barbie com aproximadamente 65 anos, idade que ela completa neste sábado (9) - Silvis

A fabricante da Barbie se chama Mattel. Ela não faz Barbies que representem mulheres anônimas na terceira idade, assim como outros fabricantes também não acham boa ideia produzir bonecas assim. Na verdade, antes mesmo de chegar aos 65 anos as bonecas já são consideradas desinteressantes e, quando "completam" 40 anos, desaparecem dos planos das marcas.

Muitas décadas atrás, lá pelos anos 1960, as lojas até vendiam bonecas grisalhas. A fabricante Troll, por exemplo, tinha a Vovó Linda, com o slogan "Tão doce e boazinha, vai tricotando roupinhas pra alegrar sua netinha". Também havia bonecas da Dona Benta, do "Sítio do Pica-Pau Amarelo", e até hoje se vê muitas vovós da Chapeuzinho Vermelho em lojas de brinquedos artesanais.

Mas, se na vida real nem toda mulher quer ou vai se tornar avó, por que então imaginar que, ao retratar as mulheres mais velhas como bonecas, elas precisarão ser sempre idosas, e só entrar na brincadeira para cuidar das bonecas crianças? Não dá para ser uma tia legal, uma amiga experiente?

Boneca Barbie criada em homenagem à rainha Elizabeth 2ª; embora fabricante lance edições para colecionadores que representam mulheres mais velhas, não há bonecas de mulheres comuns com mais idade - Mattel Creations / Divulgação

A Folhinha visitou a feira de brinquedos Abrin 2024 na segunda-feira (4) para procurar bonecas "mais velhas". Entre as fashion dolls —que são aquele tipo de boneca com cara de pessoa, corpo humano, cabelos realistas— não foi encontrada nenhuma. Entre as Barbies, só mesmo a vilã Cruella tinha cabelos brancos (e, ainda assim, só metade deles).

No estande da fabricante Candide, havia duas bonecas acima dos "40 anos": Julieta e Alma Madrigal, respectivamente a mãe e a avó da personagem Mirabel Madrigal, da animação "Encanto" (2021), da Disney. Alma, a Abuela, tem cabelos brancos, como no filme.

"A gente tem alguns personagens icônicos, como estas bonecas, e outras que representam séries de TV ou mulheres famosas com mais de 40 anos, como a cantora Whitney Houston. Mas entendo que é mais difícil encontrar bonecas 'anônimas' no mercado. As empresas, em geral, não desenvolvem essas bonecas", diz Bruno Verea, diretor de marketing da Candide.

Boneca da Abuela Alma Madrigal, do fabricante Candide - Divulgação

Ele explica que já há muitos anos os fabricantes de brinquedos produzem basicamente dois tipos de bonecas. "Primeiro, são aquelas que as crianças gostam de cuidar, de colocar chupeta, mamadeira, de vestir, de trocar roupa", afirma.

"Depois, tem as chamadas bonecas aspiracionais", diz. Quando aspiramos por algo, queremos ter ou ser este algo, e as fashion doll entram nesse grupo. A Barbie é uma fashion doll, assim como também são a Bratz, da MGA Entertainment, e a Susi, lançada pela Brinquedos Estrela em 1966 e à venda até hoje. E, para as marcas, nenhuma criança aspira ser uma mulher depois dos 40.

"Existe um preconceito e um estigma muito grandes com a velhice. A velhice é considerada feia, é considerada doença, abandono, perda, solidão. Por que então você vai fazer uma boneca com essa representação tão negativa? Acho que por isso que não existem bonecas assim", afirma a antropóloga Mirian Goldenberg, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, estudiosa da velhice e colunista da Folha.

"Mas se começarmos a enxergar a beleza da velhice, das nossas rugas, dos cabelos brancos, nós vamos ter bonecos lindos. Não só para as crianças brincarem, mas para nós mais velhos também brincarmos e acabarmos com esse estereótipo de que velho não pode brincar, e que, quando brinca, fica ridículo. Brincar é coisa de todas as idades."

Por falar em idade, o diretor de marketing da Brinquedos Estrela, Aires Fernandes, acredita que as crianças não pensam sobre quantos anos a Barbie ou outras bonecas teriam na vida real.

"Elas não sabem se a Barbie ou a Susi têm 30, 40 ou 50 anos. Mas, sim, talvez a criança possa se divertir brincando com uma boneca que represente uma mulher mais velha que ela vê na vida dela. Talvez essa seja uma miopia [problema de visão] do mercado e a gente tenha que pensar a respeito", diz.

"A indústria de brinquedos vai atrás dos movimentos culturais, e acho que essa ideia está amadurecendo e deve crescer nos próximos tempos."

TODO MUNDO LÊ JUNTO

Texto com este selo é indicado para ser lido por responsáveis e educadores com a criança

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