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Vamos ver bastante QR Code para pagamento na rua neste ano, diz sócio da PwC Brasil

Pagamentos digitais, nicho de fintechs, devem quase triplicar até 2030, segundo estudo da multinacional

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Ribeirão Preto

A corrida da indústria de pagamentos pelo QR Code já começou. E se há alguns anos ela esbarrava em problemas operacionais e falta de interesse da população, em 2022 a sua sorte deve mudar —essa é a aposta de Willer Marcondes, sócio da PwC Brasil, multinacional de consultoria e auditoria.

Em dezembro, a companhia divulgou um estudo sobre o cenário de pagamentos em 2025 e 2030 no mundo. A projeção é que o número de transações sem dinheiro em espécie quase triplique daqui oito anos e passe de 3 trilhões em 12 meses.

Em números absolutos, a África deve despontar e passar a América Latina, onde há menos espaço para crescimento. Ásia e Pacífico seguem isolados na frente, tanto em velocidade de crescimento quanto em transações.

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Willer Bianco Marcondes, sócio da PwC Brasil, multinacional de consultoria e auditoria na área de pagamentos - Divulgação

Nesse cenário, os métodos alternativos de pagamento —por meio de celular, QR Code e até mesmo com a ajuda de mensagens de texto— serão os protagonistas.

As startups financeiras, chamadas de fintechs, já correm nessa raia vendo instituições tradicionais no retrovisor. Mas isso não significa que os grandes bancos deixarão de existir.

"Os bancos vão continuar crescendo no Brasil e no mundo", afirma Marcondes. "Mas vão surgir players igualmente importantes e com um produto talvez mais alinhado com as tendências de longo prazo." Pode ser que os próprios bancos consigam tomar a dianteira, diz o empresário, mas não com as operações que realizam hoje.

Apesar de não estarem na região que mais cresce, os brasileiros também terão que se adaptar a novidades. "A gente deve ver bastante QR Code na rua neste ano", afirma Marcondes sobre um horizonte um pouco mais próximo.

O que o senhor destacaria do estudo? Acho que a primeira coisa é a dinâmica de crescimentos. A Ásia, que é o grande mercado hoje, vai se consolidar em relação ao restante do mundo no volume de pagamentos. A África vai ser o segundo vetor de crescimento: ela sai hoje do último lugar e vai passar a América Latina em uma perspectiva de dez anos —não em termos per capita, mas em número de transações.

Mas em que setor cresce? Esse é o segundo ponto que a pesquisa traz com bastante clareza. Os bancos vão continuar sendo um player importante, mas surge um concorrente: os métodos alternativos de pagamento, operados principalmente por wallets [carteiras digitais]. Eles fazem uso basicamente de duas fontes: os pagamentos instantâneos e as criptomoedas.

Se você olhar a indústria hoje, os papéis estão muito claros. A bandeira está no meio. De um lado tem a empresa de maquininha que conversa com o ponto de venda e do outro tem o banco que emite o cartão e conversa com o portador, a pessoa física ou jurídica final. Cada um está no seu mundo, explora o seu ecossistema e tem as suas receitas. O player alternativo de pagamento quebra essa cadeia, porque ele explora o serviço das três pontas. Do recebedor, do comércio e da bandeira. O ambiente competitivo muda significativamente.

O senhor fala que os bancos e as instituições tradicionais não necessariamente saem perdendo nesse cenário que a pesquisa apresenta. Mas de alguma forma isso pode acontecer, porque hoje são eles que estão provendo os serviços ameaçados, certo? Os bancos vão continuar crescendo no Brasil e no mundo. Quando comparamos o que eram em 2020 e o que vão ser em 2030, eles quase dobram de tamanho no Brasil e fora dele. Os bancos e suas áreas de cartões. Se você me perguntar até 2050, talvez o cartão deixe de existir, mas em dez anos não.

Não é que eles vão deixar de ganhar dinheiro ou não serão importantes, mas vão surgir players igualmente importantes e com um produto talvez mais alinhado com as tendências de longo prazo. Todo mundo está se mexendo. Alguns desses vão conseguir ocupar esses espaços e outros não. Muda onde obter resultado e onde ganhar dinheiro.

Então o setor de fintechs, apesar de parecer saturado, ainda tem espaço para crescer. Falar fintech é muito aberto. Há vários núcleos: pagamento, crédito, criptomoedas, soluções antifraude. No nosso estudo a gente identificou mais de 700 atuantes no Brasil, e com um nível de cobertura bastante grande nos vários segmentos.

No segmento de maquininhas de cartão de crédito, surgiram várias fintechs, algumas até com capital aberto, que passaram os players estabelecidos. Agora a gente começa a observar: será que tem espaço para todas essas 20, 30, 40 maquininhas diferentes? Uma indústria que está reduzindo receitas, ainda não encontrou novas fontes de lucro e que está muito dependente da transação do cartão, quando há métodos alternativos como o Pix? São empresas que surgiram com uma nova proposta e acharam um nicho de mercado, mas não acharam novas fontes de receita e começam hoje a ser pressionadas do ponto de vista de valuation.

