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Cinema

Filme 'Fim de Festa' dá a Irandhir Santos seu melhor papel em anos

Temos aí o modelo exato do que poderia ser um filme a um tempo inteligente e divertido, comercial e autoral

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Fim de Festa

  • Quando Estreia nesta quinta (5)
  • Classificação 16 anos
  • Elenco Irandhir Santos, Hermila Guedes, Arthur Canavarro
  • Produção Brasil, 2019
  • Direção Hilton Lacerda

Quando começa “Fim de Festa” o que há é festa: um grupo de jovens despertando de uma quando Breno (Irandhir Santos) aparece no sofá da sala de sua casa, voltando inesperadamente das férias.

Breno é o pai de Breninho, um da turma que festeja o Carnaval a mil por hora. Mas é também policial. Aqui, o primeiro desconforto: para a rapaziada, Breno não deveria estar de volta e dar de cara com aquela anarquia, pois estava de férias. Ocorre que uma turista, estrangeira no mais, foi assassinada durante as atividades, e as férias de Breno foram para o espaço.

Mas, para nós, espectadores, é reservada logo uma segunda surpresa. Breno não é um tira tipo ressentido. Ele tolera a invasão de sua casa e até mesmo a presença no grupo de Pluto, um cara que ele nem conhece e que por sinal está usando uma cueca sua. Breno até faz uma bela macarronada, que partilha com o pessoal.

Desde então, está feita também a partilha do novo filme de Hilton Lacerda: haverá, em paralelo, o trabalho e a casa, a maturidade e a juventude, as ilusões perdidas e a folia insolente. São, por assim dizer, o yin e o yang, os polos estruturantes da narrativa. Da mesma forma que teremos diante de nós duas formas de imagem audiovisual: a pública (da TV) e a pessoal (colhida pelos foliões) —a primeira, escandalosa e vazia (meramente monetária, no mais) e de outro a dotada de verdade (capacidade de revelação).

Nesse balanço, Breno será um representante pouco convencional da polícia, admita-se. Mas é o que faz boa parte do interesse do filme: ele é ao mesmo tempo um policial aplicado e o cara que fuma sua maconha e dialoga com a garotada. Parece um detetive de filme noir, no sentido em que não usa os métodos habituais da polícia brasileira (tortura etc.), pode ser por vezes violento (ninguém ganha à toa o apelido de “Quebra Muros”), mas investiga tendo por armas principais a razão e a paciência.

Em certo ponto, porém, as duas tramas, o yin e o yang sobre os quais se equilibra o ritmo do filme, se encontram. Aí já falamos não do Hilton Lacerda diretor, que leva o filme com muito mais calma e firmeza do que em sua estreia (“Tatuagem”, de 2013), mas de um roteirista-chave do cinema brasileiro: o cara que escreveu desde “O Baile Perfumado” ao ainda inédito “Piedade”, de Claudio Assis.

O diretor e o roteirista trabalham harmoniosamente, diga-se: estamos diante de um roteiro que apoia a ação com eficiência e de uma direção que produz imagens simples (isto é, claras, diretas, desprovidas de esteticismo), que ilustram e enriquecem muito bem o texto. No mais, oferecem a Irandhir Santos a oportunidade de fazer seu melhor papel em muitos anos, talvez porque bem inesperado, bem inusual. O elenco jovem funciona muito bem, e “Fim de Festa” ainda nos faz o favor de trazer a ótima Hermila Guedes num pequeno papel (por que diabos andará ela tão sumida?).

É verdade que as virtudes do roteiro terminam por apoiar excessivamente a própria direção e torná-la até certo ponto dependente do texto. É difícil evitar isso quando se é roteirista e se tem na mão um texto delicioso como este. Temos aí o modelo exato do que poderia ser um filme a um tempo inteligente e divertido, comercial e autoral, arte e entretenimento. Não será um sucesso, é quase certo, por conta de um sistema de distribuição e exibição lamentável que existe no Brasil, porém tem tudo para merecer a estima das pessoas que gostam de cinema.

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