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Primavera Sound troca roda-gigante por música e faz boa estreia em SP

Mesmo com algumas falhas técnicas, festival de Barcelona chegou ao Brasil fazendo dos artistas seu principal trunfo

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A cantora neozelandesa Lorde em show de sua turnê Solar Power no Primavera Sound São Paulo, neste domingo, 6

A cantora neozelandesa Lorde em show de sua turnê Solar Power no Primavera Sound São Paulo, neste domingo, 6 Rubens Cavallari/Folhapress

São Paulo

A mistura de artistas que fogem do mainstream e de novidades queridinhas da cena mundial consagrou o Primavera Sound, que fez sua estreia brasileira no sábado, 5, e no domingo, 6, em São Paulo, como boa opção de um megafestival em que a música que é feita atualmente é protagonista.

Na contramão dos concorrentes no Brasil, como o Lollapalooza e o Rock in Rio, o festival apostou menos em experiências —como as infinitas ativações de marca ou atrações como roda-gigante e montanha-russa—, e deixou o protagonismo para quem estava no palco. Foi sob essa ideia que o Primavera foi fundado em Barcelona, em 2001, e se transformou em um dos principais festivais de música do mundo.

Foi também por causa disso que o evento acabou bem recebido pelas 110 mil pessoas que estiveram no Distrito Anhembi no fim de semana —pouco menos do que a capacidade do local, de 60 mil por dia. A ideia pareceu mudar até o próprio comportamento do público, mais concentrado na música do que costuma ser regra nesses megaeventos.

Alguns artistas, como Björk, até deram puxões de orelha para que os fãs não se distraíssem fazendo fotos durante o show mas, mesmo quando isso não aconteceu, o número de celulares mirando o palco foi menor que o de costume. São cenas raras em tempos de lanternas e flashes acesos na cara do artista.

A cantora islandesa Björk no show de seu álbum 'Fossora' no festival de música Primavera Sound, no Anhembi
A cantora islandesa Björk no show de seu álbum 'Fossora' no festival de música Primavera Sound, no Anhembi - Rubens Cavallari/Folhapress

A atenção também tem a ver com o investimento em nomes novos e aclamados pela crítica, mas que ainda não deram as caras no Brasil —casos de Travis Scott, Phoebe Bridgers e Mitski— ou que lançaram trabalhos recentemente, como Björk, Lorde, Arctic Monkeys e Charli XCX. Isso se reflete nos diálogos dos artistas com seus contemporâneos. Lorde, por exemplo, convidou Bridgers para cantar uma música com ela, e XCX celebrou nominalmente suas colegas de lineup.

É algo que dá respaldo para que o Primavera possa aproveitar o interesse do público em novidades para arriscar mais em atrações que fogem do comum. Enquanto o cantor de indie-folk Father John Misty reuniu uma plateia diminuta, por exemplo, a banda japonesa Chai e a cantora iraniana Sevdaliza fizeram shows elogiados, indicando a boa vontade do público com o que foge do mainstream.

O clima no Primavera também foi ajudado pelo serviço tranquilo das portas para dentro. A quantidade de pessoas estava ajustada, com filas bem distribuídas para comida e bebida, atendimento rápido e preços acessíveis —até inferiores, no caso da alimentação, em relação a outros eventos de grande porte—, além dos bebedouros com água de graça.

Nos minutos que separaram os shows, os banheiros, tanto fixos quanto químicos, não ficaram apinhados de gente. Isso porque eles estavam espalhados por todos os pontos do Anhembi —inclusive com opções sem gênero demarcado.

Não há dúvidas, no entanto, de que o maior problema foi o palco Beck's, o principal do evento, com capacidade para 45 mil pessoas. Montado num estacionamento, o espaço que recebeu shows de Arctic Monkeys e Travis Scott tinha diversas árvores atrapalhando a visão do palco.

A produção até tentou amenizar os efeitos, espalhando telões ao longo da plateia, mas a visão continuava obstruída para quem estava aglomerado nas laterais da pista. Foi também onde o som estava mais baixo, ainda que isso não tenha comprometido nenhum show.

A localização do palco também trouxe outras dificuldades, já que para ir dele até o palco Elo, no sambódromo, era necessário uma caminhada de cerca de 20 minutos. Faz parte da experiência de um festival ter que se locomover entre as atrações mas, ao longo de dois dias, as idas e vindas constantes podem desafiar as pernas do público e quebrar um pouco o clima do festival, já que não é possível ver ou ouvir nada durante o caminho.

Árvores bloqueiam visão de um dos principais palcos do Primavera Sound São Paulo
Árvores bloqueiam visão de um dos principais palcos do Primavera Sound São Paulo - Divulgação

Há de se ter em mente, porém, que este é o primeiro ano do Primavera no país, e é natural que nem tudo funcione perfeitamente de imediato. Entre os acertos da estrutura está o palco Elo, com capacidade para 15 mil pessoas e um dos sons mais altos do evento. Ele foi montado em frente a uma das arquibancadas do sambódromo —o que indica que, apesar do excesso de concreto, seria possível ocupar ainda mais a passarela do samba.

O uso do Auditório Elis Regina também foi uma das novidades positivas, já que o local, com capacidade de 2.700 pessoas, serviu para mais do que um respiro para quem queria descansar. Shows como o de Hermeto Pascoal, que geraram filas do lado de fora, mostraram que o festival pode abrigar artistas menos pop e mais experimentais, com apresentações que exigem uma maior imersão.

Foi curioso ver um auditório tomado por uma plateia com cervejas nas mãos, quebrando um pouco do decoro que um ambiente como esse exige. Além disso, sair de um show eufórico num lugar aberto e em minutos estar diante de uma apresentação de jazz num espaço fechado é algo que diferencia o Primavera dos concorrentes.

O que não pode ser ignorado é a dificuldade do público de ir embora do Distrito Anhembi ao fim de cada dia. O problema extrapola o próprio festival, já que esbarra em questões estruturais da própria cidade, mas foram vistas cenas de multidões na madrugada com dificuldade de conseguir embarcar num carro de aplicativo ou táxi, fora a correria para chegar a tempo do metrô —que só ficou aberto meia hora depois de seu horário habitual.

A decisão de escalar headliners um pouco mais cedo até ajudou, já que a saída foi escalonada entre quem foi só para ver aquela grande atração e quis ir embora a tempo de pegar o transporte público e quem queria ficar até mais tarde. Ainda assim, passou longe de ser suficiente para resolver uma das questões mais latentes de uma cidade que já recebe e pretende receber eventos do porte do Primavera.

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