Por outro lado, existem vários segmentos que são pouco explorados. Na parte de crédito, por exemplo, ainda não há fintechs em destaque. O crédito continua baseado nos grandes bancos. Na parte de criptomoedas, os bancos deixaram um vácuo, mas potencialmente vão surgir fintechs mais especializadas.

Eu diria que todos esses segmentos que a gente tem observado passam por uma fase de inchar até o processo de consolidação. Não faz sentido 40 empresas de maquininhas ou 40 tipos de conta digital.

Quais são as consequências para a sociedade desse nível de abstração que vamos alcançar em relação a dinheiro? Eu não diria que é um problema. Quanto mais você tira de dinheiro físico da sociedade, melhor, por vários aspectos. Circular dinheiro é caro: carro forte, logística. Você não controla dinheiro físico, por isso há esses casos de malas de dinheiro, apartamentos cheios de caixa de dinheiro. No formato digital é possível criar mecanismos regulatórios.

Agora, existem riscos. A gente fica à mercê de novas fraudes, então os mecanismos de controle também precisam evoluir. Por isso que uma das novas tendências mais importantes que apontamos no estudo é a preocupação com a cybersegurança e o controle. Se o sistema for falho, deixamos de ter uma apropriação de valor importante.

Fazendo um paralelo: o WhatsApp ficou fora do ar há alguns meses. Teve muito comércio que falou que deixou de faturar, porque hoje o mecanismo dele de faturamento é vender pelo WhatsApp. Se a gente começa a ter dias fora do ar no sistema, a sociedade deixa de ter os instrumentos para resolver seus pagamentos.

O senhor falou sobre a bancarização na pandemia, mas em áreas como trabalho e educação a digitalização foi um marcador da desigualdade. O que podemos fazer para não ver essa história se repetir com os pagamentos virtuais? O tema da digitalização passa por ter infraestrutura e conectividade. O primeiro ponto é: as pessoas precisam ter os equipamentos que tragam as condições de uso de que precisamos. Não é o celular de todo mundo que tem condições de fazer uma transação em tempo real, por exemplo. A indústria carece de infraestrutura. A gente está caminhando para o 5G, mas em várias regiões do Brasil nem o 3G está consolidado. Ter que pensar em soluções alternativas por causa de problemas de conectividade é colocar custos, adicionar estrutura para um problema que não deveria existir.

A segunda coisa é a seguinte: existe uma rede importante já estabelecida no Brasil. Às vezes não damos valor, mas vai ver a quantidade de pontos de caixas eletrônicos, de pontos de venda onde você consegue fazer uma transação. É uma rede importante, as coisas precisam ser integradas. Não adianta a gente achar que os novos players tem que ser 100% baseados em celular e esquecer que temos uma rede bastante rica e importante que funciona no Brasil. É um super diferencial. Precisamos de mecanismos integrados, e não só isolados, de celular para celular. O celular pode ler um QR code, fazer uma transação de campo de aproximação.

E a terceira coisa seria trabalhar com o consumidor final o entendimento de como as coisas funcionam. O Pix é um bom exemplo disso. Por que deu tão certo? É um sistema bem montado, e o custo de uma transação para um brasileiro era alto. Mas teve um fator muito importante que foi o engajamento amplo da mídia e dos bancos. No final, o consumidor entendeu amplamente como funcionava.

Falamos de um período bem longo, dez anos para a frente. Falando do próximo ano, o que podemos esperar de atualização do sistema financeiro e circulação de capital no Brasil? Eu diria que o Pix vai se consolidar. Veio para ficar, vai se integrar cada vez mais com boleto bancário e outros elementos de pagamento.

Segunda coisa: a gente deve ver um movimento mais forte das wallets, carteiras de pagamento. Os players atuais são importantes para transações de dinheiro entre pessoas, vamos começar a ver as soluções deles para capturar transações no mundo offline. A gente deve ver bastante QR Code na rua neste ano.

A terceira é a criptomoeda. A gente vai ver emergir algum mecanismo forte de criptomoedas no Brasil, potencialmente do próprio Banco Central, o Real Digital.

Por fim, eu diria que vai ter uma consolidação do credit on demand. No Brasil a gente está acostumado a pagar parcelado, e isso é, no final do dia, um financiamento. Quem banca é o lojista, mas não deixa de ser um financiamento. Com o open finance e o fortalecimento das fintechs de crédito, eu acho que tende a surgir o que a gente chama de credit on demand. Você vai comprar um produto e pode tanto pagar no cartão quanto pagar mais barato financiando diretamente com uma fintech ou um parceiro.

Raio-x

Willer Marcondes
Com passagens pela rede de hotéis Accor e pela multinacional de tecnologia Accenture, Marcondes é sócio da PwC Brasil, empresa de consultoria e auditoria

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