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crítica de filmes

Filme se apoia em fama de Seinfeld, mas humor é infantil e publicitário

Pequenos toques críticos não disfarçam que 'A Batalha dos Biscoitos Pop-Tart' é uma operação neoliberal da Kellogg's

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A Batalho do Biscoito Pop-Tart

  • Quando Estreia nesta sexta (3), na Netflix
  • Classificação 12 anos
  • Elenco Jerry Seinfeld, Melissa McCarthy e Amy Schumer
  • Produção EUA, 2023
  • Direção Jerry Seinfeld

Tudo começa com "Barbie", monumental relançamento da boneca histórica em chave feminista que a direção inventiva transformou num espetáculo agradável. Agora nos chega a Kellogg’s, a famosa fabricante de sucrilhos e outros matinais, apoiada no prestígio de Jerry Seinfeld, célebre comediante da televisão e do streaming dos Estados Unidos.

Seinfeld fez o que se poderia chamar de filme de autor —produz, escreve e dirige o filme sobre a criação dos biscoitos lançados em 1964 e ainda hoje prato matinal de grande penetração naquele país. Ele também é o executivo da empresa envolvido em sua produção e quem, no futuro, narra a história a um menino de era mais recente.

Hugh Grant em cena do filme 'A Batalha do Biscoito Pop-Tart', de Jerry Seinfeld - Divulgação

Qual o motivo, então, de dedicar um filme aos Pop-Tarts? Lembrar às novas gerações, em parte contaminadas pela alimentação orgânica, que a indústria ainda existe? Chamar as plateias de países, como o Brasil, que nunca deram bola para esse tipo de café da manhã e, muito menos, para os tais biscoitos? Também pode ser.

Mas a verdade é que Seinfeld parece, não raro, trabalhar contra a Pop-Tart e, portanto, à Kellog’s. Por exemplo, quando dedica boa parte do filme a mostrar quanta química vai na produção do Pop-Tart, qual a combinação de elementos para dar a impressão de que um produto da indústria é feito mesmo de frutas perecíveis a curto prazo etc.

Imaginar que aí exista mesmo um elemento crítico desagradável à grande indústria é improvável: equivaleria a imaginar que um comediante, por célebre que seja, arrisque ser processado até o último centavo por uma multinacional poderosa. Mesmo que ganhasse os processos, o risco seria imenso.

Mais fácil é imaginar que esses pequenos toques críticos sirvam para melhor encobrir o caráter de operação publicitária do filme, que vende ostensivamente a marca a seus potenciais consumidores como coisa simpática e, no mais, dirigida um grupo de pessoas um tanto simplórias e, no fundo, bem-intencionadas.

O fato é que o humor deste filme é quase sempre ralo e nada condizente com a fama de Seinfeld. Ainda que endereçado ao público infantil, mais receptivo à simples enunciação da comédia pastelão, com tipos meio estranhos, uma ou outra explosão acontecendo.

Entre mortos e mordidos, quem se sai melhor é Hugh Grant, na pele do suposto grande ator teatral que ganha a vida escondido sob a pele do tigre da Kellog’s.

No entanto, o melhor momento do filme, aquele que resgata todos os seus momentos sub-humorísticos, é a entrada súbita de dois atores da série "Mad Men" —Jon Hamm, o gênio da turma, e o chefe da agência, John Slattery—, chamados a fazer a publicidade do novo produto, fazendo propostas mais que absurdas para vender o produto.

Talvez a melhor imagem do filme e de seu significado venha bem no fim, quando as prateleiras de Pop-Tart esvaziam numa rapidez alucinante, enquanto o produto da concorrente, similar em tudo e por tudo ao da Kellogg’s, está destinado a mofar nas prateleiras até ser retirado do mercado.

A força de um nome feliz —Pop-Tart derivando de pop art, explosiva expressão artístico-publicitária da época— vale fortunas, nos lembra o filme. Mas lembra também, evocando um tempo feliz, como é sempre o passado, que o concorrente existe para ser eliminado ou nos eliminar.

Qualquer cochilo pode ser fatal: os tempos são neoliberais. Que o digam os mascotes da Kellogg’s, sumariamente demitidos ao fazer uma passeata por maiores salários.

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