Descrição de chapéu Financial Times

Toyota, pioneira em híbridos com o Prius, luta para adotar os elétricos

Depois do lançamento fracassado de seu primeiro veículo elétrico, montadora tenta convencer clientes a alugar, não comprar

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Eri Sugiura Peter Campbell
Tóquio e Londres | Financial Times

Cinco meses depois que a Toyota começou a vender seu primeiro carro totalmente elétrico para competir diretamente com a Tesla, quase nenhum deles é visto nas ruas.

O lançamento do utilitário-esportivo bZ4X foi planejado como um divisor de águas para a maior montadora do mundo em vendas. Seu primeiro veículo elétrico (VE) produzido em massa foi a resposta da Toyota às críticas dos investidores sobre sua demora em adotar a transição do setor para o elétrico.

Em vez disso, a tão esperada estreia foi prejudicada por um humilhante recall global devido a problemas de segurança e atrasos na cadeia de suprimentos causados pela pandemia de coronavírus. Com o lançamento do bZ4X retomado recentemente, a Toyota passou grande parte do ano na defensiva e sob escrutínio por seu lobby contra as regras destinadas a incentivar a mudança para veículos elétricos.

O Toyota bZ4X, totalmente elétrico, em convenção de automóveis em Los Angeles, nos EUA - Mike Blake - 17.nov.2021/Reuters

"A Toyota não está respondendo corretamente aos apelos do mercado para liderar os veículos elétricos. A Toyota precisa demonstrar sua liderança, caso contrário poderá não apenas desencaminhar suas iniciativas verdes, como também perder a confiança dos investidores", disse Satoru Aoyama, diretor da Fitch Ratings.

Durante muitos anos, a Toyota conseguiu lidar com facilidade em sua frota com os limites de emissões estabelecidos por órgãos reguladores da Europa, EUA e China, em grande parte graças à sua popular linha híbrida liderada pelo Prius.

Entretanto, regras mais duras nos principais mercados exigem que ela venda um número significativo de modelos apenas com bateria nos próximos anos, ou se arriscará a multas elevadas. Também está sendo forçada a repensar sua antiga estratégia de se concentrar nos híbridos como a resposta menos poluidora na transição para os VE.

Na Europa, onde a grande maioria dos Toyotas vendidos são híbridos, a empresa terá que passar a vender modelos de emissão zero até 2035 e, em alguns casos, até o final desta década.

Na América do Norte, o maior mercado do grupo, o presidente da empresa, Akio Toyoda, disse recentemente que cumprir uma meta proposta pelos EUA de metade das vendas de veículos elétricos até 2030 seria "muito difícil".

Por enquanto, porém, o ritmo está bom. Apesar das interrupções na cadeia de suprimentos, a Toyota registrou um lucro líquido recorde de 2,8 trilhões de ienes (US$ 19,7 bilhões; R$ 103,4 bilhões) no ano encerrado em março, um aumento de 27% em relação ao ano anterior. Suas ações subiram 43% nos últimos cinco anos, em comparação com uma queda de 10% na Volkswagen e de 28% na General Motors. A empresa vendeu 6,2 milhões de veículos no ano até o final de agosto, 28% dos quais eram híbridos.

A maior montadora do Japão há muito argumenta que uma mudança rápida e forçada para veículos elétricos aumentará as emissões devido ao enorme reforço necessário na produção. Os híbridos, que funcionam com uma bateria modesta e um pequeno motor a gasolina, fornecem uma solução provisória muito mais limpa, diz.

O cientista-chefe da Toyota, Gill Pratt, disse em uma cúpula do Financial Times este ano que direcionar a indústria exclusivamente para carros elétricos que dependem de baterias grandes "não é uma boa ideia se o objetivo for reduzir ao máximo as emissões de dióxido de carbono em todo o mundo", e que os VEs "não são a única resposta".

Para se proteger contra o risco de ficar fora de uma revolução e perder sua reputação de décadas como pioneira em tecnologia verde graças ao Prius, em dezembro a Toyota prometeu investir US$ 35 bilhões na mudança para veículos elétricos até 2030 e fabricar 3,5 milhões deles até o final da década.

Quando a Toyota lançou o bZ4X, cinco meses depois, veio com uma meta nada impressionante de entregar apenas 5.000 deles em seu mercado doméstico no primeiro ano, e um modelo de negócios muito incomum. No Japão, o carro não está sendo vendido aos consumidores, mas alugado, o que significa que os veículos serão devolvidos à companhia após o término do contrato, de no máximo dez anos.

