Descrição de chapéu samba

Dona Ivone Lara foi a 'abre-alas' do samba feminino em época de muito machismo

'Como compor um samba é algo sofisticado, se pensava que mulheres não teriam essa capacidade', diz autor de biografia

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São Paulo

Quem vê as sambistas de hoje em dia arrasando na voz e nos instrumentos não imagina que houve um tempo em que samba não era coisa de mulher. "Como se sabia que compor um samba era algo muito sofisticado, e o mundo ainda era muito machista e misógino, se pensava que as mulheres não teriam essa capacidade", diz o escritor Jacques Fux.

Ele acaba de lançar uma biografia para crianças daquela que é considerada a "abre-alas" [expressão que significa "dar passagem"] do mundo do samba para as mulheres: Dona Ivone Lara. Nascida no Rio de Janeiro em 13 de abril de 1922, ela foi uma cantora e compositora que ficou conhecida como Grande Dama do Samba, e também foi a primeira mulher a assinar um samba-enredo, aquela música que as escolas de samba cantam em seus desfiles.

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Ilustração da capa de 'Dona Ivone Lara e o Sonho de Sambar e Encantar', livro de Jacques Fux - Divulgação/Flávia Borges

No livro, Jacques mostra que Dona Ivone rompeu várias barreiras importantes. "Ela fez dois cursos superiores [faculdades], e isso era uma coisa inédita para aquela época, sobretudo para uma mulher negra, com um poder aquisitivo muito baixo", conta o autor. Ivone foi uma das primeiras negras a ter um diploma de uma universidade no Brasil.

Filha da costureira Emerentina Bento da Silva e do mecânico de bicicletas João da Silva Lara, Ivone cresceu em uma casa cheia de música. Seu pai tocava violão de sete cordas e costumava cantarolar com a filha. Quando ela ainda não tinha nem três anos e sua mãe estava grávida de mais uma menina, João morreu.

Emerentina logo se casou de novo, teve outros filhos, e entendeu que o melhor para Ivone naquele momento seria ir para um colégio interno, um tipo de escola em que as crianças moravam e de onde saíam a cada 15 dias para visitar a família e passar com ela um fim de semana.

Na Escola Municipal Orsina da Fonseca, havia um orfeão, uma espécie de coral regido por Lucília Guimarães Villa-Lobos, a mulher do maestro Heitor Villa-Lobos. Ivone fazia parte do orfeão e se apresentou com ele até na televisão. Na casa do tio Dionísio, onde ficava sempre que tinha suas saídas quinzenais, também convivia com vários músicos importantes da época, e assim foram se formando o gosto e a aptidão para a profissão no futuro.

Mas, como disse o autor Jacques Fux, Ivone também teve outras duas ocupações importantes. Quando tinha 17 anos, entrou na faculdade de enfermagem da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UniRio), e depois se especializou em terapia ocupacional com a médica Nise da Silveira, psiquiatra que revolucionou o modo de tratar as pessoas com problemas mentais no Brasil.

Em seu trabalho nessa área, Ivone levava a música e o carinho aos pacientes. Por isso, Jacques acrescentou ao seu livro uma frase da mestre em filosofia política e colunista da Folha Djamila Ribeiro, que disse que Dona Ivone Lara "conheceu e se reconheceu na humanidade do outro". Humanidade significa, entre outras coisas, o sentimento de compaixão pelas pessoas.

"Algumas músicas da Dona Ivone alcançaram o mundo inteiro, e a música é algo que nos conecta os outros, que permite compartilharmos sentimentos e ter empatia pelas pessoas. As músicas dela nos colocam no mesmo lugar, todo mundo junto, independentemente de cor, raça e de diferenças que tenhamos", diz Jacques.

Dona Ivone, que nasceu Yvonne Lara da Costa, ganhou esse "dona" no começo do nome por causa de um empresário carioca chamado Oswaldo Sargentelli, responsável por gravar o primeiro disco de Ivone. Ele achou que ela precisava de um nome artístico.

Ivone não gostou, a princípio. "Ela brincou que não era dona de nada", conta Jacques, que também escreveu no livro a frase "Dona? Pra que dona? Não quero isso, não, sou nova ainda!", que teria sido dita por Dona Ivone.

Entre as músicas mais famosas dela estão "Sonho Meu" e "Alguém me Avisou". "A história de Dona Ivone Lara é muito triste, com muitas perdas, mas o livro, assim como ela, quer ser leve e lúdico. Eu quis mostrar que mesmo diante de muitas privações e dificuldades ela conseguiu nos encantar", afirma o autor. "Ela nos passou muitos sorrisos."

Dona Ivone Lara e o Sonho de Sambar e Encantar

  • Preço R$ 64,90 (64 páginas)
  • Autoria Jacques Fux e Flávia Borges (ilustrações)
  • Editora Companhia das Letrinhas

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