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Amaldiçoado, novo '007' já enfrentava brigas e explosões no set, aí veio o coronavírus

Hollywood está repleta de longas com histórias de bastidores obscuras, que vão de atrasos nas filmagens a mortes misteriosas

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São Paulo

Não fosse pelo novo coronavírus, cinemas do mundo todo veriam agora suas salas inundadas por fãs de James Bond. Antes marcado para estrear nesta semana, “Sem Tempo para Morrer”, a 25ª aventura do agente secreto britânico nas telonas, era um dos filmes mais aguardados deste ano.

E, na verdade, continua sendo. O longa-metragem foi o primeiro grande título a ter sua estreia global adiada por causa da pandemia de coronavírus. Mas, ao contrário de outros blockbusters jogados para o ano que vem, o filme de 007 segue crente que estreará ainda este ano —por aqui, em 19 de novembro.

A decisão de adiar “Sem Tempo para Morrer” foi necessária, mas nem por isso deixou de frustrar os fãs. O longa era aguardado com ansiedade por diversos fatores —é mais um capítulo de uma das franquias mais celebradas do cinema, marca a despedida de Daniel Craig do papel de Bond, ganhou uma música-tema da queridinha Billie Eilish e, para completar, foi considerado um filme amaldiçoado por muita gente.

É isso mesmo. Uma série de fatores imprevisíveis e inusitados acabou ajudando na campanha de marketing do novo “007”. Ao longo de sua produção, a equipe do filme sofreu diversos reveses. Agora, a Covid-19 e o caos que ela instaurou no mundo cinematográfico chegaram justamente para dar mais sustância à má fama do longa, o que acaba atraindo a atenção de muitos curiosos.

Tudo começou ainda durante a pré-produção de “Sem Tempo para Morrer”. Depois de incertezas em relação ao retorno de Daniel Craig à franquia –ele havia dito que “Spectre”, de 2015, seria sua última aventura como Bond–, um verdadeiro clima de instabilidade se instaurou na MGM.

Responsáveis por todos os roteiros da era Craig em “007”, Neal Purvis e Robert Wade viram seu script ser engavetado quando Danny Boyle, vencedor do Oscar por “Quem Quer Ser um Milionário?”, foi contratado para dirigir o filme. Ele trouxe para o projeto o roteirista John Hodge, com quem trabalhou em “Trainspotting”.

Mas diferenças criativas com os produtores Barbara Broccoli e Michael Wilson logo afastaram a dupla do longa, faltando só três meses para o início das filmagens. Para a direção, então, contrataram Cary Joji Fukunaga.

O drama aumentou durante as gravações. Rumores de que membros da equipe de “Sem Tempo para Morrer” queriam fazer um motim logo ganharam as páginas dos tabloides britânicos. A causa seria Fukunaga, que, de acordo com o The Sun, chegava atrasado ao set porque estava ocupado jogando PlayStation.

Durante as filmagens na Jamaica, Craig sofreu uma fratura no tornozelo e teve que passar por uma cirurgia de emergência. Em junho do ano passado, uma explosão fugiu do controle da equipe de efeitos especiais e destruiu parte do set na Inglaterra. Um funcionário precisou ser internado. No mesmo mês, um homem teria sido preso por instalar câmeras no banheiro feminino da produção.

Com currículo tão desastroso, logo surgiram teorias de que “Sem Tempo para Morrer” estava amaldiçoado. E, quando o pior parecia ter passado, veio a pandemia de coronavírus, que atrasou o lançamento do filme.

O que torna o adiamento particularmente doloroso é o fato de a estreia do longa ter sido inicialmente prevista para novembro de 2019 e depois para fevereiro de 2020, datas que o permitiriam chegar aos cinemas de boa parte do globo antes de o Ocidente soar o alarme para a Covid-19.

Incomodado com a fama de azarão do longa, Craig chegou a falar sobre o assunto à revista GQ. “Isso me irrita, porque eu digo ‘não amaldiçoem nosso filme’, e também porque nós estamos fazendo o nosso melhor”, disse à publicação em março.

Mas as “provas” estão todas aí, e “Sem Tempo para Morrer” inegavelmente seguiu um perfil parecido com o de muitas produções de Hollywood tidas como malditas.

“Eu acredito que qualquer filme possa ser considerado amaldiçoado se uma quantidade suficiente de incidentes imprevisíveis acontecem, afetando sua produção ou lançamento”, diz a escritora e psicanalista britânica Mikita Brottman.

