Descrição de chapéu Mercosul União Europeia

'Não se discute com ameaças. A gente não vai ceder', diz Lula sobre acordo Mercosul

Documento da UE previa sanções econômicas caso Brasil não cumprisse metas ambientais

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Bruxelas

Em entrevista coletiva na manhã desta quarta (19), em Bruxelas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou que o documento adicional que a União Europeia entregou em março sobre o acordo do Mercosul era agressivo e que "não vai ceder".

Lula disse que enviará uma nova carta à UE em duas semanas e que está otimista com a resposta. O documento europeu previa sanções econômicas ao Brasil caso o país não cumprisse metas ambientais.

Falou também sobre as compras governamentais, outro motivo de imbróglio para o acordo. A Europa queria incluir no acordo que as empresas estrangeiras pudessem entrar em pé de igualdade com as nacionais nas licitações do governo brasileiro.

Lula descartou a ideia e disse que compras governamentais são "um instrumento de desenvolvimento interno" para pequenas e médias empresas e que, portanto, não pode abrir mão desse potencial.

O presidente Lula em entrevista coletiva nesta quarta, em Bruxelas - Ricardo Stuckert/Divulgação

A entrevista ocorreu após o fim da cúpula Celac-UE, evento que reúne chefes dos 33 países da Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e 25 da União Europeia (UE) na capital da Bélgica.

Sobre a Venezuela, disse que as sanções impostas pelos EUA devem começar a cair após o governo e a oposição venezuelanos chegarem a acordo sobre as regras e datas para eleição presidencial em 2024. Confira abaixo os principais tópicos da entrevista de Lula.

Acordo Mercosul

"A Europa tinha feito uma carta agressiva. Era uma carta que ameaçava com punição se a gente não cumprisse determinados requisitos ambientais. Tem que haver dois parceiros estratégicos, não discutir ameaças. A gente discute com propostas. Nós fizemos a resposta brasileira, que está sendo discutida com os quatro países do Mercosul, e depois, daqui a duas semanas, vamos entregar definitivamente a proposta para a União Europeia."

"Nós não aceitamos a carta adicional da União Europeia. É impossível imaginar que, entre parceiros históricos como nós, alguém faça uma carta com ameaça. Achamos que a União Europeia vai concordar tranquilamente com a nossa resposta. Eu acho que a carta adicional da União Europeia foi possivelmente alguém achando que, fazendo pressão, a gente iria ceder. Não, a gente não vai ceder."

"Pela primeira vez eu senti definitivamente a União Europeia interessada em voltar de verdade para a América Latina. Primeiro para a questão do clima. Segundo, para a questão energética. Ou seja, a parte do mundo que pode produzir o hidrogênio verde que a Europa precisa é exatamente a nossa querida América do Sul."

Compras governamentais

"É importante que as pessoas saibam a importância das compras governamentais. No caso do Mercosul, não temos interesse na possibilidade de não nos industrializar. Fazemos a exigência de reindustrialização para que a gente possa ser exportador de manufaturados, coisas com mais valor agregado, gerar empregos mais qualificados. É por isso que não abrimos mão das compras governamentais. As compras governamentais são um instrumento de desenvolvimento interno. Os Estados Unidos fazem isso, a Europa faz isso, a Alemanha faz isso e o Brasil tem o direito de fazer isso. É assim que a gente consegue incentivar o pequeno e médio empresário a sobreviver e a crescer."

"Vamos pegar a área da saúde. Tenham em conta que não tem nenhum país no planeta Terra com mais de 100 milhões de habitantes que tenha um programa de saúde universal como o SUS. A gente tem que aproveitar o potencial de compra que tem o SUS para que a gente possa desenvolver internamente no Brasil uma indústria da saúde. A gente pode produzir tudo o que a gente precisa, inclusive remédios."

