Mercado livre de energia tem migração recorde, mas indústria cobra regulação

No fim de junho, o país tinha 34,4 mil indústrias e comércios aptos a comprar energia livremente

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São Paulo

O Brasil registrou recorde de migrações de consumidores ao mercado livre de energia no primeiro semestre, em meio a um cenário de preços baixos e maior oferta, mas a indústria tem reclamado da demora na regulamentação para adesão ao mercado livre a partir do ano que vem.

Segundo dados antecipados à agência Reuters pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), entre janeiro e junho, o ambiente de contratação livre de energia ganhou 3.330 novas unidades consumidoras, recorde para o período e um avanço de 52% frente à primeira metade de 2022.

Vista aérea de hidrelétrica em Minas Gerais
Vista aérea de usina hidrelétrica em Minas Gerais - Joel Silva - 21.dez.22/Folhapress

No fim de junho, o país tinha 34,4 mil indústrias e estabelecimentos comerciais aptos a comprar energia livremente, negociando preços e prazos diretamente com comercializadoras e geradores, e desvinculando-se do portfólio de contratos de energia das distribuidoras.

Em 12 meses até maio, empresas ligadas a saneamento, serviços, transporte, setor alimentício e comércio lideravam a migração para o mercado livre, ainda segundo a CCEE, com aumento de participação variando de 38% a 18%.

No primeiro semestre, o fluxo de migrações foi impulsionado por consumidores de pequeno porte, sobretudo com demanda contratada abaixo de 0,5 MW (megawatt) —condomínios comerciais e redes de lojas, por exemplo, que conseguem migrar para o ambiente no modelo de comunhão de cargas.

Embora grande parte das adesões ainda esteja concentrada nas regiões Sudeste e Sul, onde a industrialização é mais intensa, a CCEE observou um avanço significativo em estados como Pernambuco, Goiás e Ceará.

"Há mais espaço para que fábricas e empresas de fora dos grandes eixos produtivos e empresariais tenham participação representativa no volume de entrantes do segmento livre", apontou Talita Porto, vice-presidente do conselho de administração da CCEE.

Com o preço spot da energia no piso desde o ano passado em função das condições hidrológicas favoráveis, executivos de comercializadoras relatam que têm conseguido garantir descontos de 20% a 35% em relação ao que os consumidores pagam hoje na conta de luz das distribuidoras.

Além da redução de custos, Porto destaca outros atrativos do chamado ACL (Ambiente de Comercialização Livre) aos consumidores, como diferentes prazos e condições para contratação do insumo, com acordos mais aderentes às suas necessidades, além do apelo ambiental da compra de energia renovável.

A CCEE não faz projeções para o comportamento futuro das migrações, mas considera que a tendência deve continuar positiva, não havendo sinais de "desaceleração incomum" no segundo semestre — principalmente em um momento em que todo o setor elétrico se prepara para a abertura de mercado para todos os consumidores ligados em alta tensão a partir de 2024.

De acordo com a CCEE, das 165 mil unidades consumidoras que estariam aptas a migrar ao ACL no próximo ano, 93 mil já se beneficiam da micro e minigeração distribuída, reduzindo a viabilidade econômica da mudança. Sobrariam, portanto, 72 mil unidades com potencial para aderir ao segmento livre a partir de janeiro.

INDÚSTRIA RECLAMA DE INDEFINIÇÕES PARA 2024

A ampliação do mercado livre de energia entra em vigor em 1º de janeiro de 2024 e dá a opção de migração a todos os consumidores classificados como Grupo A (conectados em alta e média tensão ou atendidos por rede subterrânea).

Essa ampliação foi definida em 2022, a partir de uma portaria do Ministério de Minas e Energia. A regra anterior dizia que isso só era possível para consumidores com demanda contratada junto à distribuidora de pelo menos 500 kW (quilowatts). Há planos de abertura total a partir de 2028.

No fim de junho, a Fiemg (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais) encaminhou ofício à Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) em que manifesta preocupação com a demora na regulamentação para adesão.

No documento, a federação alega que a falta de definição dos responsáveis pela medição, adequações nas subestações, adesão e representação na CCEE são algumas das questões que causam apreensão nos consumidores.

A indústria aponta que, sem regulamentação, cresce a insegurança entre os consumidores de média tensão, com demanda contratada acima de 30 kW, que podem se beneficiar da medida.

"Esses consumidores podem avisar as suas distribuidoras que querem comprar a energia antecipadamente e podem ter até 35% de economia, se comparado ao mercado cativo. É algo que daria competitividade para a indústria", diz Tania Mara Santos, gerente de energia da Fiemg.

Ela complementa que o ideal seria que a regulamentação tivesse saído até 30 de junho deste ano, já que os interessados precisariam de 180 dias para optar pela migração ao novo sistema.

"É um modelo mais simplificado por ser a grande oportunidade para a pequena e média empresa. Em Minas Gerais, 15 mil empresas podem ser beneficiadas e são 150 mil no Brasil inteiro."

A medição do sistema de faturamento é a principal questão a ser regulamentada pela Aneel, de acordo com a indústria: é preciso definir se será o próprio consumidor o responsável, para isso investindo em adequações, ou se terá um modelo simplificado.

Em nota, a Aneel diz que a expectativa da agência é de abrir uma consulta pública sobre o tema no fim de agosto e finalizar a análise na última reunião pública de diretoria de 2023, prevista para dezembro.

"Muitas dessas questões podem e devem ser resolvidas bilateralmente entre o comercializador varejista e o consumidor. Não faz sentido a Aneel colocar em alguém a obrigação pela compra do medidor e pelos ajustes na entrada do ponto de consumo", diz André de Oliveira, sócio da Ampere Consultoria. "Algumas empresas devem aguardar a consolidação dos entendimentos para tomarem suas decisões de migração."

Com Reuters.

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