Descrição de chapéu

Madura, banda goiana Carne Doce mostra força em novo álbum

Alheio ao deslumbre de críticos, grupo evolui em 'Tônus' com canções de ambiente minimalista

Rafael Gregorio

Tônus

  • Preço R$ 15
  • Autor Carne Doce
  • Gravadora Natura Musical

Quando lançou seu primeiro disco, em 2014, o grupo Carne Doce agradou.

Canções como “Fetiche”, entre o indie e a MPB dos anos 1970, renderam recepção elogiosa à empreitada do casal Salma Jô (voz) e Macloys Aquino (guitarra).

Eles e os colegas João Victor Santana, Ricardo Machado e Anderson Maia passaram a frequentar a cena de festivais com shows energéticos e lírica de termos como “o progresso é mato”, relevantes para uma banda de Goiânia (GO).

Meca do sertanejo, a cidade há muito se impôs como reduto do rock, de atrações como Boogarins e Black Drawing Chalks, ainda que alheia ao mais visado eixo Rio-São Paulo.

Fórmulas e contextos ganharam polimento em “Princesa” (2016). O segundo disco é prova de fogo, o “sophomore album”, como o definem os de língua inglesa.

O grupo foi aprovado naquele teste pela crítica e pelo público, que cresceu e se tornou menos regional a reboque de maior circulação no Sudeste e no Nordeste.

Desde então, agenda, resenhas e números de streaming deram sinais de que poderia romper o teto a que as atrações de indie rock no Brasil se habituaram; esse é o contexto de “Tônus”.

Lançado na última semana, o disco teve produção de João Victor Santana Campos e recursos do Natura Musical.

Seu título é quase literal: sons e palavras ganharam força. Menos afoitas, as vozes soam mais potentes; os arranjos obtêm mais eletricidade com menos elementos; e, no que mais importa, há diversas belas canções.

Salma Jô, vocalista da banda Carne Doce
Salma Jô, vocalista da banda Carne Doce - Divulgação

No todo, o disco revela um grupo e uma cantora à vontade em migrar do alternativo para um pop rock profundo, ou ao menos um não tão raso —mesmo que ainda não esteja claro como alcançá-lo.

Outra maturidade desponta em fragmentos da faixa-título: Salma, 31, e Macloys, 38, começam a encarar o tempo. “Um corpo jovem/ aquele brilho/ é ofensivo ao coração/ gratidão pela infinitude/ bom saber que vai-se o viço.”

Temas e tipos adultos também ressoam em “Brincadeira” e em “Nova Nova”, que cita uma nora, uma cunhada, um você que continuou.

Com seus ambientes minimalistas e misteriosos, essas canções abrem espaço para as melhores performances de Salma até aqui.

A cantora também mostra personalidade ao situar-se no debate feminista como uma voz que prefere a reflexão e a autocrítica à lacração.

São virtudes valiosas e bastariam para uma avaliação mais generosa, fossem os fins condescendentes e as ambições modestas, só que nem um nem outro.

Embora não deva satisfação a expectativas que não são dela, parece estimulante que a banda Carne Doce seja escutada à luz do enorme potencial que hoje cerca seu nome.

E, se por um lado o grupo forjou à máxima excelência suas vocações e começa a delinear um legado, por outro ainda parecem faltar canções capazes de estourar a bolha nas pistas ou no streaming.

Talvez esses hits se revelem em “Tônus”, ou talvez tenham ficado para o quarto álbum. E tudo bem. Fazer o novo disco soar tão forte nos palcos quanto nos fones de ouvido fará da banda a atração mais interessante do rock nacional em 2018 e será um ótimo começo para a próxima viagem.

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