Descrição de chapéu Livros

Antes de 'Macunaíma', Mário de Andrade escreveu sobre iniciação sexual de jovem

Coleção Folha traz 'Amar, Verbo Intransitivo', que inovou na linguagem ao retratar elite paulistana

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Porto Alegre

É como se Mário de Andrade olhasse com lupa a elite paulistana da década de 1920. Com a lente de aumento que ele providencia, enxergamos os novos ricos e suas fazendas de café, casarões no bairro de

Higienópolis e jovens herdeiros que se ocupam lutando boxe. Esse é o ecossistema social onde habitam os personagens do romance "Amar, Verbo Intransitivo", de 1927.

Retrato do escritor Mário de Andrade por Tarsila do Amaral, feito em 1922 - Divulgação

Para dar ainda mais tempero a toda essa história sobre ricaços paulistanos e seus dramas, o verbo "amar" do título é apenas um eufemismo que suaviza o verdadeiro sentido. "Amar", nesse léxico andradiano, significa ter relações sexuais. Serve também, quem sabe, como um ímã para os leitores em busca de uma história romântica, mas que encontrarão no lugar uma narrativa sobre iniciação sexual.

O livro, que antecedeu "Macunaíma" em um ano no projeto literário do escritor, é parte da Coleção Folha Clássicos da Literatura Luso-Brasileira. O volume chega às bancas de jornais neste domingo.

Andrade narra a história de como o empreendedor Sousa Costa contrata a alemã Elza para educar sexualmente seu filho mais velho, Carlos, de apenas 15 anos. As três irmãs mais novas do garoto têm na figura de Elza apenas uma governanta e professora, um tanto impaciente por ter de lidar com as crianças. Embora alheias ao acerto contratual feito pelo pai com Elza, às vezes elas demonstram estranhar o comportamento do irmão, que passa a atuar de modo ainda mais desajeitado na presença da alemã.

Uma das primeiras exigências de Elza —além de um substancial pagamento— é que o pai, Sousa Costa, deixe sua mulher ciente do papel que ela desempenhará na vida do jovem Carlos.

"Desculpe insistir. É preciso avisá-la. Não me agradaria ser tomada por aventureira, sou séria. E tenho 35 anos, senhor. Certamente não irei se sua esposa não souber o que vou fazer lá. Tenho a profissão que uma fraqueza me permitiu exercer, nada mais nada menos. É uma profissão", argumenta a alemã.

A mãe inicialmente não sabe nada sobre o acordo, mas, depois de sofrer algum espanto, não se opõe. Ela conclui que é melhor que seja assim, o filho se relacionar com uma mulher vista como superior por ser alemã. O leitor tem acesso, em diversos pontos do livro, ao raciocínio racista de Elza, algumas vezes corroborado pelo próprio narrador.

"Vejam por exemplo a Alemanha, que-dê raça mais forte? Nenhuma. E justamente porque mais forte e indestrutível neles o conceito da família. Os filhos nascem robustos. As mulheres são grandes e claras. São fecundas. O nobre destino do homem é se conservar sadio e procurar esposa prodigiosamente sadia. De raça superior, como ela, Fräulein. Os negros são de raça inferior. Os índios também. Os portugueses também", declara o narrador sobre as ideias evidentemente equivocadas de Elza.

Todavia, o narrador de certa forma endossa, chamando de "verdade", o que pensa a mulher. "Mas esta última verdade Fräulein não fala aos alunos."

Não foi o tema do racismo, contudo, que fez com que a obra ganhasse uma crítica negativa em 21 de março de 1927 neste mesmo jornal, então chamado Folha da Manhã.

Mário de Andrade, chamado ironicamente de "Sumo Pontífice do futurismo" no texto publicado, é acusado de praticar "atentados à gramática". A crítica aponta que "Papa Mário", "cometendo as maiores liberdades, quer em sintaxe, quer em morfologia, se prende violentamente a estranhas formas ortográficas".

A crítica rendeu até o chamado "erramos", no jargão. Em nota no dia seguinte, o jornal se corrigiu avisando que, "por descuidos de revisão", o autor da resenha era Silveira Bueno e não Siquera Guerra.

Entretanto, é justamente por essa inovação da linguagem que Mário de Andrade acabou se tornando o mais consagrado autor paulistano e um dos principais nomes da literatura escrita no século 20.

A escritora e crítica literária Naomi Jaffe, em texto na contracapa desta edição da Coleção Folha, afirma que "‘Amar, Verbo Intransitivo’ propõe ao romance brasileiro uma melodia nova, composta pela fala e pelas máquinas". "Como ele disse num posfácio a este livro: ‘Ser melodia nova não quer dizer feia. Carece primeiro a gente se acostumar’."


COMO COMPRAR

Site da coleção: https://colecoes.folha.com.br/

Telefone: (11) 3224-3090 (Grande São Paulo) e 0800 775 8080 (outras localidades)

Frete grátis: SP, RJ, MG e PR (na compra da coleção completa)

Nas bancas: R$ 25,90 o volume

Coleção completa: R$ 638,44 (para assinantes Folha)
Demais leitores: R$ 751,10
Lote avulso: R$ 150,22

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.