PP, MDB e PT são partidos que mais loteiam cargos em prefeituras

Estudo mostra que aparelhamento salta no país e afeta qualidade de serviços

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São Paulo

Entre 1995 e 2013, a parcela de funcionários públicos municipais filiados a partidos políticos no Brasil saltou de 17,7% para 30,8% do total.

Mais da metade desse aumento se deveu ao loteamento de postos de trabalho nos governos locais pelas coalizões vencedoras de eleições.

Essa é uma das principais conclusões de um estudo dos economistas Klenio Barbosa (Insper) e Fernando Ferreira (escola Wharton, da Universidade da Pensilvânia) que acaba de ser publicado pelo NBER (National Bureau of Economic Research), prestigiado centro de pesquisa americano.

O trabalho faz parte de uma leva de investigações recentes sobre os efeitos da distribuição de empregos no setor público em troca de apoio político no país.

Segundo Barbosa e Ferreira, o maior aparelhamento não trouxe aumento do total de gastos públicos —por causa de restrições orçamentárias—, mas alterou substancialmente sua composição.

Os autores mostram que, no longo prazo, cada vaga ocupada por um novo afilhado político equivale à saída de um empregado sem vinculação partidária.

Embora o trabalho revele que o emparelhamento é disseminado no espectro político brasileiro, os campeões da prática —empatados em primeiro lugar— são PP (Partido Progressista) e MDB (Movimento Democrático Brasileiro), seguidos pelo PT (Partido dos Trabalhadores).

Logo depois, também bastante próximos, aparecem DEM (Democratas) e PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira).

Em números, o nível de loteamento praticado por PP e MDB é 43% maior do que o exercido pelo PT, que, por sua vez, supera em 16% o patamar de patronagem do DEM e do PSDB.

Os autores ressaltam que os campeões de aparelhamento são os principais implicados nas investigações da Operação Lava Jato até agora, embora não analisem esse ponto em profundidade.

Segundo Barbosa, o principal efeito nocivo do loteamento de cargos públicos de forma geral é uma “piora gradual e sem fim da qualidade dos serviços públicos”. “Essa é uma prática muito maléfica para a sociedade”, diz Barbosa.

Segundo o economista, outros estudos recentes reforçam essa conclusão.

Os acadêmicos Emanuelle Colonnelli, Edoardo Teso e Mounu Prem mostraram, por exemplo, que a probabilidade de um funcionário público brasileiro que apoia a aliança política incumbente não ter a qualificação exigida para o cargo é 17% maior do que a de um empregado filiado à coalização que tenha perdido a eleição mais recente.

Embora outros trabalhos indiquem que o nível de loteamento ou patronagem é elevado no Brasil, o estudo de Barbosa e Ferreira vai além ao indicar como sua dinâmica se desenrola e também seu impacto nas finanças públicas.

As análises estatísticas dos autores se basearam em três fontes principais: números da Rais (Relação Anual de Informações Sociais), do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e do Tesouro Nacional.

O estudo mostra que, a cada pleito local, as fatias do total de funcionários públicos e da folha de pagamentos do setor vinculados às coalizões vencedoras aumentam, respectivamente, quatro e seis pontos percentuais.

O fato de o percentual de salários abocanhado pela nova aliança incumbente ser maior do que a parcela de postos de trabalho loteados indica que o patamar de remuneração dos funcionários filiados é superior à média.

Protesto de servidores em São Paulo contra reforma da Previdência municipal - Rubens Cavallari - 4.fev.19/Folhapress

Segundo a pesquisa, o processo de aparelhamento no país começa com a contratação de membros filiados antes das eleições e com a demissão de funcionários ligados à oposição.

Mais tarde, duas outras tendências ganham força: membros antigos do funcionalismo municipal passam a se filiar ao partido incumbente, e profissionais de fora do setor público que se juntaram à coalizão posteriormente são contratados.

Durante todo o processo, funcionários sem filiação também vão saindo.

Uma descoberta dos pesquisadores que ajuda a indicar as consequências de longo prazo do loteamento é que os empregados ligados à coalização no poder ocupam tanto cargos comissionados como vagas de estatutários concursados.

“Isso parece corroborar evidências anedóticas de que, por trás da falta de transparência em muitos processos de contratação do setor público, há indicações políticas”, diz Barbosa.

O resultado disso é que, embora o loteamento decresça ao longo do mandato, seu impacto não desaparece totalmente nem quando há alternância de poder.

Mesmo 12 anos após o fim de um determinado governo, os efeitos da patronagem ocorrida durante seu mandato persistem por meio da sobrevivência de seus afilhados políticos estatutários.

Embora evidencie a fraca governança no setor público brasileiro, a investigação de Barbosa e Ferreira também aponta reformas e desenhos institucionais que poderiam reduzir o aparelhamento 
do estado.

Em linha com estudos anteriores, os autores mostram que operações de pente-fino dos tribunais de contas nas finanças locais, assim como a presença de veículos locais independentes de mídia, têm esse efeito positivo.

O grau de dependência entre o Orçamento local e as transferências do governo federal —que representa a maior fonte de renda dos municípios brasileiros— também impacta substancialmente 
o loteamento.

Cidades menos dependentes desses recursos apresentam grau menor de aparelhamento de cargos públicos.

No Brasil, uma parcela grande de tributos pagos pela população —ainda que em nível municipal— vai primeiro para Brasília e, de lá, é redistribuída.

Segundo Barbosa, o estudo indica que esse desenho talvez devesse ser, em alguma medida, alterado.

“Não provamos isso, mas parece que o contribuinte cobra maior transparência e eficiência quando há uma ligação mais clara entre o imposto que paga e o serviço público que recebe”, diz o pesquisador.

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