Executivos do setor dizem que esse modelo de assinatura deve reduzir os riscos e custos dos veículos elétricos tanto para a montadora quanto para o consumidor, além de prolongar a vida útil das baterias e dos metais preciosos vitais para fabricá-las.

Pratt disse na cúpula do FT que a montadora está "muito preocupada em médio prazo que [a indústria] sofra falta de materiais para o fornecimento de baterias".

"O que a Toyota quer é reter as baterias", disse um ex-executivo da empresa. "As baterias costumam ter valor próximo de zero após uma década, mas a Toyota quer coletar as que ainda têm 70% a 80% da capacidade restante após o primeiro uso e reutilizá-las."

Do ponto de vista da Toyota, um grande benefício do leasing em vez da venda de VEs é que isso permite que a empresa mantenha mais lítio e outros metais de terras raras no Japão, seguindo a lição que aprendeu com o lançamento do Prius em 1997.

Modelos antigos do Prius são encontrados hoje em todos os lugares, do País de Gales à Mongólia, enquanto os elétricos Nissan Leaf usados chegaram à Rússia e à Nova Zelândia. A Nissan também revelou planos para permitir que os motoristas japoneses aluguem seus VEs, em vez de comprá-los.

Sanshiro Fukao, membro sênior do Instituto de Pesquisas Itochu, disse que a retenção de baterias se tornou um imperativo estratégico. "A Toyota espera que o modelo de leasing permita manter o controle das baterias e eliminar qualquer fonte de fluxo externo, pois a falta de materiais para baterias pode ameaçar a continuidade dos negócios."

Para os clientes, outra preocupação com os veículos elétricos é se as baterias se degradarão com o tempo e se os VEs manterão seu valor quando chegar a hora de vender e comprar um novo.

Esses fatores e a falta de infraestrutura de carregamento significam que no Japão, o terceiro maior mercado automotivo do mundo, os veículos elétricos representaram apenas 1% das vendas de carros no ano passado, em comparação com 26% na Alemanha, 16% na China e 4,6% nos Estados Unidos, segundo a Agência Internacional de Energia.

"O mercado automotivo japonês ainda está fortemente focado em híbridos, enquanto o internacional migra rapidamente para os elétricos", disse Sandra Roling, chefe de transporte da ONG Climate Group. "Não participar dessa mudança coloca a indústria japonesa em séria desvantagem."

Hiroyoshi Ninoyu, presidente da Tokai Rika, fornecedora de autopeças da Toyota, disse que um serviço de assinatura é uma maneira de a empresa demonstrar os méritos dos veículos elétricos aos consumidores japoneses, mas expressou dúvidas de que o leasing se enraíze em um país onde os consumidores estão acostumados a possuir veículos.

Takaki Nakanishi, analista automotivo veterano que dirige seu próprio grupo de pesquisa, disse que a Toyota precisa experimentar um serviço de aluguel para encontrar um modelo de negócios gerador de lucro para veículos elétricos.

"Atualmente, ninguém desfruta dos benefícios econômicos dos veículos elétricos", disse Nakanishi, citando o alto custo das baterias para as montadoras, bem como os vários obstáculos enfrentados pelos consumidores que compram e usam veículos elétricos. A Ford, por exemplo, disse que o Mustang Mach-E custa US$ 25 mil a mais para ser produzido do que um esportivo-utilitário Edge equivalente movido a gasolina.

"É por isso que a Toyota quer testar um novo modelo de negócios que mude o comportamento das pessoas e a forma como a indústria ganha dinheiro com carros elétricos. Mas para fazer esse teste a Toyota precisa que as baterias retornem dos consumidores, e um modelo de assinatura permite isso."

Mas primeiro a Toyota precisa entregar seus veículos elétricos. Em junho, a empresa alertou que as rodas do bZ4X poderiam cair por causa de problemas com parafusos. Mais tarde, descobriu uma falha nos airbags do carro. A partir deste mês, volta a produzir os veículos, corrigindo as falhas.

"O recall foi um grande revés para a Toyota", disse Nakanishi. "A empresa tem um desafio no que se trata de veículos elétricos. Ela foi muito arrogante ao pensar que poderia facilmente ter sucesso com VEs porque teve com os híbridos."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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