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Fome, agro e merenda: saiba os planos de Lula, Tebet e Ciro para alimentação

Folha enviou 9 perguntas para candidatos; presidente foi o único que não respondeu

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São Paulo

A fome foi assunto regular nos discursos dos candidatos à Presidência, uma recorrência que ecoa a seriedade do cenário brasileiro. Segundo dados divulgados em junho, são 33 milhões em estado de insegurança alimentar grave no país —que vive cenas como a de pessoas disputando ossos e restos de carne.

A Folha analisou programas de governo para entender quais são as estratégias defendidas pelos presidenciáveis que afetam a produção de comida e a alimentação saudável.

Montagem com candidatos a presidencia Luiz Inacio Lula da Silva (PT), Jair Bolsonaro (PL), e Simone Tebet (MDB) e Ciro Gomes
Montagem com candidatos a presidencia Luiz Inacio Lula da Silva (PT), Jair Bolsonaro (PL), e Simone Tebet (MDB) e Ciro Gomes (PDT) - Eduardo Anizelli e Pedro Ladeira/Folhapress e Divulgação

A Folha enviou perguntas para os candidatos Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Jair Bolsonaro (PL), Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB) sobre o tema. A equipe de Bolsonaro não respondeu.

O professor da FGV (Fundação Getulio Vargas) Nelson Marconi, coordenador do programa de governo de Ciro Gomes, diz que, em um eventual mandato, o candidato deve estimular a produção de alimentos saudáveis para que sejam mais baratos e aumentar a tributação dos que não são.

A campanha do PDT ainda se compromete em restituir o Consea (Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional), ação também mencionada por Lula. O órgão, extinto em 2019 por Bolsonaro, articulava setores do governo e representantes da sociedade civil para formular e monitorar políticas públicas relacionadas à alimentação e à fome.

Segundo Tereza Campello, ex-ministra de Desenvolvimento Social (2011-2016) nas gestões de Dilma Rousseff (PT) e integrante da comissão que ajudou a redigir diretrizes de governo de Lula, o petista pretende reforçar o Pnae (Programa Nacional de Alimentação Escolar), aumentando o valor per capita do repasse do governo federal para a alimentação escolar.

Em agosto, Bolsonaro vetou o reajuste de verbas para a merenda escolar aprovado pelo Congresso. Hoje, o repasse para a compra de alimento para cada estudante do ensino fundamental e médio é de R$ 0,36.

Segundo a equipe de Tebet, a senadora deve investir em um programa de renda mínima permanente para o combate à fome. Em um eventual governo, quer dar continuidade a programas como o Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) e destinar parte da produção de pequenos produtores para redes de assistência social.


1 .Quais as principais ações para impactar quem vive em situação de insegurança alimentar ou passa fome?

Lula (PT)

Para o candidato, o enfrentamento deve ser feito de forma multidimensional. Uma das frentes é aumentar a renda da população, o que deve ser buscado com um conjunto de medidas. Entre elas, o aumento do salário mínimo acima da inflação, a geração de empregos e o fortalecimento de programas de transferência de renda, com esforço imediato para que os R$ 600 [que seriam parte de um novo Bolsa Família ampliado] não sejam suspensos. Além disso, quer viabilizar um adicional de R$ 150 para famílias com crianças até seis anos. Outras metas são valorizar o aumento da produção de alimentos saudáveis e ampliar o acesso a políticas públicas. Isso inclui o fortalecimento do Pnae (Programa Nacional de Alimentação Escolar), com objetivo de aumentar o valor per capita [dos repasses do governo federal].

Ciro Gomes (PDT)

Propõe criar um programa de transferência de renda mínima, de forma que não haja nenhuma pessoa com renda inferior à da linha de pobreza. Além disso, quer estimular medidas como o refinanciamento de dívidas de famílias e empresas. A fim de reduzir a inflação dos alimentos, quer estimular a agricultura familiar e as cooperativas. Também defende o acesso a gás de cozinha pela metade do preço para famílias que recebam até dois salários mínimos.

Simone Tebet (MDB)

No curto prazo, diz que será feito um programa de transferência de renda, mas com critérios de entrada e saída do programa. Também pretende qualificar as pessoas para que tenham acesso ao mercado de trabalho e não retornem à condição de miséria. Afirma que deve investir na educação, atuando com ênfase nos ensinos infantil e médio, junto a cursos profissionalizantes.

2. Como incorporar demandas de diferentes movimentos, entidades e representantes da sociedade em políticas públicas para alimentação?

Lula (PT)

Sugere que a atuação da sociedade civil seja transformada em insumo para criação e aperfeiçoamento de políticas públicas, como, afirma, no caso do programa de cisternas [voltado a famílias rurais de baixa renda atingidas pela seca]. Por isso, pretende estabelecer diálogo sobre temas de combate à fome e de enfrentamento à pobreza e reconstruir o Consea [órgão que articulava setores do governo e representantes da sociedade civil].

