Principal defensora da austeridade na Europa, a Alemanha vai abandonar sua política fiscal que garantiu seis anos consecutivos de superávit nas contas públicas, por causa da crise provocada pela pandemia do novo coronavírus.
O governo vai aprovar um empréstimo de € 356 bilhões (cerca de R$ 2 trilhões) para financiar seus planos de socorro ao sistema de saúde e a empresas e trabalhadores afetados pela paralisação decorrente da pandemia.
O valor da dívida, que equivale a 10% do PIB alemão ---o maior da Europa---, revela a gravidade do impacto em uma economia que, no final do ano passado, já rodava perto da estagnação.
Nesta semana, as maiores montadoras do país anunciaram a paralisação de fábricas, e pequenas e médias empresas do setor de serviços fecharam às portas para atender à ordem de isolamento social.
Dentre as medidas que o governo alemão vai financiar o apoio à economia estão um fundo para pequenas empresas e autônomos, um programa de compra de ações de empresas afetadas pela crise, linha de empréstimo para empresas, garantia a débitos de empresas e a reativação do fundo criado em 2009 para garantir o setor bancário, desta vez voltado para injetar dinheiro em empresas do setor produtivo.
A Alemanha também já havia anunciado há duas semanas a ampliação de seu programa que paga parte do salário de trabalhadores cuja jornada de trabalho tenha sido reduzida, para evitar demissões. A Organização Internacional do Trabalho estima que 25 milhões de pessoas podem perder o emprego no mundo apenas como consequência do vírus.
No dia 11, a primeira-ministra alemã, Angela Merkel, já havia dado pistas de que o impacto da crise era mais importante que manter sua política de aperto fiscal: “Faremos o que for necessário para salvar o país, sem ficar perguntando a toda hora como isso afeta nosso déficit”.
O país fechou o ano passado com um superávit de € 50 bilhões
e uma dívida de 61,9% do PIB. Como comparação, a do Reino Unido é de 80,8%, a da França, de 98,9%, a Itália tem dívida de 134,8% do PIB, e a Grécia, o país mais endividado da Europa, 181%.
A União Europeia formalizou na sexta proposta para suspender regras orçamentárias que limitam o endividamento público, para que os governos possam combater a pandemia com mais flexibilidade.
Pelas regras, que deixarão de valer temporariamente, os governos são obrigados a cortar gastos até zerar déficits ou gerar superávits, e precisam reduzir as dívidas públicas todos os anos até que elas fiquem abaixo de 60% do PIB.
Ao final do ano passado, 24 países extrapolavam esse limite de endividamento e 18 estavam abaixo.
O projeto da Comissão Europeia (Poder Executivo do bloco) precisa ser aprovado pelos ministros das Finanças dos países membros.
NOVO PLANO MARSHALL
Neste sábado, o secretário-geral da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), o mexicano Ángel Gurría, pediu que os países ajam de forma coordenada para combater a crise do coronavírus, que exige uma resposta com "a ambição do Plano Marshall [plano de reconstrução da Europa depois da Segunda Guerra Mundial] e a visão do New Deal [programa de combate aos efeitos da recessão dos anos 1930 nos EUA]".
A pandemia é "o terceiro e maior choque do século 21", segundo ele, e a profundidade dos impactos econômicos, sociais e de saúde exigem que os países coordenem melhor seus esforços.
"É cada vez mais provável uma sequência de quedas dos PIBs regionais e globais neste trimestre e nos próximos trimestres de 2020, e precisamos atuar para evitar uma recessão duradoura", afirmou Gurría.
Para o economista, a única forma de combater o que chamou de "crise sem precedentes" é um esforço internacional amplo e confiável, que fortaleça a saúde pública, alivie o choque econômico e desenhe o caminho para a recuperação.
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