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'Um Herói', de Farhadi, estreia após prêmio em Cannes e acusação de plágio

Filme marca retorno do cineasta iraniano a seu país natal e acompanha um homem que encontra uma bolsa cheia de ouro

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Amir Jadidi em cena do filme

Amir Jadidi em cena do filme 'Um Herói', de Asghar Farhadi Divulgação

Cannes (França)

O que o iraniano ​Asghar Farhadi quer com seu nono longa-metragem é contar "a história de um homem comum que de repente vira um herói e acaba explorado e punido por isso". Foi assim que o diretor descreveu "Um Herói" durante o Festival de Cannes do ano passado, quando venceu o grande prêmio do evento francês.

O filme só chega ao Brasil agora, depois de outra edição de Cannes ter passado —e na qual, dessa vez como membro do júri e não mais como competidor, Farhadi voltou ao longa para abordar uma série de polêmicas na qual "Um Herói" se envolveu nesse ínterim.

O cineasta iraniano Asghar Farhadi, diretor de 'Um Herói' e do oscarizado 'A Separação' e membro do júri do Festival de Cannes deste ano, chega à cerimônia de encerramento do evento - Valery Ache/AFP

Em abril, o cineasta foi indiciado pelo suposto plágio da trama do filme de uma ex-aluna, Azadeh Masihzadeh. Ela acusa Farhadi de ter roubado a ideia para "Um Herói" de um curta-metragem que ela realizou num workshop que o diretor ministrou em 2014.

Em maio, na Riviera Francesa, Farhadi falou sobre o assunto pela primeira vez, rebatendo a acusação e dizendo que "grande parte das informações que estão sendo divulgadas pelos jornais [iranianos] são incorretas".

"O que eu fiz em ‘Um Herói’ não tinha relação com minhas aulas, mas com um evento real. Meu filme é baseado num evento que ocorreu há dois anos e, quando algo assim acontece e recebe cobertura da mídia, então ele se torna de conhecimento público –e podemos fazer o que quisermos com esse evento, sem que uma obra seja cópia da outra", afirmou. O processo ainda corre na Justiça iraniana.

Mais importante que o imbróglio, para Farhadi, é que "Um Herói" representa sua volta ao país natal, depois de "Todos Já Sabem", de 2018, filmado em Torrelaguna, na Espanha, e Madri. O longa, falado em espanhol, tem no elenco atores internacionais –Penélope Cruz, Javier Bardem e Ricardo Darín.

Já "Um Herói", que estreia agora, foi rodado em Shiraz, cidade histórica do sul do Irã, mas não pretende ter a sociedade iraniana como tema central, segundo o cineasta. "As intenções por trás de uma mentira, as consequências inesperadas dos nossos atos, as espirais que a vida percorre são preocupações humanas, não só dos iranianos", disse em entrevista a esta repórter, no longínquo Festival de Cannes do ano passado, ao lançar a obra.

Entre garfadas de uma salada de cuscuz marroquino e legumes, numa mesa ao ar livre no jardim de um escritório da cidade francesa, Farhadi afirmou que a locação, um tesouro nacional que invoca um passado de glória, pode ter combinado com o enredo do filme, mas foi uma escolha secundária.

"Fazer um filme aqui ou ali depende da história que quero contar, e prefiro manter essa liberdade de escolher o tema antes", afirma ele.

Na obra de Farhadi, o suposto herói é Rahim, interpretado pelo iraniano Amir Jadidi, um divorciado pai de um menino pequeno que cumpre pena por calote e sonha em se casar pela segunda vez com a mulher que namora em segredo.

Quando a namorada encontra na rua uma bolsa cheia de peças de ouro, a solução para saldar sua dívida parece ter caído do céu. O casal, porém, não consegue vender os itens, e o presidiário espalha anúncios para tentar devolver a bolsa a seu verdadeiro dono, dando a deixa para que seja transformado no exemplo da vez.

Amir Jadidi, "escolhido para o papel por seu ar gentil", segundo Farhadi, faz um Rahim suficientemente ambíguo para dar profundidade e interesse ao personagem. Com um sorriso amplo e frequente —"um elemento de performance que concede a ele o necessário ar ingênuo"—, ele se enreda em pequenas mentiras que só agravam sua situação.

Durante quase todo o filme, a câmera do diretor iraniano põe o espectador ao lado de Rahim, nas ruas, casas e mercados de Shiraz. É uma estética documental propositalmente escolhida para que o "espírito dominante" da obra seja a realidade.

"Há camadas de abstração, como nas cenas iniciais, mas não pretendo que essa arte se sobreponha à sensação de naturalidade", afirma Farhadi.

As redes sociais, que acabam tendo influência marcante nos desfechos de vários impasses, não faziam parte do projeto inicial da história, conta o diretor. Até que ele se deu conta de que elas eram dominantes em todas as sociedades ao redor do mundo.

"Todas as instituições e grupos sociais usam essa ferramenta. Mas, nessa história, em vez de ser uma forma de comunicação e abertura, é um instrumento para se esconder e dissimular os fatos."

"Um Herói" foi a quarta participação do iraniano no mais importante festival de cinema do mundo, e o terceiro a ser premiado, embora ele nunca tenha levado a Palma de Ouro. Além de "Todos Já Sabem", ele apresentou na cidade francesa "O Passado", de 2013, que ganhou o prêmio do júri ecumênico, e "O Apartamento", de 2016, escolhido como melhor roteiro.

Um dos poucos diretores a ter vencido duas estatuetas do Oscar de melhor filme internacional, com "O Apartamento" e "A Separação", de 2011, Farhadi também ganhou o Urso de Ouro e o prêmio do júri ecumênico do Festival de Berlim por esse último filme. "Procurando Elly", de 2009, levou o Urso de Prata de melhor diretor.

Um Herói

  • Quando Estreia nesta quinta (28)
  • Classificação 12 anos
  • Produção Irã/França, 2021
  • Direção Asghar Farhadi
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