Carlos Ghosn cai às vésperas de dar seu maior passo

Em outubro, no Salão do Automóvel de Paris, Ghosn viu seu plano de eletrificação dos automóveis chegar ao ápice

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São Paulo

A prisão de Carlos Ghosn por suspeita de fraude fiscal ocorre no momento em que a Aliança Renault- Nissan-Mitsubishi já contava os dias para se consolidar como a maior empresa do setor automotivo no mundo.

Em outubro, durante sua apresentação no Salão do Automóvel de Paris, Ghosn viu seu plano de eletrificação dos automóveis chegar ao ápice. O executivo exibia o conceito K-ZE, baseado no Kwid.

O compacto antecipa a era dos carros populares “emissão zero”. A meta é comercializá-lo na China a partir do próximo ano e depois em outros grandes mercados, inclusive o brasileiro.

Carlos Ghosn, presidente da Nissan; sua prisão por suspeita de fraude fiscal ocorre no momento em que a Aliança Renault- Nissan-Mitsubishi já contava os dias para se consolidar como a maior empresa do setor automotivo no mundo
Carlos Ghosn, presidente da Nissan; sua prisão por suspeita de fraude fiscal ocorre no momento em que a Aliança Renault- Nissan-Mitsubishi já contava os dias para se consolidar como a maior empresa do setor automotivo no mundo - Regis Duvignau/Reuters

Com a crescente demanda por esse tipo de veículo —impulsionada por legislações ambientais e incentivos tributários —, a aliança comandada por Ghosn teria condições de ampliar a liderança entre os automóveis elétricos e, assim, se manter no topo.

A construção do K-ZE é a prova material do que o executivo franco-brasileiro representa para a indústria. Ele, que fez a Renault ir da crise ao lucro em pouco mais de um ano na década de 1990 para, em seguida, salvar a Nissan, depositou todo o seu prestígio no projeto de eletrificação em larga escala da frota, que criou há dez anos.

Seu currículo invejável permitia ousadias como essa. Mais do que presidente de três montadoras ao mesmo tempo, Ghosn era o avalista da aliança.

Sua assinatura dava crédito a tudo o que as empresas faziam. Diante das acusações e da queda anunciada, o executivo que se tornou herói japonês —virou até personagem de histórias em quadrinhos no formato mangá—deve sair de cena e deixar um problema do tamanho de sua empresa.

Prestes a completar 20 anos, a Aliança-Renault-Nissan Mitsubishi reivindica o posto de maior fabricante de veículos do mundo, disputado carro a carro com os grupos Volkswagen e Toyota. Sem a presença de Ghosn no comando das operações, há dúvidas sobre o que ocorrerá no futuro.

A forma como tudo está acontecendo dificulta qualquer ação para salvaguardar as empresas. Ir a público para desconstruir a imagem do antigo comandante não irá responder perguntas sobre os próximos passos do grupo.

São raros os executivos que personificam tanto suas corporações quanto Ghosn. Em sua área de atuação, ele atingiu a um patamar comumente ocupado pelos criadores das marcas de automóveis, a exemplo de Henry Ford (1863-1947) e, mais recentemente, de Elon Musk, da Tesla.

Essa identificação torna-se agora um problema ainda não dimensionado. A reação do mercado, com as empresas perdendo valor abruptamente, é somente um sinal.

A esperada fusão entre as montadoras que compõem a aliança —tema que sempre esbarra no governo francês, dono de 15% das ações da Renault —pode jamais ocorrer. Investidores que apostavam nisso já devem estar revendo seus planos.

As metas de eletrificação, motivo de constantes embates internos na aliança devido aos custos envolvidos, estão sob risco. O carro que será criado a partir do conceito K-ZE perde relevância sem seu maior defensor. Com a prisão de Carlos Ghosn, o futuro da parceria global torna-se incerto.

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