São Paulo, domingo, 26 de dezembro de 1999




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ESPIRITISMO
‘Vá, Paulinho, pode ir que eu deixo’

da Reportagem Local

“A maior prova de fé?” A antiquária Cida Santana repete a pergunta lentamente, mas já tem a resposta pronta: “É receber com coragem aquilo que Deus dá sem você pedir”. É aceitar a tragédia.
Em setembro de 1994, quando voltava de uma festa, Paulinho, um dos três filhos de Cida, levou dois tiros na cabeça durante um assalto. Morreu poucos dias depois, com 28 anos.
“A dor, Deus não arrancou de mim. Ninguém alivia a dor das mães. Em compensação, Deus me livrou do sentimento de vingança, da amargura, de atravessar o resto da minha existência procurando os porquês. Deus me preparou quase três décadas para enfrentar o que enfrentei.”
Três décadas atrás, Cida tomava contato com o espiritismo kardecista. De família tradicional mineira, a comerciante de 57 anos _dona de uma loja de antiguidades nos Jardins, bairro nobre de São Paulo_ nasceu e cresceu católica. Conheceu o kardecismo por influência de uma irmã e não o largou mais. “Na nova religião, tive a chave para explicar tudo.” Descobriu a reencarnação.
“Digamos assim: Deus é o presidente do universo. Cristo, o responsável pela Terra. Abaixo de Cristo, há aqueles que evoluíram espiritualmente _os anjos, os arcanjos e os santos. Depois, estamos nós, os seres humanos, que necessitamos evoluir. Em busca da evolução, retornamos infinitas vezes à Terra. Ou melhor, nossa essência é que retorna, mas sob corpos distintos. Um dia, quando evolui o suficiente, todo ser humano vira anjo, arcanjo ou santo _ainda que, hoje, viva como ladrão, como assassino.”
Para evoluir, deve-se almejar três metas: “o autoconhecimento, a reforma interior e o altruísmo”.
Cida conta que, com os espíritas, também descobriu a lei da ação e reação. “O que se faz aqui, recebe-se de volta, nesta ou em outras encarnações. Por exemplo: me roubam um relógio. O certo é pensar que roubei alguém antes. Não preciso ter roubado relógio. Posso ter roubado uma idéia.”
Lógica idêntica justifica a morte de Paulinho. “Sei que ele e eu merecemos o que se passou. É ação e reação. Tanto que, ao vê-lo no hospital, ainda vivo, consegui agarrá-lo e falar, desesperada: ‘Se Deus quer você, Paulinho, pode ir. Vá, que eu deixo’.”
Cida acredita que, “do plano superior”, o filho a observa. “Às vezes conversamos, mas de modo sutil _em sonhos ou por meio de sensações rápidas, um perfume no ar, uma voz que sai do nada, a impressão de um abraço.” (AA)

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