Descoladas da crise econômica, startups vivem ciclo paralelo de investimentos

Em 2 anos, mais que dobra número de empresas iniciantes no país, financiadas por capital de risco

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Santa Rita do Sapucaí (MG)

Enquanto companhias tradicionais postergam investimentos, o mundo das startups mantém o clima de entusiasmo de 2018, quando o Brasil presenciou seus primeiros unicórnios (empresas iniciantes que valem mais de US$ 1 bilhão).

O otimismo não está presente apenas nos discursos motivacionais que costumam caracterizar a nova economia (baseada em serviços e modelos de negócios digitais e distante da indústria pesada), mas em números e perspectivas para que uma fila de startups galgue ao valor de 99, Gympass, Nubank ou iFood.

Investidores e especialistas desse mercado dividem o Brasil em dois: o dependente da macroeconomia e das incertezas políticas e o que se descola, ao menos em parte, para viver um ciclo paralelo.

“Nunca tivemos tanto dinheiro para startup como hoje”, diz Edson Rigonatti, fundador do Astella Investimentos, de venture capital (capital de risco). Ele ressalta que, além do SoftBank, cuja abertura do fundo de US$ 5 bilhões para a América Latina foi um marco, cresce a quantidade de empreendedores que fundam empresas pela segunda vez. “Saltou o número de empresas que miram Europa, México e Turquia nos últimos 18 meses.”

Desde o boom de startups, há cerca de quatro anos, 2018 e 2019 têm sido considerados especialmente prósperos. Neste ano, foram mais 150 investimentos de venture capital. Somam-se aos 320 de 2018, que movimentaram R$ 5 bilhões, de acordo com a Distrito, empresa de inovação aberta, e a Lavca (associação latino-americana de fundos do tipo).

Em 2017, o país tinha 5.147 startups, segundo a associação brasileira do setor. Hoje, contabiliza 12.715, das quais 2.800 fundadas em 2019.

“Comparando com os EUA, o Brasil vive algo semelhante ao momento pré-bolha da internet, de 2001. Não em relação à bolha, mas ao tipo de investidor, de níveis de valoração e de maturidade das empresas”, diz Humberto Matsuda, coordenador na Abvcap (Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital).

Hacktown, evento de empreendedorismo e tecnologia no interior de Minas
Hacktown, festival de empreendedorismo e tecnologia em Santa Rita do Sapucaí (MG); eventos crescem e se descocam no eixo Rio-SP - Divulgação

Segundo ele, a presença de alguns fundos diminuiu, mas a solidez das startups cresceu de forma robusta.
Outro fenômeno que mede a temperatura do setor é a recente disseminação de eventos de empreendedorismo fora do eixo Rio-São Paulo. Além de áreas maduras para a inovação, como Recife (PE) e Florianópolis (SC), cidades do interior de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul têm promovido encontros com a promessa de novos polos —são os estados com maior participação de startup, ao lado de Rio e São Paulo.

As grandes empresas buscam se vincular à pesquisa acadêmica e às soluções que nascem dessas regiões. Santa Rita do Sapucaí, cidade de 40 mil habitantes que sediou até este domingo (8) o evento Hacktown, foi o local escolhido pela TIM para testes de 5G, tecnologia alvo de disputa global e que gera uma corrida no país com a proximidade do leilão da Anatel em 2020.

Com dinheiro de outras companhias, como Google e Xiaomi, a cidade bucólica virou cenário para discussão sobre inovação (e para a geração Z pintar o rosto com neon em festa matinal de ioga).

“Há otimismo nesse setor porque o que acontece no mundo é irreversível e o investidor sabe disso, vê oportunidade”, afirmou Leonardo Capdeville, chefe de tecnologia da TIM, no evento.

“O mercado reconhece o valor da TIM como R$ 600 por cliente. Nas fintechs, o mercado vê de R$ 4.000 a R$ 10 mil por cliente”, compara.

Para ficarem menos sujeitas à inércia econômica, as maiores empresas do país se engajaram nesse movimento na última década. Além de todo o setor financeiro, que apesar da concentração acompanha o crescimento exponencial do Nubank, grupos como Raízen, Pão de Açúcar, Votorantim e Magazine Luiza investem em startups ou braços próprios de tecnologia.

“Há três anos, a gente falava ‘olha o que está acontecendo’, e as empresas entendiam que era o futuro, não o presente. Hoje se sentem tranquilas para fazer uma transição", diz Pedro Englert, presidente da Startse, de educação corporativa.

"Quem pode afirmar que o modelo de supermercado, da forma que é hoje, vai ser assim em 15 anos?”, questiona, referindo-se às mudanças geradas por aplicativos de entrega e outras tecnologias.

Apesar da fase promissora, analistas lembram que a classe de ativos globais para startups tem um ciclo próprio e que suas mudanças têm o poder de afetar as empresas diretamente, assim como a alta das commodities impacta a “velha economia”.

A repórter viajou a convite da TIM

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