Descrição de chapéu União Europeia Mercosul

Em Paris, Lula chama de 'ameaça' carta da União Europeia sobre acordo com Mercosul

Presidente criticou a ausência de menção à desigualdade em encontro com líderes mundiais

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Paris

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a fazer críticas ao acordo entre Mercosul e União Europeia nesta sexta (23). Em sua passagem pela França, Lula fez reclamações sobre o termo adicional —conhecido como "side letter"—, que foi apresentado pelo bloco europeu e busca tornar obrigatório alguns compromissos ambientais.

"Não é possível que haja uma carta adicional fazendo ameaças a parceiro estratégico", disse. "Estou doido para fazer um acordo com a União Europeia. Não é possível a carta adicional que foi feita pela União Europeia. Vamos mandar resposta, mas é preciso que comecemos a discutir", acrescentou o petista.

O presidente francês Emmanuel Macron (à direta) fala ao lado do presidente Lula e do primeiro-ministro da China, Li Qiang, na cerimônia de encerramento da Cúpula do Novo Pacto Financeiro, em Paris - Lewis Joly/Pool via AFP

A side letter é hoje um dos principais impasses para a conclusão do acordo UE-Mercosul, que teve as negociações encerradas em 2019, durante primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro (PL), mas ainda não foi ratificado pelos dois blocos.

Negociada oficialmente desde 1999, a resolução tem padrões de sustentabilidade, mas que não são vinculativos. O termo adicional tornariam obrigatórios alguns compromissos ambientais. No entanto, membros do governo brasileiro consideram as condições muito rígidas.

Após criticar a carta da UE sobre o acordo, Lula fez elogios ao bloco —cuja criação foi, segundo ele, "um patrimônio democrático para a humanidade depois de duas guerras".

Disse ainda que gostaria de fazer o mesmo na América Latina e que hoje a União Africana é muito mais organizada que os países latinoamericanos.

Em sua fala, Lula voltou a defender moedas para o comércio internacional que tornem os países independentes do dólar. "Por que preciso do dólar para negociar com a Argentina, com a China?", questionou.

Lula avisou que falaria de improviso. "Já mudei meu discurso dez vezes e não vou ler", disse.

Em encontro com o presidente francês, Emmanuel Macron, e dezenas de chefes de Estado —para a cerimônia de encerramento da da Cúpula do Novo Pacto Financeiro— Lula criticou a ausência de menção à desigualdade.

O evento promoveu seis mesas redondas para discutir a reforma de instituições financeiras multilaterais e bancos de desenvolvimento, com o objetivo de alavancar o investimento em infraestrutura básica e ações climáticas nos países em desenvolvimento.

"Não é possível que, em um encontro com líderes mundiais, a palavra desigualdade não apareceu", reclamou. "Junto da questão climática, temos que colocar a desigualdade. Salarial, de raça, de gênero, de saúde", propôs Lula, acrescentando que o mundo aumentou a concentração de riqueza.

"Se não discutir a desigualdade com igual prioridade à questão climática, podemos ter um clima muito bom e o povo morrendo de fome em vários países", afirmou.

Lula voltou a dizer que é fácil governar para os pobres e afirmou que o governo precisa agora, com a volta da fome, fazer de novo tudo que foi feito em 2003.

"Vamos acabar com a fome. Dilma sabe que podemos. Agora ela pode preparar a caneta para assinar uns empréstimos, para o Brasil e para os países mais pobres", afirmou.

O presidente defendeu reformas no Banco Mundial e no FMI e voltou a criticar o critério do assentos permanentes no conselho de segurança da ONU, que, segundo ele, não representa mais a realidade de 2023, mas a de 1945.

Ao defender que a ONU tenha mais representatividade e força política, Lula afirmou que, sem isso, a questão climática vira "uma brincadeira". O presidente citou como exemplo a falta de implementação dos acordos climáticos.

"Vamos ser francos: quem aqui cumpriu [o Protocolo de] Kyoto? [A decisão de] Copenhague, COP21? [O Acordo de] Paris?", questionou, em tom de provocação aos chefes de Estado.

Lula ainda criticou o enfraquecimento da OMC (Organização Mundial do Comércio), ao que atribuiu o retorno do protecionismo.

Discurso ambiental

O presidente reforçou o convite para a COP30 do Clima e também para a Cúpula da Amazônia, que acontece em agosto e deve reunir líderes dos países amazônicos para formular propostas para as grandes florestas, que depois também devem ser integradas em articulações com Indonésia e países africanos.

Lula repetiu dados sobre a conservação da Amazônia, o compromisso de zerar o desmate até 2030 e a predominância da energia renovável na matriz brasileira. Também citou adversidade como o garimpo, o crime organizado e o avanço agrícola sobre a floresta.

"Tem pessoas de má-fé que tentam fazer com que se plante soja e milho na floresta, quando isso não é necessário", disse, citando que há 30 milhões de terras degradadas disponível para recuperação e plantio.

"Empresários responsáveis sabem que isso [o desmatamento] vai criar um problema muito sério aos produtos que queremos vender aos outros países", citou, citando também a importância dos outros quatro biomas brasileiros, para além da Amazônia.

Ao final do discurso, Lula disse que, apesar dos 77 anos de idade, tem a energia de quando tinha 30 anos.

"Macron, se prepare, que estou com mais vontade de brigar nesses próximos três anos como presidente do Brasil", disse o presidente ao final do discurso. Ao falar na sequência de Lula, o francês respondeu que também estava indignado e com a mesma energia que todos ali.

A repórter viajou a convite da Embaixada da França no Brasil.

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