Descrição de chapéu Perspectivas

Com concursos e difusão de imagens, redes sociais dão fôlego a fotoclubismo

Em resposta a Iatã Cannabrava, autor defende que internet democratizou e acelerou circulação de fotografias

Ailton Tenório

Em texto na Ilustríssima de 3 de junho, o mestre Iatã Cannabrava apresentou uma questão que mexeu com o fotoclubismo. Ele argumentou que o futuro dessa prática está na "revolução sem precedentes" que surge nas cidades a partir de "processos de pertencimento, empoderamento e liberação de dogmas".

No mesmo artigo, diz ser radicalmente contrário à possibilidade de o fotoclubismo se tornar uma nova mídia social ou ser transposto para o formato de uma ferramenta digital.

Eu penso de outra forma. O fotoclubismo quase morreu nos anos 1980, mas seu renascimento no começo deste século, a meu ver, se deu em clubes com forte atuação nas novas mídias sociais. A revolução que Iatã quer já existe, talvez não como aglutinadora dos movimentos de minorias, mas visando o belo: fotografar pelo prazer de retratar uma cena única e apresentá-la ao mundo.

foto aérea do largo do paissandú
”As Linhas e Cores de São Paulo” (2017), foto selecionada pelo Fotoclube ABCclick para Residência Artística da Universidade de Salamanca - Marcos Sanchez

Para Iatã, o fotoclubismo talvez tenha sido a primeira grande rede mundial, já que permitia a uma fotografia circular por diversos países, passando de salão em salão.

A internet democratizou e acelerou esse processo. Agora, no formato digital, as imagens são avaliadas por centenas ou milhares de entusiastas e fazem seu giro pelo mundo com muito mais velocidade e atingindo muito mais pessoas.

Esse processo começou em 2009 no DPreview, site que costumava ser a bíblia das câmeras fotográficas e que lançou a proposta dos "challenges" —desafios em que todos podiam participar com fotos e influenciar o resultado ao votar nas melhores imagens. O domínio contabiliza mais de 10 mil competições abertas desde então, cerca de três por dia.

Surgiram vários outros sites de concursos fotográficos, como o GuruShots, de 2010, que conta com mais de 1 bilhão de votos por mês em seus desafios. No Brasil, grupos em redes sociais, como o Coletivo Desafio 10+, fazem dessas contendas uma grande festa da fotografia.

Nesse contexto, uma das revoluções feitas pelo Fotoclube ABCclick foi a implementação do sistema de votação popular pela internet no 2º Salão Nacional de Arte Fotográfica, em 2012. O sistema foi aperfeiçoado nos últimos anos e ampliou a participação de fotoclubistas e não fotoclubistas, chegando a milhares de inscritos nas últimas edições.

Em 2017, o salão recebeu mais de 170 mil votos, proferidos num sistema controlado e registrado, que funciona no formato "foto X foto". O voto é dado para a melhor dentre aquelas apresentadas na tela de forma aleatória (mas controlada pelo sistema), ou seja, não há link "vote em minha foto" e não faz diferença quem tem mais amigos no Facebook.

Entendemos que a comunidade fotográfica julga melhor do que um pequeno grupo de pessoas renomadas ou de críticos da área. Assim, é a votação popular que determina quais fotografias passam à etapa final —que, então, será decidida por um júri técnico, composto por representantes de fotoclubes do Brasil inteiro.

As melhores fotos classificadas nesta etapa recebem a "Medalha de Aceitação" —quando uma fotografia é considerada uma obra de arte, com espaço garantido nas paredes do salão fotográfico.

Mas o que diferencia um simples fotógrafo entusiasta de quem participa de um fotoclube? Ganhar um concurso online é uma coisa, mas ter sua foto premiada e apresentada em grande formato numa exposição é a grande honra: sair do digital e ir para a parede —esse local de destaque que a fotografia conquistou em galerias e museus.

Os participantes de fotoclubes encontram prazer na fotografia, mas o clímax vem da consagração comunitária. Por isso, os salões e as bienais ainda são os grandes eventos.

Em tempos de tutorais no YouTube, cursos a distância e aulas virtuais, os fotógrafos ainda precisam de um local físico para a troca de informações? Entendemos que sim.

Se hoje o digital, o virtual, o não palpável está em toda parte, pertencer a um grupo real, físico, localizado, acaba se tornando um porto seguro para quem vive a todo instante nas irrealidades e intempestividades da civilidade moderna.

Mas ninguém vive sem as facilidades do meio digital. As câmeras fotográficas que trabalham com filme, estas sim, viraram peças de museu. O fotoclube, porém, renascido das cinzas —ou das químicas do hipossulfito de sódio—, está longe disso.

Hoje, o fotoclubista procura a expressão e a concretização de sua capacidade de ver o melhor desse mundo, de ver o belo, o surpreendente —e apresentar o que vê aos demais, iniciados ou não nessa arte. 


Ailton Tenório é primeiro-secretário do Fotoclube ABCclick, do qual é sócio-fundador.

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