“E um filme pode ser amaldiçoado só para um ator em particular, um membro do público ou diretor, por causa de experiências associadas a ele, que podem ser individuais e únicas.”

Em 1999, Brottman se debruçou sobre alguns dos filmes que carregam a fama de serem inglórios. O resultado da pesquisa foi o livro “Hollywood Hex”, que analisa mortes, acidentes, crimes e excentricidades associadas a produções hollywoodianas. A obra foi alçada ao status de cult nos anos seguintes.

“Eu vi ‘O Exorcista’ sozinha quando tinha nove anos e fiquei apavorada. Eu tive pesadelos por um bom tempo. Anos depois, comecei a me questionar se mais alguém havia passado pela mesma experiência e descobri várias reportagens sobre pessoas que tiveram crises psicóticas depois de ver o filme.”

Foi a partir daí que surgiu seu interesse pelo assunto. Ao mergulhar mais fundo nas pesquisas, Brottman logo descobriu que “O Exorcista” era justamente um dos filmes mais assombrados da história de Hollywood.

Dirigido por William Friedkin em 1973, o clássico de terror foi associado a várias mortes, incluindo a de dois atores pouco antes de sua estreia. Na noite da première italiana, um raio atingiu uma igreja nos arredores do evento e derrubou uma cruz de 400 anos do telhado.

​Outros grandes filmes do gênero também têm suas histórias atravessadas por eventos funestos. “O Bebê de Rosemary”, de 1968, “A Profecia”, de 1976, e “Poltergeist: O Fenômeno”, de 1982, são os mais lembrados.

O magnum opus de Roman Polanski teria trazido desgraça a seu compositor, morto em uma queda acidental, e ao cineasta, que teve a mulher, Sharon Tate, assassinada no ano seguinte à première.

Mas se isso não é suficiente para convencer o leitor, “A Profecia”, por outro lado, teve seus bastidores marcados por coincidências inegavelmente bizarras.

Durante as filmagens, o avião do ator Gregory Peck foi atingido por um raio. Três dias depois, o voo do roteirista David Seltzer passou pela mesma situação. Em seguida, o diretor Richard Donner e o produtor Harvey Bernhard sofreram um acidente de carro.

“Durante toda a gravação houve coisas estranhas acontecendo, era como uma aura dizendo que não éramos bem-vindos. Eu sinceramente acredito que o diabo não queria que o filme fosse feito”, chegou a dizer Bernhard em um vídeo promocional para o relançamento de “A Profecia”.

E os problemas não pararam por aí. A equipe por trás da trama sobre o anticristo estava a caminho de um restaurante em Londres quando ele foi bombardeado pelo IRA. Um avião que faria cenas aéreas para o longa caiu. Horas depois de gravarem uma cena em um zoológico, um leão escapou de sua jaula e matou um guarda do local. Um funcionário de efeitos especiais sofreu um acidente de carro que decapitou sua namorada.

Igualmente macabras são as histórias relacionadas à franquia “Poltergeist”, que teve diversos nomes de seu elenco mortos prematuramente. Entre eles está Heather O'Rourke, a garotinha protagonista, morta aos 12 anos em decorrência de uma parada cardíaca, pouco antes da estreia do terceiro filme da saga.

“Eu acredito que, por serem mais memoráveis de um jeito negativo, filmes de terror são mais frequentemente associados a maldições. Até porque muitos deles lidam com esse tema e com outros elementos sobrenaturais. Mas esses elementos não são obrigatórios”, diz Brottman.

Forças da natureza também se manifestaram nos bastidores de “A Paixão de Cristo”, de 2004, já controverso por sua abordagem da vida de Jesus Cristo. Durante as filmagens, seu protagonista, Jim Caviezel, foi atingido por um raio junto com um assistente de direção.

E, se o filme não precisa dar susto para ganhar o rótulo de maldito, tampouco precisa ter relações polêmicas com a fé. As maldições se estendem a diversos outros longas, de diversos outros gênero, do inocente “O Mágico de Oz”, repleto de acidentes, à franquia “Superman”, que viu algumas de suas estrelas enfrentarem graves problemas de saúde, passando ainda por “Sangue de Bárbaros”, de 1956, que expôs sua equipe a radiação durante as filmagens.

Às vezes inexplicáveis, outras vezes completamente evitáveis, as situações que contribuíram para a criação de um rol de filmes amaldiçoados em Hollywood se apegaram ao imaginário popular e inspiram debates e pesadelos até hoje. Macabras ou não, muitas delas deixariam até mesmo James Bond sem ação.

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