Quem é Yola, cantora britânica elogiada por Elton John que une country e soul

Com seu segundo álbum, 'Stand For Myself', artista expõe suas fragilidades e sua experiência enquanto mulher negra

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Danilo Rezende
Dom Viçoso (MG)

Referências sólidas fazem toda a diferença. Se nos anos 1990 o hip-hop usou e abusou de samples das décadas anteriores, com o lançamento de “Back to Black”, em 2006, Amy Winehouse mostrou que legal mesmo era reproduzir com fidelidade a sonoridade de discos do passado.

Clássico instantâneo, o álbum estimulou o aparecimento de um sem fim de artistas que passaram a se apoiar numa estética retrô, com discos cheios de estilo, mas desprovidos de boas composições e vozes marcantes. Exatamente o oposto do que se pode esperar de “Stand for Myself”, segundo álbum da britânica Yola, lançado agora com tudo para entrar nas listas internacionais de melhores do ano.

Combine Minnie Riperton com Aretha Franklin, Tracy Chapman e até Dolly Parton. Yola não só traz na voz a beleza vocal dessas divas, como compõe em total domínio dessas referências. Tem sido apontada pela crítica especializada como uma das melhores vocalistas da atualidade.

“Walk Through Fire”, seu primeiro álbum, de 2019, foi produzido por Dan Auerbach, líder dos Black Keys, e recebeu quatro indicações ao Grammy, incluindo a de artista revelação. À época, o disco foi enquadrado como country-soul.

“Stand For Myself” também foi produzido por Auerbach em seu estúdio em Nashville, berço da música country americana, para onde Yola se mudou definitivamente no ano passado. E é ainda mais difícil de ser definido.

Estão ali o country e o soul, mas também disco music, gospel e tudo a que um pop clássico tem direito –muitas cordas e metais, arranjos luxuosos, ótimas composições e refrãos viciantes. Acima de tudo, a belíssima voz, empregada com elegância e inteligência em todas as 12 faixas. Mas o que têm a ver estilos tão americanos com uma cantora negra e britânica? Em entrevista, Yola explicou.

Nascida Yolanda Claire Quartey, em Bristol, na Inglaterra, em 1983, Yola foi criada em meio a uma extensa coleção de discos de soul, disco music e country da década de 1970. Sua mãe, vinda de Barbados, era enfermeira apaixonada por música e, sempre que podia, atacava de DJ na rádio do hospital. “Quando eu era criança, ela não comprava mais discos porque não tínhamos dinheiro, então todos eles foram colecionados antes de eu nascer”, lembra.

“Já nos anos 1990, eu ficava dançando em volta do rádio, todos os domingos, ouvindo o Top 40 da Radio 1, da BBC. Peguei todo o hip-hop e o R&B daquela época, com D’Angelo, Erykah Badu e principalmente Mary J. Blidge, mas também grunge, Björk e Beck”, conta.

Por causa da familiaridade de Yola com tantos gêneros, “Stand For Myself” resultou um álbum de refinado apuro estético, que anima e emociona como um bom disco dos anos 1970 —“quando minha mãe estava em seu auge”—, mas que sobretudo reflete o seu tempo, o de uma mulher negra em 2021.

“O nome do álbum é justamente sobre lutar pelo meu direito a nuances, à minha feminilidade. É muito fácil ler uma mulher negra como uma heroína, e isso é usado como desculpa para reduzir a minha experiência de vida. Tenho o direito de não ser sempre forte, de poder falhar”, afirma.

“A mensagem do disco é de conexões e delicadezas, que são coisas que podem faltar para você se as pessoas virem você sempre como essa fortaleza da mulher negra, que consequentemente não precisa de ajuda, de cuidado e que também tem sua feminilidade roubada.”

Yola lamenta ter crescido sem exemplos de mulheres da sua cor respeitadas na música britânica. Depois de anos cantando em bares de jazz, por exemplo, foi convidada para sair em turnê, como vocalista principal, pela banda Massive Attack. “As pessoas diziam que eu era backing vocal da banda.”

Certa vez, ouviu de um executivo da música que ninguém queria ouvir uma mulher negra cantando rock. “Entendi que tudo o que aquele cara sabia sobre rock havia sido ‘embranquecido’, e que isso teria tudo a ver com a minha carreira”, lembra. “Ele não sabia nada sobre a Sister Rosetta Tharpe, negra e lésbica, que inventou o rock, pelo amor de Deus.”

Bem, o executivo podia desconhecer a mitológica Sister Rosetta, mas Yola também não poderia imaginar que, no futuro, seria convidada pelo cineasta australiano Baz Luhrmann —“Moulin Rouge”, “Vem Dançar Comigo”— para interpretar justamente a Sister Rosetta em seu novo filme, uma biografia de Elvis Presley com lançamento previsto para o ano que vem.

Sister Rosetta Tharpe foi bastante popular nas décadas de 1930 e 1940, com gravações de canções gospel, e seu virtuosismo e estilo de tocar a guitarra elétrica são reconhecidos como precursores do rock and roll, tendo influenciado desde seus primeiros artistas, como Little Richard, Jerry Lee Lewis e Elvis Presley até guitarristas de gerações posteriores, como Keith Richards e Eric Clapton.

Convidada para participar apenas da trilha sonora do filme, Yola estava no estúdio ensaiando quando foi vista pelo diretor e convocada para as audições. “Acabei ganhando o papel, mas a preparação foi intimidadora, porque ela era uma guitarrista absolutamente monstruosa. Demorei um ano para aprender a solar e cantar junto. Quando virem o filme, saibam que teve muito trabalho ali. Foi um inferno”, brinca.

Sir Elton John, recentemente, resumiu bem. “Yola é uma superstar cuja carreira está prestes a explodir.” Na semana passada, a cantora recebeu um diagnóstico positivo de Covid e teve de cancelar sua participação em festivais nos Estados Unidos e na Grécia.

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