Ciro Gomes (PDT)

Pretende ouvir movimentos e representantes da sociedade para formular políticas adicionais para o combate à fome com apoio de uma secretaria voltada a esse fim. Também quer dar atenção à fome na primeira infância.

Simone Tebet (MDB)

Pretende dar continuidade aos programas de transferência de renda permanente e fomentar a qualificação e emprego.

3. O consumo de ultraprocessados é uma questão a ser regulada? Considera uma taxação a esses alimentos? Qual postura do senhor/a em relação ao Guia Alimentar para a População Brasileira?

Lula (PT)

Defende que o direito à alimentação saudável e sustentável passe pelo respeito à cultura alimentar. Pretende estimular a população a comer de forma saudável, de acordo com o Guia Alimentar [documento do Ministério da Saúde que reúne diretrizes de alimentação adequada]. Defende também um guia voltado a crianças menores de dois anos. Pretende realizar debate sobre reforma tributária com a sociedade e acredita que a valorização de alimentos mais saudáveis e produzidos de forma sustentável deve ser considerada para compor e organizar a estrutura dessa legislação.

Ciro Gomes (PDT)

O candidato diz que serão adotadas medidas para regular o mercado, entre elas a restrição da publicidade de alimentos não saudáveis. Além disso, deve ampliar a tributação sobre alimentos não saudáveis, estimular a produção de alimentos saudáveis para que sejam mais baratos e reduzir sua tributação. Para ele, o Guia Alimentar da População Brasileira é importante para divulgar as características da boa alimentação. Também quer restituir o Consea (Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional).

Simone Tebet (MDB)

É a favor do debate e diz que os temas devem ser discutidos pela sociedade de forma permanente.

4. Como resolver de vez a demanda de pequenos produtores, que continuam a atuar sem leis e regulamentação que viabilizem a produção em pequena escala?

Lula (PT)

Acredita que existem, hoje, regras que inibem essa produção de ser valorizada e chegar ao mercado em um preço acessível. Defende a existência de regras sanitárias que preservem a saúde, mas não se tornem obstáculo à produção da agricultura familiar e do pequeno produtor.

Ciro Gomes (PDT)

Pretende ampliar e facilitar a concessão de crédito a pequenos produtores, com menores taxas de juros e renegociação de dívidas, além de apoiar a sua participação em feiras internacionais e as exportações desses produtos. Uma vez certificados, esses produtos, diz, deverão passar por um processo de fiscalização mais simplificado.

Simone Tebet (MDB)

Pretende apoiar pequenos produtores com cooperação técnica, incluindo a melhoria das condições de conectividade e eletrificação no campo. O projeto de governo de Tebet também contempla o fortalecimento do cooperativismo e da agricultura familiar com o crédito rural para o agricultor. A intenção é que o Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) intensifique o serviço de assistência técnica e extensão rural.

5. É possível conciliar a demanda do agronegócio com incentivos a pequenos produtores e agricultores familiares?

Lula (PT)

Afirma que tanto a produção do agronegócio quanto a da agricultura familiar, de pescadores, silvícolas e comunidades tradicionais são decisivas e devem ser valorizadas. Para isso, os planos em um eventual governo são aumentar a produção de alimentos, em especial saudáveis, voltados ao abastecimento do mercado interno, o que deve ser feito por grandes, pequenos e por agricultores familiares. Outro objetivo, diz a campanha do ex-presidente, é ter uma produção sustentável e que preserve a biodiversidade. Também pretende que setores modernos do agronegócio sejam referência para outros produtores.

Ciro Gomes (PDT)

Afirma que deve praticar uma política de compras públicas da produção de pequenos agricultores; essa política também deve auxiliar na criação de estoques reguladores e reduzir a volatilidade de preços dos alimentos, beneficiando produtores e consumidores.

Também quer trabalhar na expansão da rede de comercialização destes produtos, bem como ampliar a concessão de crédito com juros reduzidos para a estruturação destes negócios.

Simone Tebet (MDB)

Considera que o agronegócio e os pequenos produtores são complementares. Diz que pretende incentivar a agricultura familiar, incluindo os povos originários, as comunidades extrativistas, os quilombolas e os ribeirinhos.

