No Brasil, presidentes de empresas não ficam mais de quatro anos no cargo

Levantamento da Bloomberg foi feito com empresas listadas na Bolsa de Valores de São Paulo

Marine Strauss Wei Lu
Londres

Se você acreditava que os atuais presidentes-executivos de empresas eram as pessoas mais preparadas para enfrentar a próxima catástrofe econômica, reconsidere: a maioria deles não estava no comando de suas companhias durante a crise financeira mundial de 2008, de acordo com dados compilados pela Bloomberg.

A Bloomberg avaliou a duração da liderança em empresas líderes dos mercados regionais de ações, computando há quantos anos os líderes de empresas que fazem parte dos índices de referência de cada mercado estão no posto.

Mesmo os mercados que registram os presidentes-executivos mais duradouros - Grécia, Hong Kong e Tailândia —não atingem uma média de 10 anos.

Bernard Arnault é uma exceção entre os presidentes de grandes empresas; ele está a frente da francesa de luxo LVMH há 30 anos - AFP

As empresas que integram o Índice da Bolsa de Valores de Atenas, na Grécia, têm os presidentes-executivos com mais tempo no cargo, em média 9,7 anos.

Os presidentes-executivos de Hong Kong e da Tailândia, para as empresas do índice Hang Seng e SET1000, respectivamente, vêm logo abaixo, com 9,6 e 8,8 anos no posto em média.

Em, comparação, os presidentes-executivos das empresas que formam o IBOV, o índice da bolsa de valores de São Paulo, apresentam a menor média, com apenas 3,4 anos no posto.

Isso não significa que a experiência do executivo no setor se limite ao seu papel atual. Para conduzir a compilação de dados mais precisa possível, a pesquisa considerou apenas a indicação do presidente-executivo mais recente de uma companhia como data inicial, desconsiderando experiências anteriores de liderança no comando de subsidiárias multinacionais, grupos e divisões, ou no comando executivo de empresas concorrentes.

Algo que é claramente necessário considerar são as diferenças básicas entre regiões, países e setores.

Um exemplo são as normas culturais sobre quem pode se tornar presidente-executivo, de acordo com Timothy Quigley, professor de gestão estratégica na Universidade da Geórgia. "Nos Estados Unidos, a norma antigamente era que a pessoa precisava ter passado dos 55 anos para se tornar presidente-executivo", ele diz. Mas hoje essa norma mudou e é possível se tornar presidente-executivo na casa dos 30 e dos 40 anos.

Isso é especialmente relevante nos Estados Unidos —Marissa Mayer tinha 37 anos ao se tornar presidente-executiva do Yahoo, posto que ela manteve por pouco menos de cinco anos. Mark Zuckerberg tinha apenas 28 anos quando abriu o capital do Facebook. No planeta, metade dos presidentes-executivos tem entre 50 e 59 anos de idade.

"Do mesmo modo, costumava haver muitas empresas com idades compulsórias para aposentadoria", diz Quigley. A Merck recentemente revogou uma norma que determinava a aposentaria de seu presidente-executivo aos 65 anos de idade, permitindo que o atual líder da companhia farmacêutica, Ken Frazier, se mantenha no posto por mais tempo.

Em lugares onde aposentadoria compulsória e uma hierarquia mais difícil para promoções comprimem as duas pontas de um espectro de carreira —como o mercado japonês—, provavelmente não surpreende que a idade média dos presidentes-executivos das empresas que formam o índice Nikkei seja de 62,9 anos, uma das mais altas do estudo, mas que o tempo médio do presidente-executivo no posto seja de apenas 4,4 anos.

Alguns dos presidentes-executivos que estão há mais tempo no cargo, em companhias que fazem parte de grandes índices das bolsas de valores mundiais, podem não ser representativos de seu setor como um todo. Warren Buffett, um dos presidentes-executivos mais velhos, com 88 anos, comanda o grupo Berkshire Hathaway, parte do índice SPX, há 48,7 anos.

Rahul Bajaj, da Bajaj Auto, que fabrica scooters e é uma das 31 empresas integrantes do índice Sensex, na Índia, está no comando da empresa há 50,8 anos. Bernard Arnault, o homem mais rico da França, comanda o grupo de bens de luxo LVMH Moet Hennessy há quase 30 anos.

Nesse mundo de ritmo acelerado, dominado pela mobilidade profissional e por incentivos distorcidos, "as empresas enfrentam incertezas nos mercados, desordenamentos tecnológicos ou percalços associados a tarifas que estão por ser impostas. Por qualquer que seja a razão, os conselhos precisam de talentos fortes, com capacitações específicas", disse Andrew Challenger, vice-presidente da Challenger, Gray & Christmas, uma consultoria de recolocação profissional.

Se algo como a crise de 2008 voltar a acontecer, mesmo que em nível regional, a experiência fará diferença, concorda Quigley. "Creio que se possa defender o argumento de que mares bravios requerem mãos firmes no leme".

Nem seria necessário dizer que líderes como Warren Buffett são raridade.

 

Metodologia: Tempo do presidente-executivo no cargo em 31/08/2018.

Inclusão apenas de tempo de trabalho como presidente-executivo ou em posto equivalente, na empresa à qual o executivo esteja associado no momento, e desde sua indicação para o posto mais recente. Os dados foram suplementados por uma extrapolação quanto aos anos no posto atual desde a última menção documentada ao posto de presidente-executivo. Mais de 6,8 mil empresas que compõe 80 índices importantes em bolsas de valores regionais foram pesquisadas. Os resultados finais englobavam mercados com dados sobre duração de mandatos para mais de 75% das empresas que compõem um índice, ou pelo menos 20 empresas do índice. Os dados sobre duração do mandato do presidente-executivo de empresas com ações cotadas em dois mercados foram incluídos nos resultados de ambos os mercados.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

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