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Após pressão de empresários e do governo, votação na Câmara sobre empréstimos de empresas bilionárias é adiada

Projeto determina que o dinheiro recolhido obrigatoriamente seja destinado a despesas extraordinárias provocadas pelo coronavírus

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Brasília

Pressionada por empresários e pelo governo, a Câmara dos Deputados adiou nesta quarta-feira (22) a votação da urgência do projeto que estabelece empréstimos compulsórios de empresas bilionárias.

O texto enfrenta resistência do empresariado, de parlamentares e, principalmente, da equipe econômica, que afirma que a proposta prejudica a imagem do país e afugenta investidores.

O projeto de lei que institui o empréstimo compulsório foi apresentado no último dia 23 de março pelo deputado Wellington Roberto (PL-PB), líder do partido na Câmara.

Segundo o texto, empresas domiciliadas no país com patrimônio igual ou superior a R$ 1 bilhão estariam sujeitas à medida.

Se a proposta for aprovada, permitirá ao governo cobrar dessas companhias valor equivalente a até 10% do lucro líquido apurado nos 12 meses anteriores à publicação da lei.

Plenário da Câmara dos Deputados durante votação - Michael Jesus - 8.abr.2020/Câmara dos Deputados

O projeto determina que o dinheiro recolhido obrigatoriamente das empresas seja destinado a despesas extraordinárias provocadas pelo novo coronavírus.

Após análise técnica do projeto, o Ministério da Economia concluiu que a proposta é inadequada. Os técnicos avaliam que o projeto é prejudicial à imagem do Brasil e dificultaria a atração de novos investimentos, seja por meio de dívida ou de investimentos diretos.

A imagem do Tesouro Nacional, especificamente, poderia sofrer danos. Na avaliação dos técnicos, a medida mandaria uma equivocada mensagem que o órgão teria alguma dificuldade de se financiar.

O Ministério lembra que também teriam prejuízo as próprias empresas, que enfrentam dificuldades de caixa neste momento e que podem precisar se desfazer de ativos para pagar o empréstimo compulsório. A pasta vê risco, inclusive, de “inúmeras, complexas e desnecessárias demandas judiciais”.

Além disso, a proposta é considerada desnecessária porque o mercado de títulos públicos do Brasil é desenvolvido o suficiente para captar recursos e bancar despesas emergenciais do governo em meio à pandemia do coronavírus.

A equipe econômica considera que o Brasil já criou mecanismos eficientes de contratação e gestão de dívida e que não tem qualquer dificuldade em se financiar com a adesão voluntária de investidores.

A medida ainda traria grandes dificuldades operacionais em comparação com o mecanismo existente hoje.

Guedes tem afirmado que este não é o momento de elevar encargos ao setor produtivo. O governo tem procurado líderes da Câmara para tentar barrar a proposta.

Na Câmara, o presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) também se opõe à proposta, mas decidiu pautar a votação da urgência após o PL ameaçar obstruir todas as votações remotas na Casa enquanto o texto não fosse apreciado pelos deputados.

Nesta quarta, o deputado Wellington Roberto, no entanto, decidiu solicitar a retirada da votação da urgência da pauta, afirmando que havia recebido pedidos de mais informações por empresas, indústrias e outros líderes partidários.

Nos bastidores, a avaliação é que o parlamentar percebeu que não teria voto para levar a proposta adiante e decidiu ganhar mais tempo para tentar convencer seus colegas.

Entidades empresariais também articulam contra o projeto. Para a CNI (Confederação Nacional da Indústria), a medida teria efeito negativo na produção e manutenção de empregos.

As confederações nacionais do Comércio (CNC), das Instituições Financeiras (CNF) e do Transporte (CNT) pediram para Maia não colocar a proposta em votação.

Entidades jurídicas, como a associação dos advogados de São Paulo, preveem que a ideia, se aprovada pela Câmara, geraria disputas judiciais.

Do outro lado estão centrais sindicais, que apoiam a proposta do líder do PL.

A adoção do empréstimo compulsório está prevista na Constituição, que diz que a União pode, mediante lei, instituir empréstimos compulsórios para atender a despesas extraordinárias decorrentes de calamidade pública. É o caso da pandemia provocada pelo vírus Covid-19.

O dinheiro, conforme prevê o texto constitucional, só pode ser aplicado em ações relacionadas ao evento que gerou a necessidade de estabelecer o crédito obrigatório sobre empresas.

Estimativa do gabinete de Wellington Roberto indica que esse montante pode alcançar R$ 19 bilhões.
Os valores deverão ser pagos até 30 dias a partir da publicação da lei. O percentual incidente sobre cada setor seria definido pelo Ministério da Economia.

Se o montante superar R$ 1 milhão, a empresa poderia dividir o pagamento em até três parcelas mensais e sucessivas.

Segundo o texto, o governo pode devolver os valores aos contribuintes em até quatro anos após o fim da pandemia e corrigidos pela taxa básica Selic. A proposta permite ainda o parcelamento da restituição em até 12 parcelas mensais e sucessivas.

Em entrevista à Folha no final de março, Wellington Roberto defendeu sua proposta e afirmou que, pelo que os empresários ganharam até agora e “fizeram em benefício das suas empresas, é o mínimo que eles têm de fazer”, disse. “Eles tinham de doar isso pela soma e o volume do que eles ganharam, mas não fizeram até agora."

"Os mais humildes já vêm pagando há muito tempo. Tudo o que acontece nesse país é sempre em cima de quem bota dinheiro na economia, que são os mais pobres. Os mais ricos só contribuem para concentrar mais a renda no país", afirmou, na época, o líder do PL.

O deputado ressalta que não se trata da criação de um imposto compulsório sobre as receitas das empresas e diz que, se o projeto for aprovado, caberá ao Executivo decidir se vai tomar os empréstimos ou não.

O líder do PP, Arthur Lira (AL), reforça que a proposta não trata de taxar grandes fortunas, porque é voltada especificamente a empresas.

Partidos como o Republicanos já declararam apoio à medida. O MDB tende a apoiar. No PSD, parlamentares como Fábio Trad (MS) querem ver o texto aprovado.

Outros partidos, como o Novo, que tem como fundador o empresário João Amoedo, já disseram ser contra a ideia.

Em meados de abril, o banco Itaú Unibanco anunciou doação de R$ 1 bilhão para instituir um fundo de combate ao coronavírus.

O recurso ficará sob a gestão da Fundação Itaú Unibanco e será administrado exclusivamente por um conselho de profissionais de saúde, onde estarão diretores de hospitais públicos e privados.

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