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Artes Cênicas

'O Machete' une erudito e popular com Machado, Bach e Chiquinha Gonzaga

Ópera de André Mehmari no Theatro São Pedro é espetáculo musical que faz metáfora com história de amor frustrada

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O Machete

  • Quando De 22/6 a 25/6; qui. a sáb. às 20h; dom. às 17h
  • Onde Theatro São Pedro - r. Barra Funda, 171 - São Paulo
  • Preço Grátis
  • Autoria André Mehmari
  • Elenco Wagner Platero, Wiliam Manoel, Alessandra Carvalho, Robert Willian, Alessandra Wingter, Marcella Bueno e Maria Thereza
  • Direção Julianna Santos

Um espetáculo musicalmente engenhoso e visualmente bonito estará em cartaz entre esta quinta-feira e domingo no Theatro São Pedro. É a ópera "O Machete", em que o compositor André Mehmari adaptou um conto publicado em 1878 por Machado de Assis. Detalhe agradável: os ingressos são gratuitos.

Machete é um instrumento de cordas português, um pouco maior que um cavaquinho e menor que uma viola. O texto do escritor brasileiro o associa ao estudante Barbosa, que funciona no enredo como contraponto a Inácio, intérprete bissexto do violoncelo.

Ensaio aberto da ópera 'O Machete', baseada em Machado de Assis, que estreia nesta quinta, no Theatro São Pedro - Bruno Santos/Folhapress

A montagem lírica traz os jovens cantores da Academia de Ópera do Theatro São Pedro, sob a direção cênica de Juliana Santos. Os músicos da Orquestra Jovem do teatro estão sob a regência de Maira Ferreira, que corriqueiramente dirige o Coral Paulistano, no Theatro Municipal de São Paulo.

Mas o epicentro da ópera é André Mehmari, que chega aos 46 anos como um compositor maduro e consagrado no meio brasileiro da música de concerto. Também autor do libreto, exercita um estilo que ele próprio qualifica de maxixe barroco, sequência de pequenas citações de peças do repertório que remetem à brasilidade entre o final do século 19 e as primeiras décadas do século 20.

Habitam esse miolo musical personagens como Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth ou Anacleto de Medeiros. Mas Mehmari não opera uma simples colagem de trechos armazenados na memória de um público medianamente informado. Ele toma sequências de quatro ou cinco compassos e transfigura as notas musicais numa outra tonalidade, mantendo, no entanto, o ritmo e o gingado que permitam o reconhecimento.

De maneira parecida, "O Machete" traz citações de Bach, Mozart, Bizet ou Villa-Lobos, que entram com naturalidade numa receita com técnicas complicadas da escrita musical, mas que, no entanto, produzem um efeito leve e divertido. Em nenhum momento a ópera abandona a pista de um refinado entretenimento.

Com o libreto e a melodia partindo da mesma cabeça, outra dimensão do espetáculo é a coincidência da acentuação do idioma e das notas fortes das frases musicais. E Mehmari não se limita às falas e ao vocabulário de Machado de Assis. Ele as amplia, viaja até por versos de Olavo Bilac.

A regente Maira Ferreira, que preparou os cantores —são dois elencos que se alternam nas diferentes récitas— relata sua opção pela dicção mais coloquial. Não existe sucessão de vogais longas para que se fale um português musicalmente chique, porém superficial. Em tempo: há supertítulos projetados para quem preferir não acompanhar apenas a dicção dos cantores.

E ainda sobre a regente, ela se apega com energia ao ritmo de cada fragmento musical e o impõe com facilidade à orquestra.

Por fim, há o lindo espetáculo visual que a produção oferece. O segundo e o terceiro planos do palco são cobertos por painéis verticais de tecido transparente. Entre eles, formam-se corredores pelos quais transitam personagens que não estão em seus momentos de canto.

É um movimento lento e constante da direita para a esquerda. Um presente para o olhar do público. Os personagens, e é um detalhe cuidadoso, estão todos vestidos como cidadãos urbanos do final do século 19.

O enredo do conto machadiano e da ópera traz uma forte riqueza metafórica. Por detrás de uma história frustrada de amor, há a disputa entre a cultura erudita e a popular.

O violoncelista Inácio faz de tudo para agradar sua mulher, Carlota, tentando dedicar-lhe um concerto para violoncelo que jamais vê a luz do dia. Carlota, no entanto, se encanta pela machete do jovem e sedutor Barbosa. Ela abandona o marido pelo instrumentista mais ligado à tradição popular.

Esta é a segunda adaptação para a ópera que Mehmari faz de Machado de Assis. A primeira, em Vitória, no Espírito Santo, tomou por base o romance "Esaú e Jacó". Nos planos dele há mais um Machado em vista: "O Alienista", com o antológico e curioso Simão Bacamarte.

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