Nelson de Oliveira troca de nome e estilo
"Sozinho no Deserto Extremo" é o primeiro romance adulto de Luiz Bras.
Pela orelha do livro, sabe-se que o romancista estreante tem 44 anos, nasceu no Mato Grosso do Sul, é doutor em letras pela USP, adora animações e acredita em telepatias e universos paralelos. E que tem o rosto do escritor Nelson de Oliveira.
Talvez o mais correto fosse dizer que Nelson de Oliveira é que tem o rosto de Luiz Bras.
A troca de identidade começou em 2006. Oliveira, paulista de 46 anos, contava mais de dez anos de carreira e inúmeros prêmios literários quando foi acometido de cansaço criativo. Sentiu que nada mais tinha a dizer.
Deparou-se, então, com um dilema: ou pendurava as chuteiras ou criava um alter ego literário.
Seguiu por este caminho. A escolha de seu novo "eu" foi simples. Luiz vem de seu próprio nome, Nelson Luiz Garcia de Oliveira. Bras satisfez o seu desejo por um nome curto, sonoro e que fizesse referência ao Brasil.
Por quatro anos, os dois tentaram conviver sob uma regra rígida. Oliveira ficaria com a produção acadêmica e a organização de antologias; Bras, com a ficção.
Nesse período, Bras publicou livros de contos ("Paraíso Líquido"), crônicas ("Muitas Peles") e infantis ("A Menina Vermelha").
Oliveira ainda publicaria alguns títulos, inclusive o romance "Poeira: Demônios & Maldições", mas, em meados de 2010, já era "coisa do passado". "Até brinco que o Nelson de Oliveira se aposentou definitivamente e está gozando merecidas férias no Caribe", conta ele.
Zé Carlos Barretta/Folhapress | ||
Nelson de Oliveira/Luiz Bras na avenida Paulista |
FOCO NA TRAMA
Hoje, Bras não só aparece na capa dos livros. É assim que o escritor se identifica nos e-mails, no blog e na caixa postal do celular. Às vezes, por engano, até assina cheques e contratos como se fosse o alter ego.
A mulher e a filha ainda o chamam de Nelson (e de um apelido que não revela nem sob tortura), mas, para alguns amigos, Nelson já é Luiz.
"Eu fico treinando para não confundir os nomes", conta o escritor Marcelino Freire. "Temos que respeitar o desejo dele. Eu brinco que é como o caso de um travesti: depois de toda a preparação, você não pode chamar a Pâmela de Paulão."
"Sozinho no Deserto Extremo" foi a prova de fogo da troca de nome e resultou na vitória definitiva do alter ego.
Em termos literários, Oliveira e Bras são tão divergentes quanto o dr. Jekyll e o mr. Hyde do livro "O Médico e o Monstro". Oliveira, influenciado pelo movimento concretista, priorizava os aspectos formais da linguagem. Bras, fã de ficção científica, preocupa-se, sobretudo, com o enredo dos livros.
"A simples mudança de nome teve um efeito que me impressionou. O Luiz virou a razão de ser da minha literatura", diz.
No romance, o publicitário Davi acorda certa manhã e nota que está sozinho --em casa, na cidade e, talvez, no mundo.
Vagando por uma São Paulo devastada, enfrenta a sensação da "solidão concreta".
O poeta francês Mallarmé, citado por Oliveira em "Poeira", cede espaço para autores de ficção científica como Ray Bradbury e filmes como "O Sexto Sentido" (1999), "Os Outros" (2001) e "Vanilla Sky" (2001),
"A questão da trama para mim é hoje central. Não acredito mais na pura linguagem", diz.
Após quase 45 anos com o nome antigo, o escritor quer seguir por esta tendência no segundo tempo de sua vida. Pelo menos até Oliveira resolver voltar do Caribe.
SOZINHO NO DESERTO EXTREMO
AUTOR Luiz Bras
EDITORA Prumo
QUANTO R$ 34,90 (320 págs.)
Livraria da Folha
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