Descrição de chapéu Folha ESG

Combustível 'limpo' para aviões já existe, mas é só 0,1% do total; conheça o SAF

Companhias querem que governos ofereçam incentivos para adoção do produto, mas criticam imposição de taxas contra emissões

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Genebra

A produção de SAF (Combustível Sustentável de Aviação) deve atingir 300 milhões de litros no mundo em 2022. O número é o triplo do ano passado. No entanto, ainda representa 0,1% do total de combustível usado no mundo pelos aviões.

Isso não impede o setor de ter planos ambiciosos para o SAF: espera-se que a produção atinja 8 bilhões de litros em 2025, o que representaria 2% do mercado. Em seguida, viria avanço mais forte nas décadas de 2030 e 2040. Em 2050, o plano é que a produção atinja 450 bilhões de litros anuais, tornando-se o combustível-padrão.

As empresas aéreas, pressionadas publicamente para reduzir suas emissões de poluentes, têm interesse em comprar mais SAF. Além de poluir 80% menos que o querosene, o novo combustível é fácil de adotar: pode ser usado nos motores de aviões já existentes, sem grandes adaptações. O SAF também pode ser misturado ao querosene em várias proporções.

Um Boeing 777 cargueiro, da Lufthansa, que opera com SAF, no aeroporto de Frankfurt - Ralph Orlowski - 27.nov.20/Reuters

A demanda pelo combustível também cresce por causa dos voos corporativos. Empresas como KPMG Austrália e BCG (Boston Consulting Group) fizeram acordos recentes com as companhias aéreas para que os voos comprados para seus funcionários sejam feitos usando combustível limpo, e aceitaram pagar taxas extras por isso.

"Nossa maior fonte de emissões vem das viagens de negócios, e nos comprometemos a cortar as emissões pela metade até 2025, comparado a 2018", disse David Webb, diretor de sustentabilidade da BCG, à Reuters.

A australiana Qantas, que fez acordos desse tipo com cinco empresas, se comprometeu a usar 10% de SAF na sua matriz de combustíveis até 2030, e subir este percentual para 60% até 2050.

Apesar da alta procura, o avanço do SAF é lento por várias razões, especialmente a dificuldade em aumentar a produção. O combustível é feito a partir de óleos de plantas como palma e mamona, e de rejeitos orgânicos, incluindo óleos vegetais descartados. Montar uma fábrica leva de três a cinco anos.

Outro entrave vem das áreas técnicas das companhias aéreas: há dúvidas se o uso contínuo do SAF pode afetar a vida útil dos motores ou exigir mais manutenções. Como a tecnologia é recente, ainda não há testes que comprovem os efeitos de queimar óleos vegetais durante anos.

Ainda há o problema do preço: cada litro do SAF custa de 2,5 a 5 vezes mais que o querosene de aviação. Assim, mesmo com o preço do petróleo tendo subido muito este ano, o novo combustível ainda está distante de ter preço competitivo.

O setor aéreo espera que com a adoção em larga escala, os custos sejam mais manejáveis, já que a produção poderá ser feita em várias partes do mundo. Com o petróleo, questões políticas em regiões como o Oriente Médio e a Rússia impactam os preços.

Segundo a Iata (Associação Internacional de Transportes Aéreos), existem em torno de cem projetos de fabricação do SAF em 30 países, mas a maioria fica nos EUA e na Europa. Na América Latina, há uma refinaria sendo erguida no Panamá, que deverá ser uma das maiores do mundo.

No Brasil, há um projeto em Manaus, da BrasilBioFuels, previsto para entrar em operação em 2025.

"A América Latina está muito bem posicionada para capitalizar este mercado, por ter muito potencial de fornecer matéria-prima", diz Hemant Mistry, diretor de transição energética na Iata.

As aéreas defendem que os governos adotem medidas de incentivo, como estímulos fiscais e a criação de regulações. No Brasil, por exemplo, não há determinação exata de quais impostos serão cobrados sobre o produto ou qual o percentual de mistura com o querosene que pode ser usado.

Ao mesmo tempo, os empresários criticam pressões como a imposição de taxas para quem continuar usando querosene. Na quarta (7), a União Europeia chegou a um acordo sobre uma lei para aumentar o valor que as companhias aéreas têm de pagar por suas emissões de dióxido de carbono. A lei ainda precisa ser aprovada no Parlamento Europeu e ratificada pelos países do bloco.

"Como vimos no passado, existirão países que continuarão a ver isto como uma oportunidade de aumentar as receitas por meio de taxas em nome do ambiente. Nada deste dinheiro irá realmente ser direcionado para resolver problemas ambientais", questiona Willie Walsh, diretor-geral da Iata.

Há ainda uma preocupação de que os governos priorizem investimentos em biodiesel, para ônibus e caminhões, em vez do SAF, já que, geralmente, uma mesma refinaria pode fazer as duas coisas. "Se houver incentivos financeiros para o biodiesel, as refinarias podem produzir mais dele e não se focarem no SAF. É preciso haver equilíbrio. Não se esqueçam da aviação", pede Mistry.

Os modelos de estímulo variam entre os continentes. Na Europa, a UE debate uma regra que obrigue as aéreas a usar ao menos 2% de SAF em sua matriz de combustíveis a partir de 2025. O percentual subiria gradativamente, até atingir 63% em 2050. A exigência valeria para todas as empresas que tenham voos partindo dos países do bloco.

Já nos EUA, em 2021, o presidente Joe Biden lançou um programa para estimular a produção de SAF, que inclui créditos de impostos e parcerias com agricultores para obter matéria-prima. A meta é atingir uma produção de ao menos 3 bilhões de galões de SAF por ano até 2030 e ter combustível limpo para abastecer 100% da aviação americana até 2050.

O jornalista viajou a convite da Iata.

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