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Ator Luiz Fernando Guimarães faz biografia rasa, mas ainda eficiente

Mesmo sem se aprofundar em quase nada, ator aborda homossexualidade e revela luta contra o alcoolismo

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Eu Sou uma Série de 11 Capítulos – A Autobiografia

  • Preço R$ 54,90 (200 págs.); R$ 34,90 (ebook)
  • Autoria Luiz Fernando Guimarães
  • Editora Globo Livros

Existem biografias que mergulham na psique do biografado. Trazem uma abundância de dados, com datas precisas e análises minuciosas do contexto histórico. "Eu Sou uma Série de 11 Capítulos", de Luiz Fernando Guimarães, não é uma delas.

Para começar, é uma autobiografia, o que já pressupõe uma certa tendência à autoindulgência e à autocongratulação. Além do mais, os 11 capítulos citados no título não seguem uma ordem cronológica rígida, apesar de começarem com o nascimento do ator e terminarem com ele nos dias de hoje. A narrativa é interrompida a todo momento por lembranças aleatórias, casos de graça variável e depoimentos de amigos e parentes.

 O ator Luiz Fernando Guimarães durante entrevista no Hotel Mercure São Paulo Ginásio Ibirapuera, na zona sul de São Paulo (SP)
O ator Luiz Fernando Guimarães durante entrevista no hotel Mercure São Paulo Ginásio Ibirapuera, na zona sul de São Paulo - Marlene Bergamo/Folhapress

São tantos depoimentos, aliás, que Guimarães parece ter delegado a terceiros a missão de escrever sua autobiografia. Algo que combina perfeitamente com a persona dramática simpaticamente preguiçosa que ele cultivou ao longo de quase 50 anos de carreira.

Carreira esta que foi marcada por, pelo menos, três enormes sucessos. O primeiro deles foi a peça "Trate-Me Leão", talvez o mais influente espetáculo produzido no Brasil na década de 1970. A terceira montagem do grupo Asdrúbal Trouxe o Trombone, que Guimarães integrava ao lado de Regina Casé, Evandro Mesquita, Patricya Travassos e outros, era uma criação coletiva que refletia as angústias dos jovens durante a ditadura militar.

Falando assim parece um drama, mas os momentos de humor rasgado predominavam. Ficou anos em cartaz e inspirou o surgimento de dezenas de outros grupos, amadores e profissionais.

O segundo grande êxito foi o humorístico "TV Pirata", da Globo, exibido entre 1988 e 1990. O pouco tempo no ar não corresponde ao impacto do programa que, a rigor, marcou uma troca de geração no humor televisivo brasileiro, com menos bordões e uma linguagem mais natural e descontraída.

O terceiro, finalmente, foi a série "Os Normais", também da Globo, que teve três temporadas entre 2001 e 2003. O texto de Alexandre Machado e Fernanda Young deu a Guimarães seu mais icônico personagem, Rui, um sujeito "normal" que tinha em Vani, papel de Fernanda Torres, uma noiva também "normal". Até hoje, é a melhor sitcom brasileira de todos os tempos.

Luiz Fernando Guimarães, Marco Nanini, Cláudia Raia, Guilherme Karam, Diogo Vilela e Ney Latorraca em 'TV Pirata' - Instagram/luizguimaraesoficial

Esses três marcos não são ignorados pelo ator, ao contrário. Mas ele não oferece muitos detalhes da gênese de cada produção, se atendo mais a casos de bastidores e pequenas curiosidades.

A revelação mais bombástica do livro —sua luta contra o alcoolismo, que nunca havia vindo a público— tampouco merece muitas páginas. Guimarães não diminui a gravidade da situação, mas não se estende muito ao contar.

Mais espaço ganham a homossexualidade e o relacionamento com Adriano Medeiros, que já dura 25 anos. O namoro, o casamento, a adoção de duas crianças e a Covid que quase levou o marido são contados com indisfarçável emoção.

Luiz Fernando Guimarães com o marido Adriano Medeiros e os filhos Dante e Olívia - Instagram/luizguimaraesoficial

Nesse ponto, Guimarães paga uma espécie de dívida histórica, apesar de ele mesmo declarar que não se sente devedor. Como outros atores de sua geração, só assumiu publicamente que era gay bem depois dos 50 anos, quando os papéis de galã romântico são mais improváveis.

Também nunca empunhou bandeiras do movimento LGBTQIA+. Mesmo assim, diz que nunca esteve no armário —sempre foi homossexual e jamais fez segredo disso. Ao menos hoje ele fala com tranquilidade sobre sua bonita família, e isso é bom para todo mundo.

O tom de "Eu Sou uma Série de 11 Capítulos" é absolutamente coloquial, o que faz pensar que o ator não escreveu o texto, mas gravou suas recordações em voz alta e depois as transcreveu. Quase dá para ouvir sua voz, e o livro ficaria mais divertido e interessante se ganhasse uma versão em áudio.

Mesmo pulando de um assunto para o outro, contando histórias insignificantes e não se aprofundando em quase nada, Luiz Fernando Guimarães consegue pintar um bom retrato de si mesmo. Sua personalidade única transborda na maneira como narra sua própria vida, e o leitor fica com a sensação de que, agora, realmente o conhece melhor.

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