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Polarização política é o maior medo de executivos em 2023

Enquete da BTA mostra alto escalão animado com o primeiro ano sem restrições sanitárias desde 2020

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São Paulo

Já faz dez anos que o contador Rodrigo Capuruço, 44, ouviu de um chefe alemão um comentário sobre o povo brasileiro, do qual não se esqueceu.

"Vocês, brasileiros, têm flexibilidade, isso é uma riqueza incrível", ouviu Capuruço, hoje presidente no Brasil e na América Latina da Volkswagen Financial Services, braço financeiro da montadora alemã.

Rodrigo Capuruço, presidente no Brasil e na América Latina da Volkswagen Financial Service - Zanone Fraissat/Folhapress

O então chefe de Capuruço se referia, especialmente, à tolerância com as opiniões e até erros dos outros, a boa vontade em conversar e procurar um consenso diante de um impasse, e de se adaptar aos diferentes contextos.

"Cumprir uma agenda democrática não é simples. É preciso muito diálogo para se criar um consenso e, ao mesmo tempo, ter disciplina para aplicar as medidas necessárias", diz ele, um dos executivos entrevistados na enquete promovida pela BTA Associados sobre as perspectivas do alto escalão para 2023, no período pós-eleitoral.

"Mas me preocupa ver a polarização política tomando conta dos ambientes de convívio, de todos eles, e colocando em xeque essa qualidade brasileira tão especial, que até os estrangeiros reconhecem em nós."

A enquete feita pela consultoria BTA Associados, especialista em gestão organizacional, com exclusividade para a Folha, colheu entre os dias 12 e 19 de setembro a opinião de 203 executivos, em uma plataforma própria de pesquisas online.

Os entrevistados ocupam cargos de liderança (presidentes, membros do conselho de administração, diretores e gerentes) em médias e grandes companhias, de diversos setores, em diferentes regiões do país.

"A maior parte dos executivos entrevistados estão nos cargos de diretores e gerentes", diz Vânia Café, sócia da BTA. Eles respondem por 65% da amostra, que se completa com 24% de presidentes e 11% de membros do conselho de administração.

O levantamento apontou que 62% veem na polarização política o maior problema a ser enfrentado no ano que vem. Por outro lado, o controle da pandemia de Covid-19, com o alto índice de vacinação, é a melhor coisa que 2023 reserva, na opinião de 83% dos entrevistados.

"Ao que tudo indica, 2023 será o primeiro ano, desde 2020, em que as empresas vão trabalhar sem o impacto das restrições sanitárias e os executivos estão muito otimistas com este cenário", diz Vânia, sócia da BTA.

"Por outro lado, independentemente de quem vencer as eleições majoritárias, os executivos veem a polarização política como um problema grave no próximo ano, com a manutenção dos ânimos bastante acirrados –o que impacta direta ou indiretamente os negócios."

Diretamente, segundo a especialista, porque temas relevantes da agenda empresarial, como a carga tributária, podem sofrer entraves se não houver governabilidade, ou seja, se cada um dos lados se entrincheirar nas suas convicções e não houver diálogo que faça avançar as reformas.

Indiretamente porque as equipes correm o risco de ficarem divididas, com uma comunicação falha, entremeada por desconfianças e preconceitos, o que pode atingir também o diálogo com os demais players das empresas –consumidores, fornecedores, parceiros, investidores e o próprio governo.

A pesquisa da BTA apontou que o segundo maior fator de preocupação dos executivos para 2023 é a carga tributária (47% estão pessimistas ou muito pessimistas com o assunto), seguida pela governabilidade (37%).

Por outro lado, a maioria se mostra otimista ou muito otimista com a sua empresa (75%), seu setor de atuação (66%) e com investimentos estrangeiros (56%).

Na opinião dos entrevistados, a principal característica que o novo mandatário do país deve ter é governabilidade –resposta de 71% da amostra. Outras competências importantes indicadas são gerir com ética e transparência (36%), ter boa comunicação (18%), ser resolutivo (16%), ter capacidade de negociação (16%) e ser reformador (15%).

Novo presidente deve ter mais habilidades 'soft' do que 'hard'

"O que percebemos é, que na opinião dos executivos, o novo –ou a nova– presidente deve ter um perfil mais soft do que hard", diz Vânia. Isso porque a maioria das competências citadas para o mais alto cargo do país são do perfil "soft skills", que reúne as habilidades comportamentais e subjetivas. Em segundo lugar, vêm as "hard skills" (habilidades técnicas).

"Entre as soft skills apontadas estão gerir com ética e transparência, ter boa comunicação, plasticidade, empatia, inteligência emocional, desenvolvimento pessoal, relacionamento interpessoal e patriotismo", diz.

Já entre as hard skills estão um perfil resolutivo, reformador, com competência técnica, senso de prioridade, visão sistêmica, capacidade de planejamento e capacidade analítica, afirma.

Embora em menor número, as competências políticas –governabilidade, capacidade de negociação, diplomacia, pacificador, agregador– foram as mais representativas na amostra.

"Para governar, é preciso competência política, que articula as demais habilidades", diz Vânia. "O dirigente ideal reúne as dimensões hard, soft e política para produzir resultados que superam a soma de resultados individuais."

Ainda no cenário político, 62% dos entrevistados se mostraram pessimistas ou muito pessimistas com uma eventual vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Outros 46% se sentiriam assim caso o vencedor seja o presidente Jair Bolsonaro (PL).

O cenário menos pessimista é o que traça a vitória da senadora Simone Tebet (MDB): apenas 24% de pessimistas, frente a 43% de otimistas.

Segundo Vânia Café, as respostas não indicam, necessariamente, uma desaprovação a um virtual governo do petista. Como a enquete evidenciou a preocupação dos executivos com polarização política, a resposta poderia indicar um pessimismo em relação ao tema, caso o petista ganhe.

"Mas a enquete não chegou a este nível de detalhamento", afirma.

Educação é maior prioridade do próximo governo, dizem executivos

O levantamento feito pela BTA apontou que a prioridade do próximo governo deve ser educação –48% das respostas. O tema ganha de outros importantes na agenda executiva, como reforma tributária (41%), crescimento do PIB (18%), reforma administrativa (18%) e até mesmo combate à corrupção (17%).

"São os diretores e gerentes que estão na linha de frente das empresas, eles sentem a dificuldade de desenvolvimento das equipes, que em muitos casos não passaram por uma boa educação de base", diz a sócia da BTA. "Então, em um momento de alta competitividade, com muitas demandas por parte do mercado, eles precisam de pessoas bem preparadas e se ressentem de não contar com essa formação."

A executiva lembra ainda que outra preocupação do alto escalão é com o gap educacional gerado na pandemia, que envolve desde a educação básica.

A comunicação dentro das companhias também ganhou outro status após os anos de pandemia. De acordo com o levantamento, garantir a comunicação entre os diferentes níveis dentro da organização é a terceira maior prioridade para 2023 na opinião dos entrevistados (83% das respostas), depois de atingir resultados superiores (92%) e garantir a eficiência nas operações (89%).

Investir no desenvolvimento de pessoas, equipes e cultura organizacional está em quarto lugar entre as prioridades (81%).

"As companhias se mostram preocupadas em garantir uma comunicação eficiente em meio ao trabalho que, muitas vezes, é híbrido ou até continua remoto", diz Vânia.

Para Rodrigo Capuruço, da Volks, 2023 é mais um ano para o empresariado brasileiro provar a sua resiliência. "Não é possível controlarmos os ventos, mas podemos ajustar as velas."

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