'Parasita' aborda relação comensal perversa que a desigualdade social impõe, dizem debatedores

O filme do sul-coreano Bong Joon Ho foi debatido no Ciclo de Cinema e Psicanálise nesta terça-feira (25)

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São Paulo
Em “Parasita”, as famílias Ki-Taek e Park são duas faces de uma mesma moeda. Mais do que os personagens individuais, o que se destaca no filme são os grupos que expõem uma sociedade de classes enormemente desigual.

Mas o sucesso do filme não se deveu apenas à temática globalizada da desigualdade social. Para os debatedores do Ciclo de Cinema e Psicanálise, que ocorreu a distância nesta terça-feira (25), a obra engloba a lógica do parasitismo, presente em todos os estágios da civilização humana e nas relações entre diversas espécies da natureza.

Estamos diante de um filme sobre arrivismo social, em que a ambição e o desejo de ascender não têm escrúpulos, afirma o psicanalista Plinio Montagna. “Ele expõe de modo avassalador esse sistema de valores reificadores atual.”

No longa de Bong, todos os membros da família Ki-taek estão desempregados e vivem em condições miseráveis, até que um dos filhos consegue emprego como professor de inglês da filha de um casal milionário, os Park. Uma vez dentro da mansão, ele cria oportunidades e farsas para infiltrar toda sua família em diferentes serviços.

Montagna vai além da ideia de parasitismo entre as duas famílias e introduz uma outra relação ecológica: o comensalismo. Diferentemente da primeira, as relações comensais não geram prejuízos entre as espécies, mas acaba beneficiando as duas. “A relação entre as famílias é de nutrição do que cada núcleo pode oferecer. Tem exploração de todos mas um não sobrevive sem o outro.”

Clara Balbi, repórter da Ilustrada, vê nos dois núcleos familiares um espelhamento em que o que tem em um sempre falta no outro, mas diz que o filme não aborda uma luta de classes, visto que também há confronto entre os novos serviçais e os antigos, composto por uma ex-governanta e seu marido.

Esse confronto entre indivíduos da mesma classe é justificado pela psicanalista Luciana Saddi, que mediou o debate, baseando-se em “O Mal-estar na Civilização”, de Sigmund Freud. Para ela, toda a trama é regida pela violência, seja ela física ou psicológica, que vai se tornando mais intensa e assustadora conforme o filme avança. “Os inúmeros choques entre contrários, como abundância e falta, indicam que homens não são criaturas gentis. A guerra, ainda que travada de forma subliminar e disfarçada, muitas vezes parece ser destino e paixão dos homens.”

Para Balbi, o mérito da discussão sobre “Parasita” vem da condução cinematográfica de Bong, que consegue traduzir discussões complexas para um público maior, sem superficializá-las. A filmografia do diretor, diz Balbi, é marcada por tensões sociais, mas sempre traz personagens de caráter duvidoso, longe de serem inocentes.

Indagada pelo público se a cena final não seria um enfrentamento da desigualdade econômica, Balbi responde que é como uma catarse diante da posição social e do tratamento elitista dos Park em relação aos Ki-taek. “É um filme que fala muito sobre o que acontece quando a desigualdade chega a um nível em que toda essa estrutura social é rompida, mesmo que por um minuto, e isso nos leva a atos que são completamente não civilizados.”

O vídeo do debate está disponível no canal do MIS no YouTube. A próxima edição do Ciclo de Cinema e Psicanálise será no dia 8 de setembro, às 20h. O filme debatido será “Rede de Ódio”, disponível na Netflix.

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