STF deu luz a prática já existente, diz indústria do AM sobre Zona Franca

Tribunal decidiu que empresas de fora da região podem obter créditos tributários ao comprar insumos de lá, mesmo sem pagar imposto

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São Paulo

Presidente do Cieam (Centro da Indústria do Estado do Amazonas), Wilson Périco criticou a reação de economistas à decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que permitiu a ampliação dos incentivos fiscais à Zona Franca de Manaus.

Segundo Périco, o Supremo consolida uma regra preexistente e que não era seguida pela Receita Federal.

“O que o Supremo fez foi dar uma luz jurídica a uma prática que já acontece”, disse à Folha.

No final de abril, o Supremo decidiu que empresas de fora da Zona Franca de Manaus, mas que adquirirem insumos em sua área de abrangência, terão direito de abater de seus impostos créditos de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) que não foi pago na compra dos materiais, porque a Zona Franca tem isenção.

Segundo cálculo da Receita, haverá uma renúncia fiscal adicional de R$ 16 bilhões por ano, sem previsão orçamentária para cobri-la.

Ele disse não ver problema em grandes empresas migrarem suas compras de insumos para a região apenas em busca do benefício fiscal, porque esse seria um direito previsto na legislação.

Périco afirmou ainda que é preciso pensar em uma transição para que o fim da Zona Franca, o que seria possível com a exploração das riquezas naturais como potássio e nióbio. Isso não acontece atualmente por “barreiras pseudoambientais”, afirmou.

Por que o sr. diz que as críticas à decisão do STF sobre a Zona Franca lhe assustam?

É como se a Zona Franca fosse um problema para a balança de renúncia fiscal que o país tem. A Receita Federal aponta que são R$ 314 bilhões de renúncia fiscal, que se dá quando se quer incentivar algum segmento. Não vamos chamar de renúncia, mas de gastos tributários.O modelo Zona Franca representa 8,5% do total de gastos tributários do país. Poxa, será que esses 8,5% são realmente o problema ou será que não estaria nos demais 92%?

O STF colocou mais R$ 16 bilhões na conta de renúncia fiscal em um momento em que se discute necessidade de ajuste das contas. Isso não é um problema para a economia?

O que o Supremo fez foi dar uma luz jurídica a uma prática que já acontece. Mas a Receita Federal, de um tempo para cá, passou a autuar as empresas porque entendia que insumo, apesar de estar sendo produzido na Zona Franca de Manaus, mas por não serem bem final, levaria benefício para outras regiões, que não para cá. Então o benefício era indevido.

O que o Supremo falou é que não, que o incentivo do modelo Zona Franca é para aquilo que é produzido na Zona Franca. É um entendimento do Supremo que veio ratificar aquilo que a constituição diz, independente do beneficiado estar em outra região.

 

Mas não há um aumento na renúncia?

Quando fala que vai ter aumento da renúncia, acho que aí está o mal entendido. Acho que não tem aumento porque isso já estava na prerrogativa. Agora, se a Receita Federal considerava que as autuações que ela fez seriam uma forma de não ter esse crédito, aí não é um problema do modelo, mas de interpretação da Receita.

Críticos afirmam que haveria um estímulo a um planejamento tributário de grandes empresas, que passariam a produzir insumos na região, mas manteriam a produção final em regiões mais desenvolvidas do país apenas pelo incentivo fiscal.

Essa questão é da matriz tributária, o manicômio tributário que existe no país. Não é uma questão do gasto tributário, mas sim da complexidade e das possibilidades que a nossa matriz oferece. Se a nossa matriz oferece crédito, é direito do consumidor se utilizar disso da forma como a lei permite. Não vejo, no entanto, que isso provocaria um desequilíbrio porque as empresas que utilizam esses insumos hoje, na grande maioria usam importados. Na hora que traz de Manaus, está gerando emprego aqui também. É uma dicotomia na forma de interpretar dizer que leva a riscos na indústria de insumos e falar de outras regiões do país e principalmente na geração de empregos. Temos que pensar no Brasil como Brasil e não em fazer canibalismo para beneficiar região A ou B.

Mas beneficiar a Zona Franca não gera canibalismo com outras regiões do Brasil?

Não. O Brasil conta com 530 mil indústrias, dessas apenas 3.200 estão na região do Amazonas. Sendo que indústrias incentivadas são 420. Ou seja, estamos falando de 0,06% do total de indústrias do país em 52 anos. Não tem isso de causar danos à indústria do país até porque a indústria que está aqui passa pelo crivo de muitos ministérios.

Poderíamos estar produzindo aqui muito mais do que se produz hoje. Não produzimos porque não se fixam PPBs (Processos Produtivos Básicos), a regra para definir incentivos aqui. Por consequência, não se consegue atrair novos investimentos.

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Linha de montagem de motos na fábrica da Honda no distrito industrial da Zona Franca de Manaus, - Lalo de Almeida -5.aug.2018/Folhapress

Em um momento em que o governo caminha para o liberalismo, a tendência não é que os incentivos se reduzam?

É uma tendência, mas temos que respeitar o país com dimensão e diferenças de desigualdade que ele tem. Acho que pode caminhar para considerar o país dentro de um país de primeiro mundo, porém temos que desenvolver as desigualdades regionais primeiro. Você faz isso de forma gradativa, dá encaminhamentos dessa liberdade econômica pregada pelo ministro Paulo Guedes. Os Estados Unidos, que são a economia mais liberal do mundo, têm políticas específicas para ajudar a reduzir desigualdades.

Estamos falando de uma reforma tributária, temos que partir do princípio, aí falo o estado do Amazonas, de como participar de uma reforma mantendo uma conjuntura que nos permita continuar desenvolvendo as riquezas econômicas e sociais que geramos, e que nos permita continuar preservando a floresta.

Não é para esperar que todas as soluções venham da cabeça dos técnicos da equipe econômica. Precisamos ser mais propositivos e menos reclamões.

Quais seriam as proposições?

Todo mundo fala que o modelo Zona Franca não pode ser perene, e nós concordamos. Mas não há nada que substitua o modelo na questão de sustentação socioeconômica no curto prazo. Você tem que desenvolver novas atividades, muito provavelmente além dos muros da capital, explorando as riquezas naturais que tem, como potássio e nióbio, que todo mundo fala.

Aí tem duas coisas: as barreiras pseudoambientais que temos –no meu entendimento são grupos econômicos que impedem o Brasil de explorar as riquezas naturais que tem– e, segundo, isso tem que se somar ao modelo Zona Franca para que o estado do Amazonas entregue ao país ainda mais riqueza do que já entrega, para poder no futuro sair da dependência desse modelo.

Peso que o pessoal coloca na Zona Franca não é verdade. O gasto tributário com a zona franca devolve  ao país acima desse gasto. Para cada R$ 1, você pode usar duas ferramentas econométricas, é um R$ 1,14 ou R$ 3 de retorno.

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