"A gente vai ter que aprender que, em negociação, a gente não ganha tudo o que quer. E é isso que eu estou disposto e que o Mercosul está disposto. E é isso que vai acontecer. É importante lembrar que, no caso do Brasil, a gente já teve a indústria significando 30% do nosso PIB. Hoje a gente está por volta de 11%. Na Argentina também desapareceu a indústria.

"Eu estou otimista, estou muito otimista. Pela primeira vez, eu estou otimista de que a gente vai concluir esse acordo ainda este ano."

Ambiente

"Temos um compromisso histórico de campanha assumido por mim na COP 25, de que nós vamos, até 2030, acabar com o desmatamento na Amazônia. Nós não precisamos da União Europeia, da China, dos Estados Unidos. É um compromisso nosso. Agora, eles têm a obrigação de cumprir com o compromisso de fazer a doação de US$ 100 bilhões (R$ 480 bilhões) para que os países possam, no mundo inteiro, preservar. Nós gostamos do nosso povo que mora na Amazônia. Nós queremos que seja bem tratado. Nós queremos que o ribeirinho seja bem tratado. Nós queremos que as pessoas que vivem de trabalho na Amazônia e na floresta sejam bem tratados. Por isso é que assumimos esse compromisso. E quem quiser contribuir com o Fundo Amazônico será bem-vindo."

"O Brasil é um país que tem um potencial excepcional. Temos 87% da nossa energia elétrica renovável. O mundo só tem 28. Nós temos de toda a matriz energética, envolvendo combustível, 50% totalmente renovável, contra 15% do resto do mundo. Dou esse número para dizer que pouca gente tem autoridade moral para falar em transição ecológica com o Brasil sem levar em conta a realidade brasileira."

"Nós temos um compromisso soberano de acabar com o desmatamento na Amazônia. Nós queremos transformar a zona num centro de desenvolvimento verde. Queremos compartilhar a exploração científica com quem queira participar, porque achamos que é possível extrair da grandeza e da grandiosidade do ecossistema da Amazônia e da riqueza da biodiversidade coisas importantes para desenvolvimento de novas indústrias. Ou seja, o Brasil vai mostrar ao mundo que nós vamos definitivamente entrar na chamada bioeconomia, na economia verde."

Na ponta da mesa, a número 2 do regime da Venezuela, Delcy Rodríguez, e os presidentes Lula, do Brasil, e Emmanuel Macron, da França, em reunião na segunda (17) - Emmanuel Dunand/Pool via Reuters

Venezuela

"Fizemos uma reunião sobre a questão da Venezuela. A situação da Venezuela vai ser resolvida quando os partidos, junto com o governo, chegarem à conclusão da data da eleição e das regras que vão estabelecer as eleições. Com base nisso,há um compromisso de que as punições impostas pelos Estados Unidos comecem a cair. Sanções absurdas, como a Venezuela não poder usar seu dinheiro que está nos bancos de outros países."

"Então, o que eu sinto? Eu sinto que depois de tanto tempo de briga, todo mundo está cansado de todo mundo. Eu sinto que a Venezuela está cansada também. Eu gostei da reunião, eu não esperava resultado da reunião. Se ele se entenderem, com relação às regras e à data das eleições, eu acho que nós temos autoridade moral de pedir o fim das sanções."

Cúpula Celac-UE

"Acho que de todas nós que eu participei com a União Europeia, essa foi a reunião mais exitosa de todas elas. Eu poucas vezes vi tanto interesse político e econômico dos países da União Europeia com os seus interesses para a América Latina. Possivelmente pela disputa entre Estados Unidos e China, possivelmente pelos investimentos da China na África e na América Latina, possivelmente pela Nova Rota da Seda, possivelmente pela guerra."

"O dado concreto é que a União Europeia demonstrou muito interesse em voltar a fazer investimentos, anunciando um investimento de € 45 bilhões (R$ 243 bilhões). Certamente, esses € 45 bilhões já fazem parte de muitos projetos que já estão em andamento. Mas não deixa de ser extremamente importante voltar a reafirmar os investimentos na América Latina"

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.