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Cinema

Com roupas e ritos de benzeção, filme faz ponte entre Brasil e África

'A Rainha Nzinga Chegou' é um dos destaques da programação do 14º Festival de Cinema Latino-Americano.

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A Rainha Nzinga Chegou

  • Quando Hoje (26), às 19h
  • Onde CineSesc, Rua Augusta, 2.075 - Cerqueira César
  • Produção Brasil/Angola, 2019
  • Direção Júnia Torres e Isabel Casimira

O tempo é como uma dobra que se move levando-nos para outros mundos no documentário “A Rainha Nzinga Chegou”, codirigido pelas mineiras Júnia Torres e Isabel Casimira e um dos destaques da programação de hoje do 14º Festival de Cinema Latino-Americano.

As primeiras imagens nos inserem no limbo dos filmes de arquivo. Trata-se de um registro documental feito num passado pouco distinto, meio borrado como as cenas desgastadas pelo tempo, mas ali arquivadas.

Cena de 'A Rainha Nzinga Chegou'
Cena de 'A Rainha Nzinga Chegou' - Divulgação

Nelas há tambores ritmando uma cerimônia de congado e, num plano fugaz, vemos um casal paramentado como rei e rainha. Uma locução típica das antigas formas do documentário explica a origem do congado e que o festejo tem vários tipos: o candombe, mais antigo, do qual vieram o moçambique e o congo.

As danças e cantos presentes nessas imagens servem como passagem para as histórias que seguiremos a partir dali.

Torres e Casimira não adotam o formato do documentário informativo ou jornalístico. Mesmo que contenha depoimentos, a proposta das realizadoras não é relatar linearmente uma história ou reconstituir com alguma objetividade uma prática cultural.

Estamos mais próximos da imersão que da observação. Sendo assim, o papel da música, na forma de cantos, rezas e ladainhas, será decisivo para a narrativa.

O primeiro bloco acompanha o cotidiano de Isabel Cassimira, rainha da Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio. O grupo preserva uma tradição ancestral trazida da África pelos escravos e transmitida ao longo de gerações no interior de Minas Gerais.

As roupas, os ritos de benzeção e as relações da rainha com a comunidade se conectam nas cenas por meio de um olhar que não se preocupa em transformar aquele universo diferente em objeto de estudo.

A morte da rainha introduz um corte nessa postura de familiaridade e lança o filme em outra dimensão, longínqua e ao mesmo tempo conectada.

Uma viagem à África leva dois descendentes de Cassimira a descobrir, desvendando para nós, as origens. Aos poucos, emergem signos ancestrais e sinais de semelhança entre o nascimento da tradição no reinado mítico de Nzinga, no século 15 em Angola, e sua transmissão e transformação do lado de cá do Atlântico.

Esse compartilhamento é mostrado como uma viagem, feita de surpresas e de simpatias, de nexos entre mundos com histórias próprias e mesmo assim próximas.

Apesar de o tratamento se manter fragmentado, “A Rainha Nzinga Chegou” não se transforma em um filme só para iniciados.

O modo como os cantos e danças intervêm projeta passagens, estica linhas tênues entre o que o ritual teria sido na África e o que veio a ser no interior do Brasil.

Ali, as identidades se reconhecem na forma de plantas, de palavras, de valores. Recria-se uma comunidade perdida, um pertencimento que dá a impressão que o tempo não existe.

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