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Marcos Veras desafia Shakespeare 'estrelinha' em 'Alguma Coisa Podre!'

Musical em cartaz no Teatro Porto conta história dos irmãos Rêgo Soutto, que antecipam criação dos musicais

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São Paulo

Gustavo Barchilon caminhava pelas ruas de Nova York quando encontrou pela primeira vez "Something Rotten!". De cara, ao ver as duas palavras, soube que tinha alguma coisa a ver com Shakespeare. "Há algo de podre no reino da Dinamarca", proclama Marcellus em uma cena famosa de "Hamlet".

Mas o ponto de exclamação no fim do título enfraquecia a promessa de uma tragédia ao estilo do bardo. Tomado pela curiosidade, Barchilon quis saber mais sobre o musical, que agora estreia em São Paulo, no Teatro Porto.

O musical 'Alguma Coisa Podre!', com Marcos Veras, no Teatro Porto - Karime Xavier/Folhapress

"Alguma Coisa Podre!" se passa na virada do século 16 para o 17. William Shakespeare, encarnado por George Sauma, acabou de lançar o sucesso "Romeu e Julieta" e ascendeu como um rock star sedutor e um tanto vaidoso.

Sob a sombra de Will, os irmãos Rêgo Soutto tentam emplacar seu próprio sucesso. Nick, o mais velho dos dois, interpretado por Marcos Veras, é um articulador ambicioso que morre de inveja de Shakespeare, com quem chegou a trabalhar, mas que ascendeu muito além dele.

Nigel, seu irmão e personagem de Leo Bahia, é um homem sensível e um poeta habilidoso que não disfarça a admiração pelo grande dramaturgo. Em meio à busca pelo sucesso, vive seu próprio amor proibido com a filha de um pastor avesso às artes e aos prazeres da carne.

Desesperado para criar algo que possa competir com o sucesso das obras de Shakespeare, Nick visita um sobrinho do conhecido vidente Nostradamus, personagem de Wendell Bendelack, que prevê um futuro onde os atores cantarão suas falas. Os Rêgo Soutto decidem, então, criar o primeiro musical da história.

Formato definido, fica faltando a trama. O vidente espia, após um pedido desesperado de Nick, qual será o próximo grande sucesso de Shakespeare. No telefone sem fio da presciência, "Hamlet" se confunde com "Omelete", dando origem a um grande besteirol.

Marcos Veras não abandona completamente Nick durante a entrevista. Em seu camarim, após trocas com o figurinista Fábio Namatame sobre a melhor bota a ser usada em cena, ele discutiu seu personagem e a experiência de fazer seu primeiro musical.

"Nick é um apaixonado pela arte que quer o que muitos profissionais querem —fazer sucesso e ganhar dinheiro", diz. "Ele tem uma trupe de teatro, mas não emplaca nada, por causa de um tal de William Shakespeare, que teve sorte ou algum parente que botou ele lá."

Já George Sauma, rival de Veras na peça, promete ao público mostrar a intimidade do grande dramaturgo renascentista. "O musical cria esse imaginário do Shakespeare como um Mick Jagger, um ídolo pop que tem os sonetos como seus grandes hits", descreve.

"A peça é um grande deboche e uma grande homenagem à devoção às artes que aconteceu no renascimento. Tem uma grande qualidade técnica de figurino, de luz, de dança —para, no fundo, ser uma grande galhofa", diz Sauma.

Ao lado de Nick Rêgo Soutto, está a personagem de Laila Garin, que se revela uma atriz talentosa ao se disfarçar de homem para trabalhar e ajudar a segurar a barra do amante tresloucado.

"Os homens não se deixam ajudar, tem muita dificuldade de pedir ajuda. E ela está ali, querendo ajudar o Nick", afirma a atriz, que descreve sua personagem como um tipo de pré-feminista, que não tem os mesmos direitos que os homens, mas desconfia que deve ter.

Em seu primeiro musical no estilo da Broadway, a atriz, familiarizada com o canto lírico e a música brasileira, após ter interpretado Carmem Miranda e Elis Regina, busca experimentar novas técnicas, mas priorizando a interpretação. Aproveita a experiência dos colegas para desenvolver seu lado cômico, que explorou menos até agora.

Ao mesmo tempo que é um musical sobre musicais, "Alguma Coisa Podre!" é uma sátira ao formato, que se diverte reforçando e quebrando as expectativas criadas em torno dele. Essa iconoclastia ou sátira de si é reforçada pela direção e pela escolha de elenco de Barchilon, que teve liberdade para modificar o material original.

A versão brasileira incorpora menções a artistas nacionais, de Djavan a Paulo Coelho, numa tentativa de acolher o público nacional, a quem Shakespeare é menos familiar do que nos países anglófonos, onde o bardo assombrou a vida de cada estudante.

Alguma Coisa Podre!

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