Argentina fecha acordo com credores da dívida externa

Saldo devedor chega a US$ 68 bilhões; prazo de negociação se encerraria nesta terça-feira (4)

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Buenos Aires

A Argentina saiu da moratória técnica na qual se encontrava, ao anunciar na madrugada desta terça-feira (4) que chegou a um acordo de renegociação de sua dívida em moeda estrangeira com os credores externos do país.

O total da dívida é de US$ 68 bilhões (R$ 361 bilhões)— a Argentina já havia deixado de pagar o vencimento de duas parcelas de juros.

Para chegar a esse acordo, cujo prazo final era nesta terça-feira, a Argentina teve de melhorar sua oferta.

Inicialmente o governo argentino havia pedido três anos de perdão da dívida, para começar a pagá-la no quarto ano, e que, para cada dólar, fossem pagos 0,35 centavos. Na versão final, a Argentina recuou e terá apenas um ano de suspensão do pagamento, e a partir de então terá de pagar 0,54 centavos por dólar.

Presidente da Argentina, Alberto Fernández
Presidente da Argentina, Alberto Fernández - Esteban Collazo/AFP

Apesar de uma grande resistência do presidente Alberto Fernández em aumentar o valor oferecido devido à recessão econômica que o país vive e à situação da pandemia, ao final o governo acabou aceitando melhorar a oferta.

A situação de calote técnico estava estabelecida desde maio, quando a Argentina deixou de pagar uma parcela de US$ 503 milhões em juros. O ministro da economia, Martín Guzmán, insistia que o termo não o incomodava, uma vez que o processo de renegociação havia começado antes deste primeiro vencimento e nenhum dos credores havia, até então, recorrido à Justiça.

Em entrevista a jornalistas no final da tarde desta terça, Guzmán disse que o acordo "não é perfeito", mas que foram feitos esforços de ambos os lados. Acrescentou que a Argentina hesitou em melhorar a oferta porque "quando assumimos, definimos como prioridade proteger os setores mais vulneráveis da sociedade".

E explicou que as condições deixadas pela administração anterior eram de asfixia. "Se fôssemos pagar a dívida, teríamos de tirar fundos da educação e da saúde", afirmou.

Os principais grupos de credores com quem a Argentina fechou o acordo são BlackRock, Fidelity, Ashmore e Exchange, entre outros.

Com o acordo, o governo argentino economizará US$ 37,7 bilhões do que deveria pagar nos próximos 10 anos. Evita, também, que o país entre no nono "default" de sua história.

O governo reforçou que teve "o apoio de parte da comunidade internacional", incluindo aí o FMI (Fundo Monetário Internacional), e que manteve a preocupação de encontrar um "modo sustentável" de pagar os vencimentos.

O acordo chega, também, em bom momento político para o presidente Alberto Fernández, uma vez que há uma piora no desempenho do país com relação ao combate à pandemia. Por conta da longa quarentena, há uma redução da atividade econômica e alta emissão monetária, o que economistas creem que pode agravar a situação do país no pós-pandemia.

Sobre o cenário frágil da economia argentina e o pós-pandemia, Guzmán disse que o governo apresentará, nos próximos dias, uma série de medidas para incentivar a retomada da economia, mas não entrou em detalhes.

O governo tem sido questionado porque Fernández, em uma entrevista recente ao Financial Times, afirmou "não gostar de planos econômicos", e que por isso não tinha um, mas que anunciaria medidas assim que a questão da dívida estivesse encaminhada.

Guzmán reforçou que o acordo é sustentável e que se terá "um alívio nos primeiros anos, para que possa começar a pagar numa situação em que é possível cumprir com os vencimentos".

O presidente Fernández fez um pronunciamento ao meio-dia e agradeceu aos credores por terem "entendido que a Argentina estava fazendo um grande esforço". Ele acrescentou que nunca encarou as negociações como uma luta, e sim "um problema que tinha de ser resolvido e o estamos resolvendo".

Fernández reforçou que o acordo chega num bom momento, em que o país começa a desenhar como será seu plano de reativação econômica no pós-pandemia. "Poderemos destinar recursos para que os argentinos possam ter suas casas e para que os empresários tenha acesso a crédito no exterior. Clareamos o horizonte para a saída da crise".

A negociação do acordo demorou oito meses, nos quais o ministro Guzmán praticamente só trabalhou nisso. Por sua parte, o presidente estabeleceu pontes com o papa Francisco e com Kristalina Georgieva, que recém havia assumido como diretora do FMI (Fundo Monetário Internacional) e que mostrou apoio à tentativa argentina de cumprir seus compromissos.

"O apoio de Georgieva é importante porque abre a porta para outras ajudas que possamos precisar no pós-pandemia", disse Guzmán à Folha.

Outros líderes internacionais também deram apoio à Argentina, pedindo paciência aos grupos credores, entre eles Angela Merkel (Alemanha), Emmanuel Macron (França), Pedro Sánchez (Espanha) e Andrés Manuel López Obrador (México).

Por parte dos EUA, Donald Trump pediu para que o secretário do tesouro, Steven Mnuchin, que conversasse com os credores e evitasse a judicialização da dívida.

Pelo Twitter, Georgieva felicitou o governo argentino. "Felicidades ao presidente Alberto Fernández, ao ministro Martín Guzmán e aos principais credores por alcançar um acordo preliminar sobre a dívida do país."

Os problemas de Guzmán com o assunto "dívida", porém, não terminaram. Agora, seu próximo objetivo será renegociar o acordo de stand-by que foi contraído em 2018 pela gestão de Mauricio Macri, do qual foram gastos US$ 44 bilhões e cujo pagamento deveria começar a ser feito já em 2021.

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