Barbie fake: Ativistas enganam mídia nos EUA com falsa boneca ecológica

Campanha, cujo alvo era criticar Mattel, dizia que empresa deixará de usar plástico até 2030 e está lançando bonecas que podem se decompor

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Livia Albeck-Ripka Orlando Mayorquin
The New York Times

Várias organizações noticiosas se deixaram enganar na terça-feira (1º) por uma farsa elaborada segundo a qual até 2030 todos os brinquedos da Mattel, incluindo a icônica boneca Barbie, serão produzidos sem plástico, a começar por uma nova linha de bonecas "EcoWarrior" (ecoguerreira) capazes de se decompor, feitas de materiais orgânicos incluindo cogumelos, algas e argila.

Promovida por um grupo ativista que se intitula Organização de Libertação da Barbie, a campanha incluiu uma série de releases noticiosos e anúncios falsos que diziam ser emitidos pela grande fabricante de brinquedos Mattel. O grupo disse que queria capitalizar em cima do hype em torno do filme "Barbie", lançado em julho, e chamar a atenção para o uso de plástico em brinquedos.

Em um dos clipes, a atriz e ativista ambiental Daryl Hannah caminha por uma praia pitoresca e recolhe da areia uma boneca coberta de cracas.

"Barbie e eu temos mais ou menos a mesma idade, só que ela nunca vai morrer", comenta Hannah, dizendo que mais de 1 bilhão de unidades da boneca de plástico estão jogadas em aterros sanitários, rios e lagos. Outro clipe mostra as bonecas —que representam ativistas ambientais como Greta Thunberg e a própria Daryl Hannah— usando alicates afiados para invadir uma usina da Shell.

Imagem fake do grupo ativista Organização de Libertação da Barbie mostra boneca representando a ativista ambiental Greta Thunberg
Imagem fake do grupo ativista Organização de Libertação da Barbie mostra boneca representando a ativista ambiental Greta Thunberg - Barbie Liberation Organization via The New York Times

Em email, a Mattel descreveu a campanha como uma farsa "que não tem nada a ver com a Mattel". A empresa disse que os ativistas também criaram falsos web sites feitos para parecer que pertencem à Mattel. "Eram duplicatas, não sites reais da Mattel", disse a companhia.

Mas alguns veículos noticiosos, entre eles a revista People, o Washington Times e o MarketWatch se deixaram enganar pela falsa campanha e publicaram artigos sobre as novas bonecas. Isso pareceu levantar questões sobre os aspectos éticos de se divulgar desinformação em nome do ativismo, especialmente considerando que a confiança dos americanos na mídia noticiosa praticamente nunca esteve em nível tão baixo.

Até a tarde da terça-feira os sites haviam tirado os artigos do ar. O Washington Times também divulgou uma nota do editor reconhecendo seu equívoco.

"O Washington Times confirmou com informações da Mattel Corp. que o artigo sobre novas bonecas Barbie publicado aqui foi baseado em uma farsa elaborada que envolveu endereços de email falsos, um release de notícias falso, imagens manipuladas, citações fictícias e um vídeo do YouTube que aparenta mostrar a atriz Daryl Hannah anunciando a nova linha de produtos", diz a nota. "Retiramos a reportagem de nosso site enquanto as origens da farsa são investigadas mais a fundo."

Em resposta a uma pergunta do New York Times, nenhum dos veículos ofereceu comentários imediatos até a noite de terça.

Os responsáveis pela campanha caracterizaram o que fizeram como sátira, e não desinformação, observando que sempre haviam planejado informar o público que a Mattel não havia sido responsável pelo anúncio. "Este é na realidade o tipo de ação que se opõe à desinformação", disse um dos ativistas, Mike Bonano, pelo telefone na terça.

"O que estamos combatendo é meio século de desinformação da indústria de plásticos, das empresas de combustíveis fósseis e de interesses que estão tentando convencer as pessoas que a reciclagem constitui uma solução viável ao problema dos dejetos de plástico", ele disse.

A campanha criticou o papel poluidor da Mattel devido ao uso de plástico em suas bonecas e outros brinquedos. A Mattel de fato pretende reduzir seu uso de plástico, mas está longe de planejar eliminar o material completamente de suas bonecas.

No ano passado a empresa anunciou que até 2030 pretende reduzir em 25% as embalagens plásticas de seus produtos. Nesse mesmo prazo ela também tem a meta de usar "materiais plásticos 100% reciclados, recicláveis ou de base biológica" em seus produtos e embalagens.

"O plástico é feito de combustíveis fósseis e é responsável por aproximadamente 6% do consumo global de petróleo", segundo o Portal Climático do Massachusetts Institute of Technology. A maior parte dos dejetos plásticos, mesmo que sejam destinados a ser reciclados, acaba em aterros sanitários ou é incinerada, contribuindo para a mudança climática.

A campanha é a segunda vez que o grupo ativista atacou a Mattel. Em 1993 ela comprou bonecas Barbie "Teen Talk" e bonecos G.I. Joe (fabricados pela Hasbro) e trocou as caixas de voz dos dois, recolocando-os em seguida nas prateleiras de lojas. A finalidade declarada foi questionar as posições do público sobre gênero e violência.

Desta vez a campanha mostra as bonecas e crianças que brincam com elas jogando sopa de tomate em pinturas de Van Gogh e coquetéis Molotov no presidente russo Vladimir Putin, ao som de um jingle sobre "sabotagem criminosa corporativa".

Daryl Hannah, o rosto da campanha, disse que embora a maior parte dela tenha sido falsa, um elemento foi real: cerca de uma década atrás, disse, ela encontrou uma Barbie incrustada de cracas quando estava mergulhando no mar das ilhas Fiji.

"Eu estava mergulhando e dei de cara com umas perninhas de Barbie saindo do meio de um coral", disse Hannah. "Ela ia continuar ali para sempre."

Tradução de Clara Allain

Erramos: o texto foi alterado

A reportagem é do New York Times e não do Financial Times, como publicado anteriormente. 
 

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.