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Inflação abaixo do esperado em maio reduz projeções para 2023

Analistas calculam um IPCA menor no acumulado do ano, mas ainda estourando o teto de 4,75%

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Rio de Janeiro

Com a trégua dos preços das passagens aéreas, da gasolina e dos alimentos, o índice oficial de inflação do Brasil desacelerou para 0,23% em maio.

É a menor variação do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) para o mês desde 2020 (-0,38%), quando o início da pandemia paralisava atividades econômicas.

O novo resultado, divulgado nesta quarta-feira (7) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), surpreendeu o mercado financeiro.

Na mediana, analistas consultados pela agência Bloomberg projetavam uma alta maior, de 0,33%. O IPCA havia subido 0,61% em abril.

Cliente faz compras em atacarejo na capital paulista - Rubens Cavallari - 12.abr.2022/Folhapress

Com a desaceleração, o índice atingiu 3,94% no acumulado de 12 meses até maio. É o menor nível desde outubro de 2020 (3,92%). O avanço era de 4,18% até abril de 2023.

A surpresa do último mês fez analistas revisarem para baixo as projeções para o IPCA fechado deste ano e reforçou a expectativa de redução na taxa básica de juros (Selic) no início do segundo semestre.

O Copom (Comitê de Política Monetária), ligado ao BC (Banco Central), vem mantendo a Selic em 13,75% ao ano sob argumento de que busca conter a inflação. O colegiado volta a se reunir nos dias 20 e 21 de junho.

"Aparentemente, está se consolidando um cenário de inflação mais branda. Aí, o Banco Central tem de fazer a parte dele", afirma Alex Agostini, economista-chefe da agência de classificação de risco Austin Rating.

Na visão de Agostini, até haveria espaço para um corte na Selic em junho. Porém, a expectativa é de que, após a reunião, o Copom sinalize uma redução no encontro seguinte, marcado para agosto.

"Não faz muito sentido ficar esperando mais tempo", diz.

Agostini destaca que a inflação vem mostrando trégua no atacado e avalia que esse movimento começa a aparecer de maneira mais nítida nos preços finais para o consumidor. A Austin reduziu sua previsão para o IPCA no acumulado de 2023, de 5,8% para 5,5%.

Outras instituições pegaram o mesmo caminho após a divulgação desta quarta. O banco Original cortou sua estimativa de 5,7% para 5,2%. A consultoria MB Associados, por sua vez, diminuiu sua projeção de 5,5% para 5,3%.

"Com a divulgação do IPCA de maio em 0,23% e abaixo da expectativa de mercado, consolida-se o cenário de queda de juros a partir do segundo semestre", afirma a MB em relatório assinado por Sergio Vale, economista-chefe da consultoria.

Apesar das projeções menores para o acumulado do ano, ainda é consenso que a inflação deve estourar o teto da meta. Em 2023, o centro da meta de inflação, que serve como referência para o BC, é de 3,25%. O intervalo de tolerância é de 1,5 ponto percentual para mais (4,75%) ou para menos (1,75%).

PASSAGEM AÉREA, GASOLINA E ALIMENTOS IMPACTAM DADO DE MAIO

Dos 9 grupos de produtos e serviços pesquisados pelo IBGE, 7 tiveram alta de preços no mês passado. O principal impacto positivo (0,12 ponto percentual) e a maior variação (0,93%) dentro do IPCA foram de saúde e cuidados pessoais.

Na sequência, vieram habitação (0,67%) e despesas pessoais (0,64%), com 0,10 ponto percentual e 0,07 ponto percentual, respectivamente.

Os preços dos grupos de transportes (-0,57%) e artigos de residência (-0,23%), por outro lado, recuaram em maio.

Em transportes, destacam-se as quedas das passagens aéreas (-17,73%) e dos combustíveis (-1,82%). Houve reduções no óleo diesel (-5,96%), na gasolina (-1,93%) e no gás veicular (-1,01%).

Individualmente, os principais impactos que levaram a inflação de maio para baixo vieram das passagens aéreas (-0,11 ponto percentual) e da gasolina (-0,10 ponto percentual).

André Almeida, analista da pesquisa do IBGE, afirmou que o recuo dos bilhetes de avião pode ser associado à base de comparação elevada. As passagens haviam subido 11,97% em abril.

No caso da gasolina, a redução veio na esteira do corte nos preços que entrou em vigor em meados de maio nas refinarias da Petrobras, conforme o pesquisador.

