CRÍTICA
Romance 'Entropia' deixa apenas entrever força do autor
Alexandre Marques Rodrigues foi um dos vencedores do Prêmio Sesc de Literatura de 2014 com os contos de "Parafilias". "Entropia" é seu romance de estreia.
Nele, além de mobilizar pequenos artifícios, o autor brinca com os gêneros textuais. Dentro do livro, há a biografia de um compositor ucraniano que se estabeleceu na cidade de Blumenau, em Santa Catarina. (E que, antes de suavizar, reforça o didatismo próprio do formato.)
O protagonista de "Entropia" é Franz, um burocrata sorumbático. Seu casamento é infeliz; o caso extraconjugal com uma mulher mais jovem avança no piloto automático. Um assunto pendente, de início desconhecido, o conduz a Blumenau.
Apenas na segunda metade do livro o objetivo da peregrinação de Franz fica claro –assim como seu nexo com a biografia do músico.
"Entropia" traz uma trama bem amarrada, que guarda duas ou três surpresas. Poderia, contudo, render mais.
O problema de "Entropia" é o descompasso entre o que tenta entregar e o que de fato entrega. As costuras do romance estão todas aparentes. Se ele fosse um teatro de marionetes, os fios ofuscariam os bonecos.
A viagem de Franz, como tantas na literatura, é sobretudo interior. Para levar a cabo esse duplo deslocamento –uma narrativa com pouca ação, mas durante a qual algo fundamental irá se alterar no íntimo do personagem–, é preciso um autor experiente, que enrede o leitor nas idiossincrasias do viajante.
Quando não há o bastante para manter a engrenagem interna funcionando, é fácil esbarrar na monotonia. A coisa fica mais ou menos assim: "Deu dois passos. Acendeu um cigarro. Fumou. Soprou a fumaça. Olhou para cima. Deu mais três passos. Jogou o cigarro no chão. Suspirou".
Tudo reforça a melancolia, a solidão e o desligamento de Franz, mas não vai além. Certas cenas fluem bem (quando, em terceira ou em primeira pessoa, o protagonista se exalta, a prosa do autor mostra o vigor que pode alcançar), outras são desastrosas.
Há algo que frequentemente ameaça se romper no paranoico Franz e que, todavia, não se rompe. O sexo deveria funcionar como escoadouro do que o personagem reprime, mas acaba espelhando a esterilidade do restante da narrativa. Como reflete o nada, o negativo da emoção, vira recurso vazio.
É o velho truque de tirar o erotismo da cartola quando não há mais nada a ser dito, para garantir um falso clímax.
Entropia |
Alexandre Marques Rodrigues |
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Como não há saída para o vazio, "Entropia" pode parecer um romance que não faz concessões. Mas a falta de alternativa à mesmice, à aridez e à desilusão não mostra senão a dificuldade da narração de ir além, de sair do raso onde chapinha.
Apesar da força que a escrita de Alexandre Marques Rodrigues deixa entrever, "Entropia" não convence.
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