"Xingu", de Cao Hamburger, refaz a saga dos irmãos Villas Bôas
A 40 quilômetros de Palmas, capital do Tocantins, no meio do mato, o sol queima a mais de 40º e os carrapatos não respeitam nem a parte mais íntima dos homens. O banheiro é daqueles químicos e o chuveiro improvisado cheira à privada entupida.
Nesse cenário, uma pergunta não quer calar: cadê o glamour do cinema?
Está "nas imagens incríveis", nas palavras do diretor Cao Hamburger, captadas nessa e em outras remotas locações de seu novo filme.
Beatriz Lefèvre/Divulgação | ||
João Miguel, Felipe Camargo e Caio Blat filmam em São Félix, no Jalapão (TO), cena com o índio Yotomai Ywalapiti |
"Xingu", cujas filmagens terminam no próximo domingo e o lançamento será em 2011, reconstitui a vida épica dos irmãos Villas Bôas na exploração de matas virgens do oeste brasileiro, a partir dos anos 1940.
Na semana passada, Hamburger e sua equipe, da produtora O2, chegaram ao Parque Indígena do Xingu, onde ficam hospedados em ocas, até a próxima terça. Idealizada pelos Villas Bôas, a reserva foi inaugurada em 1961 e tem hoje cerca de 5.000 índios de 14 diferentes etnias.
O diretor está na oca de Macawana, pai dos índios selecionados para o longa.
Levanta ao raiar do sol, come biju com mel ("delícia") e começa o trabalho com os índios. "Tenho experiência com atores de primeira viagem. Os índios são incrivelmente concentrados e têm facilidade em entrar no jogo da interpretação. Também estão orgulhosos em contar a história de seus avós", afirmou.
Já para o papel dos três irmãos protagonistas, o diretor escolheu atores experientes. Felipe Camargo será Orlando (1914-2002), João Miguel, Cláudio (1916-1998), e Caio Blat, Leonardo (1918-1961).
Editoria de Arte / Folhapress/Editoria de Arte / Folhapress | ||
Na semana retrasada, a Folha acompanhou, perto de Palmas, a cena em que Cláudio e Leonardo, filhos de uma família de classe média, fingem ser sertanejos a fim de conseguir vaga na expedição organizada pelo governo para explorar o oeste.
Caio Blat e João Miguel aguentaram o calor por quase 12 horas em mais um dia duro desse trabalho, que começou bem antes das filmagens, no início do ano, quando o diretor os mandou para um "internato" no Xingu.
"Foi importante ver que eles têm TV de plasma, internet, que estão no Orkut e conseguem manter a mesma cultura, com a economia de subsistência", conta Blat.
Para chegar ao parque, os dois ficaram em um barco por mais de 12 horas.
Lá, diz Blat, a sensação é de uma viagem no tempo. "Aquelas ocas de palha... Parece outro planeta. O cheiro da aldeia é doce, de urucum, pequi. O céu tem uma quantidade absurda de estrelas. Vi três estrelas cadentes seguidas", afirma o ator.
Veja entrevistas dadas à Folha, com edição da O2:
ÉRAMOS TRÊS
Após três meses em longínquas locações, as filmagens se encerram nesta semana em São Paulo, onde os irmãos Villas Bôas deixaram as facilidades da vida urbana para se embrenhar no mato e no complexo e arriscado contato com índios isolados.
O orçamento da produção, de R$ 14 milhões, já teve 70% de seu valor captado por meio de leis de incentivo.
O projeto começou quando Noel, filho de Orlando, procurou Fernando Meirelles com o livro "Marcha para o Oeste", de seu pai e do tio Cláudio. O dono da O2 viu que dava um filme e chamou para dirigi-lo Hamburger, do premiado "O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias".
"Além do livro, fizemos grande pesquisa para não contar uma história oficial. Meu recorte foi o do aspecto pessoal desses três irmãos que escolheram uma vida tão dramática", diz o diretor.
A jornalista LAURA MATTOS viajou a convite da produtora O2
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