Almeida ainda destacou que a desaceleração do IPCA foi influenciada pelo grupo alimentação e bebidas. O segmento passou de alta de 0,71% em abril para elevação de 0,16% em maio.

"Trata-se do grupo com maior peso no índice, o que acaba influenciando bastante no resultado geral", disse Almeida.

Segundo analistas, de modo geral, as condições melhores de safra neste ano estimulam a trégua da inflação da comida.

Em alimentação e bebidas, o principal destaque veio da alimentação no domicílio. Esse componente desacelerou de 0,73% em abril para estabilidade em maio (0%).

Houve quedas nos preços das frutas (-3,48%), do óleo de soja (-7,11%) e das carnes (-0,74%).

IPCA maior no segundo semestre

De acordo com a economista Luciana Rabelo, do Itaú Unibanco, as surpresas com o IPCA de maio ficaram mais concentradas em alimentação no domicílio, que desacelerou mais do que o previsto, e gasolina, que caiu mais do que o esperado.

A inflação em 12 meses, diz Rabelo, deve seguir perdendo força até junho, para perto de 3,5% ou 3,4%. O IPCA, contudo, tende a acelerar novamente no acumulado a partir de julho, prevê a economista.

Ela afirma que esse movimento deve ser puxado por fatores como o retorno integral de tributos federais sobre a gasolina.

Até o final de 2023, o cálculo da inflação acumulada também deve refletir o fim do impacto das deflações que ocorreram no segundo semestre de 2022.

Às vésperas das eleições do ano passado, os preços de produtos como gasolina e energia foram reduzidos de maneira artificial pelo corte de tributos promovido pelo governo Jair Bolsonaro (PL).

Por ora, o Itaú Unibanco projeta IPCA acumulado de 5,8% até dezembro de 2023, após o avanço de 5,79% em 2022. A estimativa, porém, deve ser revisada em breve, e o viés é de baixa, segundo Rabelo.

"É uma desaceleração lenta, gradual."

"Para a próxima reunião do Copom, nos dias 20 e 21 de junho, não se espera alteração na Selic, mas aumenta a expectativa por sinalização mais clara de que o ciclo de baixa venha a seguir", diz o economista Alexsandro Nishimura, sócio do escritório de assessoria de investimentos Nomos.

"Com a desaceleração consistente da inflação, a curva de juros deve começar a precificar totalmente um corte na Selic a partir da reunião de agosto", completa.

Para o economista André Perfeito, o Copom poderia, mas não reduzirá a taxa básica em junho. Ele espera "sinalizações claras" na próxima ata do colegiado de que há espaço para algum afrouxamento monetário no segundo semestre. Isso, afirma Perfeito, deve ajudar o humor empresarial.

Núcleos de inflação ainda geram cautela

A economista Claudia Moreno, do C6 Bank, considera que o IPCA de maio veio "melhor do que o esperado". Segundo ela, a redução dos combustíveis pela Petrobras ajudou a puxar o resultado para baixo.

"Também chamou atenção o recuo na inflação de alimentos e bebidas (de 0,71% em abril para 0,16% em maio)", declarou.

Moreno ainda disse que os chamados núcleos de inflação do BC ficaram em linha com o esperado, acumulando uma alta de 6,7% em 12 meses.

Esse patamar, contudo, segue elevado e sinaliza que a "inflação mais estrutural" está "resiliente e caindo em ritmo lento", ponderou a economista.

Os núcleos de inflação excluem elementos voláteis e impactos não recorrentes sobre os preços, como uma seca, por exemplo. Representam um fator de relevância para o BC no momento de decidir o patamar da taxa básica de juros.

Ao esfriar a demanda por bens e serviços, a Selic em dois dígitos tenta frear os preços e ancorar as expectativas para o IPCA.

O efeito colateral previsto é a perda de fôlego da atividade econômica, porque o custo do crédito fica mais alto para os investimentos das empresas e o consumo das famílias.

No PIB (Produto Interno Bruto) do primeiro trimestre, os investimentos produtivos na economia tiveram queda, enquanto o consumo desacelerou.

A agropecuária pegou a contramão. Com o estímulo à safra vindo da melhoria nas condições climáticas, o campo puxou a alta de 1,9% no PIB de janeiro a março.

A possível desaceleração da atividade econômica nos próximos meses preocupa o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Desde o início do mandato, Lula e aliados vêm defendendo a redução dos juros e fazendo críticas em série ao presidente do BC, Roberto Campos Neto.

Na segunda (5), Campos Neto avaliou que a inflação estava melhorando, mas ainda de forma lenta, principalmente no caso dos núcleos.

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