6. Como aliar agronegócio e preservação ambiental em um cenário de desmatamento e pressão internacional?

Lula (PT)

O conjunto das políticas públicas, de acordo com a campanha, deve ser alinhado para favorecer a produção saudável e sustentável. Propõe, por exemplo, que a redução de juros de linhas de crédito rural seja vinculada a condicionalidades na área social e ambiental, o que também poderia acontecer com a ampliação de limite de financiamento. Pretende investir em inovação tecnológica para sustentabilidade, inclusive na produção de biofertilizantes [que podem ser, por exemplo, adubo orgânico fabricado à base de resíduos agrícolas] e criar estímulos para abastecimento interno e exportação de produtos orgânicos e da agroecologia. Quer avançar também na promoção de programas de rastreabilidade e de certificação.

Ciro Gomes (PDT)

O candidato diz que o manejo sustentável da floresta é a única forma de manter a posição do país no comércio mundial de produtos do agronegócio. Para isso, deve combinar inovação e políticas para atrair empresas de biotecnologia e engenharia de alimentos, além de atuar com os institutos de pesquisa. Quer fortalecer órgãos de fiscalização e policiamento para o desenvolvimento sustentável do agronegócio. Defende criar um zoneamento ecológico-econômico na Amazônia para identificar as vocações e a forma de manejar a floresta.

Simone Tebet (MDB)

Acredita ser possível conciliar os interesses do agronegócio com a preservação ambiental. Defende a integração lavoura-pecuária-floresta [integração dos sistemas de produção em um mesmo espaço] como um dos mecanismos.

7. Compras públicas podem ser usadas para fortalecer pequenos agricultores e agricultores familiares. Como o senhor/a vê essa ferramenta?

Lula (PT)

A campanha pontua como experiência positiva a atuação do PAA (Programa de Aquisição de Alimentos), criado em 2003 [e transformado em 2021 em Alimenta Brasil], que dá a possibilidade ao produtor de crescer com demanda constante, e o Pnae (Programa Nacional de Alimentação Escolar), que desde 2009 passou a utilizar um mínimo de 30% dos repasses de recursos na [aquisição de produtos] da agricultura familiar. Com o Pnae, diz o candidato, é possível melhorar a qualidade da merenda, fortalecer circuitos curtos e o desenvolvimento local e territorial. Quer reforçar esse viés do programa e retomar o PAA como forma de melhorar a qualidade das compras do Estado, reduzir impactos ambientais e promover aumento da renda e redução da pobreza rural.

Ciro Gomes (PDT)

Defende a adoção do mecanismo por meio de uma política de compras públicas da produção de pequenos agricultores, que auxiliará na criação dos estoques.

Simone Tebet (MDB)

Pretende dar apoio para que produtores tenham acesso ao mercado por meio da compra de sua produção. Ela será distribuída nas redes de assistência social Cras (Centro de Referência da Assistência Social). Quer fortalecer agricultores com programas que já existem, como as compras públicas para a merenda escolar.

8. Os registros de agrotóxicos cresceram 14% em relação a 2020 no Brasil. Como conciliar produtividade com produção sustentável?

Lula (PT)

Alega que processos [de aprovação dos registros de agrotóxicos] devem avançar para ter menos burocracia, mas sem reduzir segurança. Para que os produtos sejam eficientes e preservem a saúde, acredita ser fundamental que a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) atue no processo de liberação e aprovação dos agrotóxicos ao lado do Ministério do Meio Ambiente, por meio do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).

Ciro Gomes (PDT)

Defende o fim da importação de fertilizantes e defensivos agrícolas e propõe produzi-los no país. Também pretende usar as previsões meteorológicas e de risco climático para reduzir a necessidade de defensivos e se posiciona a favor de uma padronização do limite de tolerância do uso desses produtos. Acredita que o país deve seguir padrões internacionais, adotados pelas agências americanas e europeias, e que é preciso criar laboratórios de certificação dos defensivos agrícolas.

Simone Tebet (MDB)

A senadora pretende avaliar junto à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária Anvisa) a aprovação e reprovação de agrotóxicos, de forma a entender se mudanças de processos são necessárias ou não. Diz ser preciso "tropicalizar" a ciência desenvolvida por países-membros da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento).

9. Em 2020, os estoques públicos de alimentos tiveram sua maior baixa em dez anos. Quais planos em relação a eles?

Lula (PT)

Diz que o país já implementou políticas públicas que asseguram os estoques e a soberania alimentar, o que, no ponto de vista do candidato, significa ter capacidade de produzir alimento e ter estoque suficiente para enfrentar imprevistos e emergências. Afirma que vai reforçar um conjunto de ações voltadas à política nacional de abastecimento e, para isso, também de estoques reguladores

Ciro Gomes (PDT)

Alega que estoques reguladores são essenciais para controlar a volatilidade de preços e combater a fome.

Simone Tebet (MDB)

A candidata pretende manter e melhorar os estoques reguladores, que são acionados quando o preço de mercado está abaixo do custo de produção.

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